9 SETEMBRO 1992
CANOS DE ESGOTO
MIKE OLDFIELD
Tubular Bells II
LP/MC/CD Warner Bros., distri. Warner portuguesa
Negócio é a palavra-chave. Negócio de imagens, números, reciclagem, desenterrar o passado, polir o produto e apresentá-lo como uma “ideia original”, inteligente, um golpe de génio. É disso que trata “Tubular Bells II”, versão tardia, de 20 anos, do original que nos anos 70 “revolucionou” a música pop, nas palavras de Rob Dickins, presidente da Warner no Reino Unido. Ao ponto de, na campanha publicitária, o primeiro “Tubular Bells” ser referido como uma “prequel”, dando a entender que o novo produto é que é o genuíno, numa brincadeira sintomática que recupera o termo “sequel”, ou sequela, cada vez mais em voga no cinema.
Dickins fala, a propósito, num “mundo de ‘Alien III’, ‘Arma Mortífera III’ e ‘O Exterminador Implacável II’, um mundo de números, de exploração de fórmulas que deram frutos dourados. Se “’O Padrinho II’ era melhor que o primeiro”, diz ainda Dickins, porque não ver em “Tubular Bells II” apenas a “sequência lógica” daquela atitude transposta para a música? Porque é óbvio que não, respondemos nós.
Coincidindo com a edição do novo disco de Mike Oldfield para a Warner, pela primeira vez, Richard Branson da Virgin não auferirá de quaisquer proventos. O compositor, guitarrista e multi-instrumentista assegurou também um novo acordo com a EMI, que, recorde-se, adquiriu todos os seus direitos de autor, quando da compra do grupo Virgin. “Tubular Bells II” terá ainda direito a um “home video”, na Warner, consumada que está a apresentação ao vivo, com pompa e circunstância, num espectáculo realizado num castelo de Edimburgo, que os portugueses tiveram oportunidade de assistir, na sexta-feira, em directo pela televisão.
“Tubular Bells II” é a versão adocicada do original. Carregou-se nas tintas “new age” e na limagem de arestas. A estrutura é a mesma, respeitando as diversas partes onde nem sequer falta a sequência final do primeiro lado (no formato vinílico), com um “mestre de cerimónias” incumbido de apresentar os diversos instrumentos até ao momento apoteótico correspondente à entrada dos célebres “tubular bells”. Mas como os tempos mudam, apesar de tudo, ouve-se uma introdução a “two sampled guitars” e a outros artefactos electrónicos que, diga-se de passagem, são muito menos românticos que os “mandolins” e “glockenspiels” do disco antigo. Não faltam a voz feminina à beira do desfalecimento de Sally Bradshaw e as gaitas-de-foles, aqui entregues aos P. D. Scots Pipe Band e aos Celtic Bevy Band. Mike Oldfield toca o esperado estendal de instrumentos, incluindo os sinos, e Trevor Horn assegura a produção, ele que foi um dos grandes impulsionadores do projecto e a quem, por tal motivo, devem ser assacadas responsabilidades. Nunca há só um culpado.
Ainda segundo Rob Dickins, “Tubular Bells” dirige-se a uma “subgeração de jovens fartos de música minimalista, à base de ritmos computorizados e ‘samples’” que procuram “outra coisa qualquer, próxima da música clássica”.Essa coisa é um híbrido mole e requentado, um golpe oportunista, pese embora os argumentos em contrário avançados por todos os envolvidos, com a agravante de minimizar e conseguir apagar as virtudes, que as havia, da versão original. Os tubos, depois de cornucópia de divisas, mesmo se a nova capa os mostra dourados, passaram a canos de esgoto. Não por acaso, sempre se foi lembrando que “Tubular Bells II” já vendeu, 20 anos passados sobre a sua edição, mais de 16 milhões de cópias em todo o mundo, mantendo uma média de vendas anual na ordem dos cem mil exemplares. É obra. Mas não de arte. (3)
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