Pop
Rock
12
Março 1997
Grupo de Inês
Santos estreia-se em disco
Guardadores de rebanhos
Durante
dois anos, na “Garagem”, em Coimbra, mantiveram a música no segredo dos deuses.
A designação ficou, num disco de canções intimistas com a poesia de Florbela
Espanca e Fernando Pessoa e a voz de uma Inês Santos, vencedora da Chuva de
Estrelas, liberta da crisálida de Sinead O’Connor.
Deixou
de ser segredo. O Segredo dos Deuses é o nome do grupo e de um álbum de estreia
onde a voz de Inês Santos – vencedora em 1995 do concurso televisivo de
descoberta de novos talentos Chuva de Estrelas – é o alvo das atenções. Ela a o
baterista Nuno Pinto falaram ao PÚBLICO do prazer que sentiram nesta sua
primeira gravação. O terceiro elemento presente, o guitarrista Francisco
Caetano, falou que se fartou...
PÚBLICO
– Depois da vitória no Chuva de Estrelas, seria de esperar uma opção por uma
carreira a solo. Mas, ao invés disso, acabou por gravar integrada num coletivo.
Porquê?
INÊS SANTOS – Já conhecia os cinco
elementos do grupo que, aliás, já existia antes, os Euterpe. Decidi convidá-los
quando o Tó Zé, da BMG, me convidou, por sua vez, para fazer o disco, ganhasse
ou não o Chuva de Estrelas. Significa que este disco não é o do prémio do
concurso. É outro contrato.
NUNO PINTO – Além de que, durante o
tempo que estivemos a trabalhar neste projeto, na “Garagem”, a arranjar as
músicas, verificámos que existiu uma envolvência grande entre nós os seis. Não
faria sentido o disco sair em nome da Inês Santos.
P.
– Os Euterpe perderam a sua autonomia...
N.P. – Foi um risco, obviamente.
Quando entrámos no projeto sabíamos que isso iria acontecer e vai continuar a
acontecer. Mas aceitámos de bom grado, não queremos notoriedade. O grupo até já
tinha ido ao Rock Rendez-Vous. Quando demos início a este projeto, é claro que
tivemos de começar a fazer música direcionada para a voz da Inês.
P.
– O facto de a Inês ter ganho o concurso trouxe vantagens para a sua carreira
ou, pelo contrário, poderá de futuro constituir um entrave?
I.S. – A curto e médio prazo
representa uma dificuldade. A longo prazo deixa de o ser, passando a ser uma
facilidade, porque as pessoas irão deixando de me conhecer como a Sinead
O’Connor.
P.
– De resto, a sua imitação da cantora irlandesa não tem nada a ver com os registos
vocais em que canta neste disco...
I.S. – Sim, tem muito pouco a ver,
realmente. Considero que nem sequer fiz uma boa imitação. Fiz uma boa
interpretação, mas a voz que estava lá era a minha. Mas no CD nota-se uma
grande diferença. Eu sou mezzo soprano e o meu registo é bem, bem agudo. O que
eu queria ser é cantora lírica. Tem tudo a ver com a minha formação clássica de
Conservatório.
P.
– Um registo e um timbre que num tema como “Fugaz” lembram bastante Annie
Haslam, a cantora de um grupo de rock sinfónico dos anos 70, os Renaissance.
I.S. – Tem graça, sempre que canto
esse tema lembro-me da Viviane, dos Entre Aspas...
P.
– O disco insiste na tónica do intimismo e de algum secretismo.
I.S. – O que está lá é tudo natural.
Vem bem do fundo de cada um de nós. Não foi propositado fazer mistério ou
mostrar essa intimidade. O nome tem a ver com a maneira como tudo se passou, em
que estivemos dois anos na “Garagem”, uma sala de ensaios em Coimbra, sem
ninguém conhecer as músicas, sem ninguém entrar lá dentro. Foi tudo com muito
segredo... Mas as composições e as letras também têm misticismo.
P.
– Foi por isso que utilizaram poemas de Fernando Pessoa e Florbela Espanca?
I.S. – São dois dos grandes poetas
portugueses e dois dos nossos grandes ídolos. A primeira música que o grupo me
apresentou foi, precisamente, “Se tu viesses ver-me”, com poema de Florbela
Espanca. Foi o grande impulso.
P.
– Em termos musicais, nunca se afastam muito desse registo. Não quiseram
arriscar?
N.P. – Não houve a preocupação de
fazer uma coisa comercial, com um “single” para passar na rádio. Apenas fizemos
as músicas e as letras da maneira que gostamos. Com grande responsabilidade e
apoio, nos arranjos e na produção, de Fernando Júdice.
I.S. – A minha irmã diz que é um
daqueles discos de que se aprende a gostar. Não é um disco imediato. Há uma
homogeneidade, um todo que queremos mostrar às pessoas.
P.
– Quando é que pensam mostr-alo ao vivo?
I.S. – Estamos a trabalhar com a União
Lisboa na marcação de espetáculos. Temos marcados para Março, incluindo uma
apresentação em Coimbra, no dia 21, no Scotch.
P.
– Há alguma canção de “Segredo dos Deuses” que lhe tivesse dado especial prazer
cantar?
I.S. – Todas têm a ver comigo. Mas
talvez haja uma especial, “Nos céus de Coimbra”, porque é uma homenagem à
cidade onde crescemos e vivemos. Convidámos cinco músicos, na guitarra da
Coimbra, viola, teclas e ainda uma voz característica de Coimbra.
P.
– O tal intimismo que atravessa todo o disco foi induzido pelo ambiente da
cidade?
N.P. – É capaz. Não de uma forma
consciente, mas é verdade que não somos indiferentes a uma certa nostalgia.
P.
– O Francisco tem alguma coisa a acrescentar?
FRANCISCO CAETANO – Até agora eles não
têm falhado... Tenho estado atento para ver se não dizem nenhuma asneira. Mas
não, esteve tudo correto.
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