CULTURA
DOMINGO, 2 JANEIRO 2005
Woody Allen brilha em “réveillon” como
antigamente
Woody Allen e a sua banda de jazz tradicional foram mesmo o melhor da
passagem de ano no Casino do Estoril. Tocaram pouco tempo. O suficiente para
fazer nascer um brilhozinho nos olhos de toda a gente
O ano terminou com uma catástrofe
mas nem por isso as pessoas quiseram deixar de divertir-se. Faz parte da
natureza humana esquecer e resta sempre a esperança de que o ano novo seja
melhor e traga motivos de felicidade. Woody Allen esteve no “réveillon” do Casino
Estoril a tocar jazz e a maneira como o fez contribuiu para trazer um pouco
dessa felicidade às 800 pessoas que pagaram 500 euros para o ver e ouvir e, já
agora, desfrutar da festa gastronómica do Casino.
Woody
é exatamente como nos filmes. Uma personagem frágil e deslocada do cenário que no
entanto emana um fortíssimo carisma. Houve quem lhe chamasse “figura de
cartoon” e quem não se cansasse de gritar “We love you Woody!”. Ele agradeceu,
falou de Portugal como um “paraíso” e tocou o velho jazz de New Orleans de
olhos fechados, o pé sempre a bater o compasso e com uma enorme paixão.
Mas
isso aconteceu quando já passava uma hora da meia noite e os festejos já haviam
sido cumpridos. Bem cedo, mesmo assim com uma hora de atraso sobre o horário
previsto, às 20h, o Casino abriu as suas portas à “socialite” e demais
pagantes, com os fotógrafos e jornalistas a afadigarem-se para recolher imagens
e impressões das figuras do “jet set”. Os homens vinham de “smoking”, as
senhoras com vestidos nalguns casos bastante reveladores.
Carla
Matadinho, Miss Playboy, era uma das mais solicitadas. Certamente não por causa
das suas curvas perfeitas e do decote provocante. O facto de Woody Allen ser a
estrela convidada “teve algum peso” na sua vinda ao casino do Estoril. Carla
esperava ouvir “música fantástica” de um género, o jazz, “que é para se ouvir ao
vivo”. A desnudada missa não viu nenhum dos filmes do cineasta, apenas conhece
alguns “de comentar” porque nunca costuma “estar muito atenta aos filmes que
saem”. Mal comece o ano, partirá para a Colômbia, onde representará Portugal no
concurso de Miss Café.
Fátima
Lopes, a conhecida estilista, não estava menos deslumbrante, também ela com um decote
abismal que lhe descobria totalmente as costas e mesmo algo mais. Fátima veio a
este “réveillon” de luxo por ser “uma noite muito especial” e porque o casino
“significa um pouco a magia que faz sonhar”. E Woody Allen? “Também ajudou!”.
Dele a estilista conhece apenas os filmes, não o músico de jazz. “Nunca o vi tocar,
mas agradável decerto que vai ser”. Fátima Lopes não destacou nenhum filme em
particular porque o importante, disse, “é o estilo”. “Só há um Woody Allen”.
Quem
não podia deixar de estar presente era o cantor Fernando Tordo, habitual
participante nas atividades artísticas do Casino do Estoril desde 1968, “quando
ainda era um miúdo dos conjuntos”. No ano passado Tordo fez uma temporada de
quatro meses nesta sala. Veio, este ano, “pela festa”. Em relação a Woody Allen
não nutre expectativas exageradas. “É uma figura genial do cinema, se fosse também
bom músico, sabia-se, mas pronto tem graça…”. Para Tordo o ano que passou não
deixa saudades. “Para quem, como eu, está muito ligado às coisas do seu país,
foi um ano péssimo, para esquecer, não tenho nenhuma boa recordação”. As coisas
poderão melhorar em 2005, “desde que haja um melhor governo, melhores governantes,
e mais respeito pela cultura e pelas artes”.
Invariavelmente
presente em tudo o que é acontecimento social, Lili Caneças atraía, como é hábito,
as atenções, até por causa dos esforços desesperados que fazia para manter a
altura do decote em níveis moralmente aceitáveis Lili veio ao casino por ser
uma época em que, normalmente, está em Portugal, com os filhos, com quem
costuma passar o Natal em família. E sempre que está por cá, Lili passa nesta
época do ano pelo Casino do Estoril. “Desde os meus 15 anos de idade, sinto-me
aqui em casa”. A tia das tias portuguesas defende que o local deve deixar de
ser visto apenas como “um sítio para jogar” mas também como de
“entretenimento”, onde já assistiu a espetáculos como os de Tony Bennett, Art
Garfunkel e Liza Minelli, alguns dos “maiores génios do mundo”. Lili é fã de
Woody Allen, de quem viu “os filmes todos”. E gosta de jazz. “Estive em New
Orleans, no sítio onde foi criado o ‘Dixieland’, tenho discos de ‘Dixieland’ e
acho que ele toca clarinete fabulosamente”. Depois de um ano 2004 “fantástico”
– “lancei uma linha de jóias, anunciada na TV Shop, que está a vender lindamente”
– Lili Caneças começará a gravar em Março de 2005 um novo programa de
televisão. “Estou a dizer-lhe isto em primeira mão”. A primeira coisa que vai
fazer em 2005 é “pedir muita paz para o mundo e alegria de viver”.
Assim
foi passada a primeira hora, a ver e ser-se visto, antes de se entrar no salão
Preto e Prata onde a festa propriamente dita iria decorrer. Nas mesas, tudo a postos,
com cada lugar munido de um “kit” de divertimento temático – árabe, havaiano… –
que incluía corneta, língua de sogra e serpentinas. Era altura de se iniciar o
repasto. Ao som do grupo de câmara Quartet d’Arco, José Cabeleira & Cª e os
Forrógode, que ninguém se esforçou muito em ouvir.
Às
12 badaladas, anunciadas em palco pelo diretor artístico do casino, Júlio
César, a alegria e o barulho mostraram que a festa estava a ser boa (pudera, a
500 euros…). Damas e cavalheiros saltaram para cima das cadeiras, as
serpentinas enrolaram-se em redor dos sonhos, trocaram-se beijos e fizeram-se
votos, ao vivo e por telemóvel.
Só
quando a New Orleans Jazz Band subiu ao palco, sem se fazer anunciar, é que o
ambiente mudou por completo. As luzes baixaram, ouviram-se “shius” e os
farristas chegaram-se à boca de palco para ver melhor aquele por quem ansiavam.
Woody manteve-se quase todo o tempo de olhos fechados, anunciou ao microfone a
excitação que estava a sentir por estar ali e a música saltou, pela primeira vez,
para o centro das atenções. “I love you, Woody!” não parava de exclamar Lili
Caneças enquanto ajeitava o decote e cantava de cor “Sweet Georgia Brown”. “É
um grande artista”, exclamava outro. Woody e os seus companheiros tocaram pouco
mais de uma hora. Com entusiasmo e paixão. Estavam dentro de uma cápsula de
tempo. O seu tempo e o nosso coincidiram por momentos.
Depois
deles, a festa acabou. Houve ainda quem dançasse a música brasileira chata da
banda Treme Terra e esperasse pela atuação tardia de Armando Gama. Anti-clímax.
O chocolate quente ajudou a amenizar a madrugada e a fazer esquecer que o novo
ano pode não ser exatamente da mesma cor que os sonhos.
Jantar a vários ritmos
Numa ementa pouco imaginativa
mas razoavelmente bem confecionada, desfilaram sobre as mesas do Salão Preto e
Prata, terrina de foie gras de ganso com geleia de figos e pão de especiarias, dueto
de lavagante e camarão tigre com flor de espargos verdes, sorbet de limão, tarte
de requeijão com framboesas em ninho de chocolate, café e mignardises, na
companhia de um branco Pêra Manca e um tinto Prazo de Roriz. À meia-noite foi servido
champagne Moêt & Chandon Brut Imperial. De início, o serviço respeitou um
ritmo pausado e atento, dando tempo de degustação própria a cada prato. A dado momento,
porém, a tendência mudou para a confusão e para uma pressa inexplicável, com os
pratos a serem positivamente atirados para as mesas sem medida nem método. A
horas mais tardias, então, os convivas foram votados ao abandono. Quem quisesse
mais festa que a inventasse sozinho.
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