Pop Rock
1990
VIVER NO CAMPO
THE WATERBOYS
Room to Roam
LP e
CD, Ensign, ed. EMI/Valentim de Carvalho
Os
irlandeses sentem o apelo irresistível das origens. Alguns vão até ao fundo e
obedecem à chamada, mergulhando totalmente nas sonoridades ancestrais. São às
centenas e mantêm viva a chama da tradição. Integram o vasto mundo da chamada
“música folk”, incensada pelos conhecedores, seguida com alguma atenção e
ocasional interesse pelos curiosos e apreciadores de música em geral. No meio,
estão os que se ficam pelas meias-tintas. Não se atrevendo a confinarem-se ao
círculo restrito da folk, optam por integrá-la em correntes mais acessíveis, a
principal das quais é o rock, como não podia deixar de ser. Uns mais do que
outros tornam-se permeáveis ao som dos antepassados, deslocando-o para
contextos mais apelativos e suscetíveis de rentabilização.
Do lote
dos mais ilustres praticantes da nova vaga folk rock fazem parte os Pogues, The
Man They Couldn’t Hang e os Oyster Band, de raízes urbanas e virados para mercados
onde competem, de igual para igual, com a imensidade de bandas independentes
que pululam no Reino Unido.
Os
Waterboys não escondem o amor que nutrem pela mãe rural. O mais engraçado é que
até nem são irlandeses, mas sim escoceses. “Room to Roam” investe no entanto
numa incursão decidida pelo folclore irlandês, retomando com maior convicção a
via já anteriormente trilhada em álbuns como “This is the Sea” e principalmente
“Fisherman’s Blues”. Mike Scott aventura-se pelas danças e baladas
tradicionais, sem preconceitos nem falsos purismos. Sabe que não pode competir
com os “folkies” genuínos nem será isso que lhe interessa. No seu caso trata-se
antes de uma prolongada e sincera relação de amor pelo passado riquíssimo de
uma ilha cuja história também se construiu de lendas, e da oportunidade de o
dar a conhecer a um público alargado, sem que no processo se notem sinais
evidentes de interesses comerciais mal disfarçados.
Fazem
parte do álbum dezassete temas, alguns deles de curta duração, pouco mais de um
minuto, pequenos apontamentos retratando momentos mágicos e intemporais de uma
História imaginada. “In Search of a Rose”, “Upon the Wind and Waves”, “Spring
comes do Spiddal”, “Natural Bridge Blues” (com alusões à música “cajun”), “Trip
to Broadford”, “The Kings of Kerry” evocam atmosferas misteriosas e danças
jubilosas, a guitarra elétrica quase parecendo intrusa, entre a
respeitabilidade ancestral do violino e a delicadeza aérea do “tin whistle”,
instrumentos da praxe neste campo. “A Man is in Love”, “Something that is gone”
ou “Further up, Further in” são alguns bons exemplos de baladas que completam
de forma coerente a tonalidade geral do disco, com a voz de Scott lembrando por
vezes um pouco a de Don McLean e saxofones “limpinhos” dando o toque de
contemporaneidade onde este não seria de todo necessário. O instrumental
“Something that is gone” ou o tradicional “Raggle Taggle Gypsy” fariam passar
os Waterboys por um típico grupo folk, se escutados isoladamente por ouvidos
não iniciados. “Room to Roam” é um disco apelativo, bem mais interessante que a
megalomania U2 e o seu séquito de imitadores, capaz de satisfazer os
incondicionais da banda e de converter mais uns quantos fiéis, em prol da causa
folk. Os já convertidos sorrirão, condescendentes; os neófitos darão pulos de
entusiasmo.
Sem comentários:
Enviar um comentário