5 de Novembro 1999 DISCOS - POP ROCK
Prémio de consolação
Arto Lindsay Prize (6) Rykodisc, distri. MVM Dá ideia de Arto Lindsay ser, digamos, um TS compulsivo. Já no ano passado, durante a conferência de imprensa de apresentação do festival Mergulho no Futuro, o antigo músico dos Lounge Lizards enviava todas as temáticas abordadas para o ficheiro “sexo”. Agora, no seu quarto álbum inspirado na música brasileira, ilustrou o livrete com uma panóplia de figuras que tanto sugerem próteses ortopédicas como artigos de “sex shop”, esculturas de cristal ou objectos dada. Será, talvez, por “Prize” ter sido composto no Brasil durante o Carnaval… Cansado dos excessos cometidos na juventude, quando militava nas fileiras da “no wave”, mais tarde do jazz downtown e do swing “sujo” dos Lounge Lizards, Arto iniciou com “O Corpo Sutil” uma série de trabalhos em que procurou definir os contornos de uma nova música resultante da fusão da sensualidade, por vezes onanista, da bossa nova com o experimentalismo sonoro e a incorporação das novas correntes de dança como o hip hop ou o drum ‘n’ bass, a par do exotismo conferido por vocalizações em português. Composto na Baía durante o período de Carnaval e gravado em Nova Iorque com a participação de alguns dos seus habituais convidados (Vinicius Cantuária, Melvin Gibbs, Peter Scherer, Brian Eno…) e, desta feita, também com o violinista Eyvind Kang e o “rapper” Beans (dos Anti-Pop Consortium), “Prize” corresponde ao desejo de Arto de fazer um álbum mais duro que os anteriores “O Corpo Sutil”, “Mundo Civilizado” e “Noon Chill”. Com efeito, se temas como “Prefeelings” (insuflados com as vozes do “homem do elevador”, de Heiner Goebbels, um álbum que, cada vez mais, parece “indescartável” de Arto Lindsay…) e “Unsure” (drum ‘n’ bass escorreito) correspondem de facto a esse endurecimento de som, a maioria, porém, desenvolve, sem lhes acrescentar algo de verdadeiramente novo, as premissas anunciadas antes, com a habitual tónica na bossa nova e, neste caso, atendendo à especificidade do local e das condições em que foi composto, também no samba. Arto tornou-se, sem dúvida, um símbolo de uma certa modernidade – num registo semelhante ao de Ryuichi Sakamoto – que privilegia o estilo e cultiva a distância e a ironia, mas não consegue evitar a sensação de uma superficialidade que, aliás, é cultivada. “Prize” seduz numa primeira audição, mas nem a complexidade instrumental nem o rigor de produção conseguem disfarçar a evidente falta de ideias quando Arto se propõe ilustrar em português as suas concepções pessoais sobre a bossa nova. Aspecto em que fica a milhas de distância de qualquer dos trabalhos editados, quase em paralelo com os seus, por Vinicius Cantuária. Formalmente interessante, pejado de artimanhas e “puzzles” electrónicos, “Prize”, fazendo embora jus ao Carnaval que tenta evocar, acaba, no entanto, por se iluminar naquele que é, de longe, o tema de maior fulgor do disco: “O nome dela”, pronunciado com o mesmo balanço nordestino e a simplicidade do melhor David Byrne.
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