Sons
26 de Fevereiro 1999
DISCOS – PORTUGUESES
O Império dos Sentados
Sétima Legião
Sexto Sentido (5)
Ed. e distri. EMI-VC
Portugal já tem, finalmente, a sua banda de etnose..., etnotecno. É bom que assim aconteça, estar a par do que se faz, ou se fez, lá fora, já há uns bons anos. Coube aos Sétima Legião, numa inesperada ressurreição e consequente regresso às lides discográficas, essa honra, com “Sexto Sentido”, um álbum cuja fórmula não poderia ser mais excitante: misturar “samples” de música tradicional com ritmos electrónicos de dança. A originalidade está em que os Sétima se lembraram de algo em que nenhuma outra banda do planeta tinha pensado antes e que consiste em usar samples, não uns samples quaisquer, mas samples de – pasme-se – música tradicional portuguesa! Deste facto, aparentemente tão simples, advém toda a estranheza e ousadia do projecto. Assim, é com algum espanto e não contida admiração que vemos as recolhas de Giacometti ganharem a luz da contemporaneidade em arriscada simbiose com programações que ora pedem emprestados os sequenciadores aos Tangerine Dream (“A volta ao mundo”, com a voz de Né Ladeiras a dar polimento) ora descambam em batidas cuja principal virtude é não pedirem demasiado esforço, nem às máquinas nem à imaginação (“Eclipse”, “Sem perdão”). Mas os Sétima Legião vão mais longe, assumindo até às últimas consequências as ligações perigosas entre a tradição e a computorização, não só através do grafismo da capa, uma alface virtual, como, em “Em pedra dura”, pela proeza de juntar a voz e a gaita-de-beiços de um amolador (recolha de Ernesto Veiga de Oliveira) a uma batida “hip hop”. Em “O factor humano”, os Sétima Legião invadem declaradamente a pista de dança, enquanto em “A caminho da lua” funciona o tom declamatório do vocalista sobre uma paisagem arabizante. Entre o “drum‘n’bass” e o “chill out”, “O louco do mar” demonstra que o grupo está atento às penúltimas tendências internacionais, o mesmo acontecendo em relação às antepenúltimas, em “Tempestades do senhor”, um ritual de ceifa do Vimioso meticulosamente encaixado numa batida tecno. Ao fim de 14 audições, o tema revela pormenores escondidos como sejam a incrível subtileza inerente a toda a batida tecno (dita “martelinhos”) ou uma série de outras, ainda menos evidentes, que apenas muitas mais audições depois se darão a conhecer em toda a sua plenitude. Nova dose de “drum‘n’bass”, em “Canção da erva”, e “ambient tecno”, em “Abril em Batavia” elevam ainda mais a fasquia da originalidade, soando tão originais como, pelo menos, outros 543 projectos semelhantes, todos originais e todos da mesma maneira. Deste modo, conseguiram os Sétima pôr a música portuguesa e eles próprios em sentido. Há um sexto sentido assim, uma intuição do som exacto que, em determinado momento, faz mover as alavancas. “Sexto Sentido” é o triunfo da alface segundo uma fórmula de sucesso. Venham daí mais legumes e sentidos. A música portuguesa agradece.
26 de Fevereiro 1999
DISCOS – PORTUGUESES
O Império dos Sentados
Sétima Legião
Sexto Sentido (5)
Ed. e distri. EMI-VC
Portugal já tem, finalmente, a sua banda de etnose..., etnotecno. É bom que assim aconteça, estar a par do que se faz, ou se fez, lá fora, já há uns bons anos. Coube aos Sétima Legião, numa inesperada ressurreição e consequente regresso às lides discográficas, essa honra, com “Sexto Sentido”, um álbum cuja fórmula não poderia ser mais excitante: misturar “samples” de música tradicional com ritmos electrónicos de dança. A originalidade está em que os Sétima se lembraram de algo em que nenhuma outra banda do planeta tinha pensado antes e que consiste em usar samples, não uns samples quaisquer, mas samples de – pasme-se – música tradicional portuguesa! Deste facto, aparentemente tão simples, advém toda a estranheza e ousadia do projecto. Assim, é com algum espanto e não contida admiração que vemos as recolhas de Giacometti ganharem a luz da contemporaneidade em arriscada simbiose com programações que ora pedem emprestados os sequenciadores aos Tangerine Dream (“A volta ao mundo”, com a voz de Né Ladeiras a dar polimento) ora descambam em batidas cuja principal virtude é não pedirem demasiado esforço, nem às máquinas nem à imaginação (“Eclipse”, “Sem perdão”). Mas os Sétima Legião vão mais longe, assumindo até às últimas consequências as ligações perigosas entre a tradição e a computorização, não só através do grafismo da capa, uma alface virtual, como, em “Em pedra dura”, pela proeza de juntar a voz e a gaita-de-beiços de um amolador (recolha de Ernesto Veiga de Oliveira) a uma batida “hip hop”. Em “O factor humano”, os Sétima Legião invadem declaradamente a pista de dança, enquanto em “A caminho da lua” funciona o tom declamatório do vocalista sobre uma paisagem arabizante. Entre o “drum‘n’bass” e o “chill out”, “O louco do mar” demonstra que o grupo está atento às penúltimas tendências internacionais, o mesmo acontecendo em relação às antepenúltimas, em “Tempestades do senhor”, um ritual de ceifa do Vimioso meticulosamente encaixado numa batida tecno. Ao fim de 14 audições, o tema revela pormenores escondidos como sejam a incrível subtileza inerente a toda a batida tecno (dita “martelinhos”) ou uma série de outras, ainda menos evidentes, que apenas muitas mais audições depois se darão a conhecer em toda a sua plenitude. Nova dose de “drum‘n’bass”, em “Canção da erva”, e “ambient tecno”, em “Abril em Batavia” elevam ainda mais a fasquia da originalidade, soando tão originais como, pelo menos, outros 543 projectos semelhantes, todos originais e todos da mesma maneira. Deste modo, conseguiram os Sétima pôr a música portuguesa e eles próprios em sentido. Há um sexto sentido assim, uma intuição do som exacto que, em determinado momento, faz mover as alavancas. “Sexto Sentido” é o triunfo da alface segundo uma fórmula de sucesso. Venham daí mais legumes e sentidos. A música portuguesa agradece.
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