21/11/2011

Na senda de estranhas melodias [Brigada Victor Jara]

Sons

28 de Abril 2000

Colectânea de versões festeja 25 anos de carreira

Na senda de estranhas melodias

Apagaram as velas do 25º aniversário com a edição de uma colectânea de versões de velhas canções que fizeram a história do grupo. Para a Brigada Victor Jara, uma das instituições da MPP, é o início de mais um ciclo de vida que prosseguirá no próximo ano com o lançamento de um novo álbum.

“Por Sendas, Montes e Vales”, assim se chama esta colectânea, editada em CD duplo pela Farol Música, inclui 26 temas retirados de toda a discografia anterior da Brigada, regravados numa única sessão de estúdio com a presença de convidados como André Sousa Machado, António Pinto, Catarina Moura, João Paulo e Silva, Jorge Reis, Luísa Cruz, Manuel Freire, Minela, Tomás Pimentel, Vitorino, José Medeiros e o Grupo de Etnografia da Academia de Coimbra (GEFAC).

Manuel Rocha, violinista e, actualmente, o elemento mais antigo da Brigada, conversou com o PÚBLICO sobre a data de aniversário, o disco e o futuro de grupo que, no próximo ano, lançará um novo álbum de originais.

“Pensámos fazer um disco de 25 canções [na realidade são 26] que marcassem o percurso da Brigada. Em vez de repescar outra vez velhas canções, como fizemos no 15º aniversário, pensámos que seria engraçado fazer um disco ao vivo, só que não encontrámos nenhum sítio, no devido tempo, um espaço com público, acabando por fazermos num só dia, no estúdio, toda a gravação, som e imagem, fez-se também um vídeo”, explica Manuel Rocha, que não nega ter havido uma certa “preguicite” na escolha desta fórmula. Mas justifica: “Este disco foi um disco de percurso, ainda por cima a Câmara de Coimbra resolveu dar-nos a medalha da cidade, de mérito cultural, e havia a necessidade, segundo a editora, de criar um produto comemorativo, mais do que outra coisa qualquer.”

Mas as baterias, garante o violinista e porta-voz da Brigada, estão já todas apontadas para o próximo disco que irá sair daqui a um ano. “A solução era fazer sair uma coisa que correspondesse a uma novidade que era pôr versões ao vivo e, por outro lado, convidar, para dar mais assunto e nos dar mais prazer, uma data de malta antiga.”

A propósito deste próximo álbum, Manuel Rocha defende que “há espécimes tradicionais que importa ‘atacar’ ou desenvolver pelo lado mais telúrico, menos elaborado e urbano”. Será esse o caminho a seguir num disco que, apesar de poder vir a enfatizar, mais do que é costume, um lado instrumental, continuará a explorar aquela que é uma das características mais interessantes da Brigada Victor Jara, as baladas que, embora recolhidas do cancioneiro, soam pouco familiares. “Procurámos sempre trazer para o nosso reportório coisas que sejam mais ou menos estranhas, como o ‘Bento airoso’, por exemplo”, diz Manuel Rocha para quem, nestes casos, o mais difícil é “dar a estas músicas uma forma, uma leitura interessante, sem desvirtuar o que lá está”.

A mesma estranheza sentida quando, no álbum “Novas Vos Trago”, editado no ano passado, se ouviu um tema da Brigada a ser vocalizado por Lena d’Água. “Resultou muito bem”, reconhece o violinista, que conta a história dessa colaboração: “O Ricardo Dias estava a trabalhar com ela, num espectáculo, como pianista. No convívio com ela, percebeu que aquele estereótipo da Lena d’Água de cantora pop que toda a gente conhece, ligada a uma imagem de beleza feminina, afinal tinha outro lado, de uma mulher que canta bem. Achámos óptima a ideia de ela cantar connosco.”

Poderá a música da Brigada, bem como de outros grupos portugueses da mesma área musical, ter possibilidade de ser bem aceite no estrangeiro? Para o violinista, a resposta é afirmativa, com alguns senões. “A música tradicional portuguesa, enquanto produto de exportação, tem possibilidades, não pode é continuar a filiar-se na música céltica, como nós próprios fizemos algumas vezes. Além da competição ser esmagadora, por outro lado, é preciso abandonar – e é isso que temos feito – uma certa tendência pop que pretende, mesmo que inconscientemente, responder a pseudo-solicitações de público. Mas nem sequer será isso o que o público quer… O desafio é fazer com que a música soe a qualquer coisa de consistente sem ter que namorar de forma descarada as sonoridades mundialmente aceites.”

Vinte e cinco anos passados e muitos músicos que entraram e saíram do grupo, a Brigada prepara-se para enfrentar o futuro sem deixar de recordar os tempos heróicos da sua génese, “em 1975, numa jornada de trabalho numa estrada da Lousã”, onde, recorda Manuel Rocha, “a malta se juntou para tocar umas modas e foi incorporada como testa de um camião do MFA”. A partir do mítico “Eito Fora!” a estrada mudou diversas vezes de direcção, mas ainda há quem, “no fim dos espectáculos, pergunte quem foi Victor Jara” e nas lojas, nalguns casos, os discos do grupo aparecem arrumados na secção de música chilena, “de preferência sob o nome de Victor Jara” (risos)…

Quem quiser juntar-se à Brigada Victor Jara nos festejos de comemoração poderá assistir aos próximos espectáculos do grupo em Faro, no Largo da Sé (no próximo dia 24), no Porto, no Teatro Rivoli, a 28, e em Lisboa, na Aula Magna, a 29. Vai valer a pena, mesmo que para tal seja necessário trilhar sendas, montes e vales.

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