02/06/2020

Adiafa armam baile no Alentejo com novo disco


CULTURA
DOMINGO, 10 OUT 2004

Adiafa armam baile no Alentejo com novo disco


“Tá o Balho Armado”, segundo álbum, dos Adiafa, foi apresentado ao vivo em Beja, com os convidados Rui Veloso, Paulo de Carvalho e Gaiteiros de Lisboa

Tiveram a fama e o proveito, mas não ficaram ricos. Nenhum deles comprou casa nova, garantem. Apesar disso tornaram-se durante meses verdadeiras celebridades da música popular portuguesa. “As meninas da Ribeira do Sado” foi a canção que andou nas bocas de Portugal de Norte a Sul e levou os alentejanos Adiafa ao sucesso, aos “tops” e, o álbum de onde foi tirada, a disco de platina, com mais de 40 mil vendidos.
            Agora, com o segundo CD lançado no mercado, “Tá o Balho Armado”, os Adiafa procuram, no mínimo, manter a força da onda, ainda que, desta vez, não se vislumbrem outras “meninas” no horizonte.
            A apresentação oficial do disco foi na sexta-feira, no Pavilhão Polivalente de Exposições de Beja. Com um concerto onde estiveram praticamente todos os convidados do álbum, incluindo Rui Veloso, Paulo de Carvalho e os Gaiteiros de Lisboa, com as canções que interpretam no disco, respetivamente “Feira de Castro”, “Saias” e “Sambombita”.
            Um concerto equilibrado, apesar do som deficiente, com constante troca de músicos em palco e muita descontração, ao ponto de num dos lados do palco estar uma mesa posta com comes e bebes para receber os músicos após cada intervenção.
            Foram apresentadas todas as faixas de “Tá o Balho Armado”, mais um tema extra para os convidados especiais. Os Gaiteiros, com o seu “O menino está na neve”, do álbum “Invasões Bárbaras”, Paulo de Carvalho com uma vocalização “a capella”, Rui Veloso com “O primeiro beijo”. José Salgueiro, dos Gaiteiros, ajudou à bateria numa série de canções. Joaquim Simões, no fagote, Augusto Graça, na flauta, Pedro Mestre, na viola campaniça, os Alentejanos, em “cante” vocal, e o grupo de bombos e percussões Bardoada, participaram também no concerto e na adiafa (festa) improvisada. No final apoteótico todos, incluindo uma matrafona elevada no ar, cantaram em coro “As meninas da Ribeira do Sado”. Os Adiafa não se vão livrar delas tão cedo.
            “Tá o Balho Armado” é um disco feito com mais tempo e meios técnicos do que o seu antecessor. Apresenta duas partes distintas. A primeira, mais popular e acessível, é mais cantarolável e dançável. Começa, como o álbum de estreia, com umas meninas, mas desta vez sem carrapatos atrás das orelhas, “Meninas façam arquinho”, cuja introdução falada conta com o desempenho de João Canto e Castro a imitar o professor José Hermano Saraiva.
            Segue com uma alentejanizada “Mula da cooperativa”, de Max, homem de outras adiafas. Mas a aposta forte, que irá ser editada em “single”, para suceder às “Meninas da Ribeira do Sado”, é “Ó Ana, ó Ana, ó Ana…”, com as suas sugestões de rimas marotas (“Semeei no meu quintal/Uns quantos dentinhos de alho/Saltou-me o cabo do sacho/E bateu-me no…”). Na segunda metade de “Tá o Balho Armado”, as polifonias vocais tornam-se mais solenes e a música aproxima-se do mais fundo da tradição alentejana. “Sambombita”, moda de Barrancos, pelos Gaiteiros de Lisboa, é arrasadora e surpreendente é a toada hipnótica e arabizante de “Afã”.
            Falta esperar pelos resultados, que é como quem diz, pelo número de vendas. O sucesso do primeiro disco fez aumentar as expectativas e a responsabilidade. “Fazer o segundo disco não custou”, diz Luís Espinho, uma das vozes dos Adiafa, “Agora o impacto, o ‘feedback’ deste segundo trabalho só por muita sorte é que conseguirá atingir o nível do primeiro, que foi realmente um fenómeno.”
            Comparando os dois discos, Espinho explica que “em termos de tempo” que tiveram para o fazer, este foi “incomensuravelmente maior” e que o novo estúdio “está muito mais bem apetrechado”. “Fizemos aquilo que queríamos, a diferença está em que o novo disco terá um som um pouco mais urbano, embora baseado na mesma traça, na música de recolha”.
            Ultrapassada está a morte de um dos elementos fundadores do grupo, Emídio Zarcos, cuja memória os Adiafa não se dispensam de homenagear. O grupo, porém, continuou na estrada. “Se nós nos ressentíssemos, o Zarcos de certeza zangava-se, esteja ele onde estiver. Olhámos uns para os outros, doridos, mas decidimos continuar. O trabalho por vezes faz esquecer as tristezas.” Porque, afinal, os Adiafa são “um estado de alma”, uma mesa posta para a festa onde constantemente “uns saem e outros entram”.

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