Pop Rock
1990
CANÇÕES
ELÉTRICAS
NEIL YOUNG &
CRAZY HORSE
Ragged Glory
LP e CD, Reprise, distri. WEA
Datava de 1987, com a edição de “Life”, a última
colaboração de Neil Young com os Crazy Horse, que tão bons resultados dera nos
primeiros álbuns, “Everybody Knows this is Nowhere” e, mais tarde, “Comes a
Time”, “Rust never Sleeps” e “Trans”. Frank “Poncho” Sampedro, Billy Talbot e
Ralph Molina formam o trio básico guitarra-baixo-bateria, neste caso capaz dos
maiores desvarios e de elevar o nível decibélico a alturas inusitadas.
Com “Ragged Glory”, Neil Young produz um dos discos
que, em termos exclusivamente musicais, é dos mais violentos da sua carreira. É
o retorno à dureza original do rock’n’roll, à eletricidade e a uma
agressividade que chega a competir com as novas bandas “noise”, ao ponto de
levar um crítico como Edwin Pouncy, da revista “Vox”, a comparar o fruto mais
recente da associação Neil Young/Crazy Horse aos Sonic Youth.
Descontando o exagero, resultante talvez do
desconhecimento de anteriores trabalhos (recorde-se por exemplo a fabulosa
descarga de energia que é “Re-actor” ou as proezas guitarrísticas de “Zuma”),
ressalta realmente em “Ragged Glory” a inexistência de baladas, de temas mais
pausados, substituídos por uma cadência incansável de tempos médios,
propulsionada pela batida poderosa de Ralph Molina e pelos massacres sonoros
perpetrados pela guitarra de “Poncho” Sampedro.
Se procurarmos comparações, talvez possamos antes
encontrá-las nos Velvet Underground de “White Light/White Heat”, nomeadamente
no tratamento das cordas, com uma genial utilização do “feedback” e dos pedais
de “fuzz” aqui pisados até à exaustão. Do princípio ao fim do disco prevalece
um som agreste e ácido. Temas como “F*!#in’ up”, “Over and Over” terminam em
ruído puro, prolongando-se por alguns segundos com a eletricidade deixada à
solta. Neurose melódica, os instrumentos soltando chispas, a voz de Neil,
dificilmente mantendo a impassibilidade nasalada que a caracteriza, cercada e
empolgada pela “desbunda” dos colegas.
Em “Farmer John” (um clássico da dupla Don
Harris/Dewey Terry), atinge-se uma maior concisão e uma secura compassada que
lembram os Steppenwolf – “Hard rock”, se quisermos, para utilizar uma expressão
caída em desuso. “Mansion on the Hill” devolve-nos o Neil Young dos primórdios,
a letra mencionando o eterno “old man walkin’ in my place” com “psychedelic
music filling the air”, provando que a costela de Woodstock não se perdeu. As
harmonias vocais de “Days that used to be”, fazem questionar como seria se Crosby,
Stills e Nash não se tivessem ido embora e perdido pelo caminho e o tom quase
“gospel” de “Mother Earth (Natural Anthem)”, sugerem talvez suavidades onde
estas não existem. Em ambos os temas as guitarras permanecem implacáveis, no
segundo desarticulando-se num fraseado saturado de efeitos, sem se perder o
sentido melódico, que encontrou em Jimi Hendrix o seu maior mestre e cultor.
“Ragged
Horse” dispensa quaisquer truques de produção e embelezamentos supérfluos,
provando definitivamente (se ainda era necessário fazê-lo) a incapacidade do
músico de se render às imposições do mercado, mantendo intocável a imagem de
“loner” de óculos escuros e ar de “junkie” mal arrependido, nas tintas para o
“show business” (glória rota e esfarrapada, como ironicamente anuncia o título)
a par de uma veia criativa que se diria inesgotável. No fundo permanece a velha
máxima: “Hey Hey, my my, rock’n’roll will never die” – Para sempre.
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