POP ROCK
1 de Maio de 1996
1 de Maio de 1996
Rui Júnior & O Ó Que Som Tem
Ó Tambor
ED. FAROL
Na linha de outro grande percussionista, Glen Velez, Rui Júnior encara o ritmo como a arte e um veículo de transmutação interior. O objectivo é o transe, a sintonia nas frequências menos óbvias do som, a flutuação nos ecos e reverberações, a descoberta das ligações insuspeitas entre o ritmo dos corpos e o ritmo do mundo, o recorte dos microtons, em texturas onde o timbre vale tanto como o rigor do compasso. “Ó Tambor” prefere a contemplação à tempestade, a progressão lenta à explosão. Rios e ribeiros deslizam devagar, as suas águas confundindo-se com as de lagos que, por sua vez, desaguam em mares e oceanos. As samplagens de vozes de crianças, de uma orquestra, de ruídos animais, tanto como o poema védico lido por José Mário Branco ou a carga emotiva da voz de Amélia Muge, jogam com as polifonias vocais de índole religiosa ou simplesmente lúdica, seja na proximidade com a tradição portuguesa ou na apropriação das técnicas indianas. Não é música tradicional, embora haja uma gaita-de-foles a cantar em “Recolhimento”, um dos mais belos temas do disco, e a dança dos ritmos jogue às escondidas com as reminiscências do passado. Um reco-reco transporta consigo Airto Moreira e o Brasil, em “Frase feliz”, a África ergue-se no coro das Fincapé, em “’68”, um sonho cresce em procissão no enlace das percussões com o violoncelo, em “6 feira”. “Ó Tambor” é o pesadelo dos adeptos da adrenalina e o paraíso dos espeleólogos e alpinistas da sensibilidade. Um “O” cujo centro está em toda a parte e a circunferência em parte nenhuma. (8)
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