28 de Julho 1998
Lançamento
de obra-chave da teosofia
A voz que
chama
A primeira edição em Portugal de "A Voz do Silêncio", de
Helena Blavatsky (publicada pela primeira vez em 1889, em Londres, pela The
Theosophical Publishing Company Limited, com notas e prefácio da autora), vai
ser apresentada, a partir das 19h30, pela Assírio & Alvim, na sua
livraria-sede, na Rua Passos Manuel, em Lisboa. A obra, das mais conhecidas da
Literatura do Esoterismo, foi traduzida por Fernando Pessoa e tem desenhos de
Ana Marchand. Antes, os adeptos ou simples curiosos da filosofia hermética apenas
tinham disponível uma edição brasileira, de 1969, pela Civilização Brasileira.
Helena Pretrovna Blavatsky (1831 -
1891), Madame Blavatsky ou H. P. B. como era conhecida entre os discípulos, é,
juntamente com Annie Bésant, C. W. Leadbeater, Alice Bailey e John Cleese, um
dos pilares da Teosofia. Por Teosofia, sabedoria de Deus, entende-se um
conjunto de doutrinas e preceitos que procuram explicar o mundo, a realidade,
como um todo, a partir dos seus fundamentos espirituais. Normalmente isto é
suficiente para assustar o comum dos mortais. Mas o próprio Fernando Pessoa
sentiu os cabelos eriçarem-se quando travou conhecimento com "A Voz do
Silêncio", aos 27 anos. Escreveu então ao seu amigo Mário de Sá-Carneiro,
numa carta datada de 6 de Dezembro de 1915: "A crise intelectual que
apareceu agora deriva da circunstância de eu ter tomado conhecimento das
doutrinas teosóficas (...) Conheço a essência desse sistema. Abalou-me a um
ponto que eu julgaria hoje impossível". Esta perturbação é acentuada pela
percepção de que na Teosofia, ou Teosofismo, na terminologia de outros autores,
poderia estar "a verdade real". Mais tarde Pessoa afastar-se-ia do
pensamento de Blavatsky - marcado pela influência telepática de dois mestres
indianos -, aproximando-se do Esoterismo Ocidental, em particular da Alquimia
na sua vertente gnóstica (conhecimento directo e intuitivo da
divindade/realidade). Houve mesmo quem visse nesta incansável viajante dos
territórios da Terra e do Espírito - que em 1875 formou em Nova Iorque a Sociedade
Teosófica - uma fraude. René Guenon, teórico e ensaista importante dos assuntos
ligados ao Esoterismo, apontou falhas e contradições. Mas a Voz do Silêncio
permaneceu ecoando até aos nossos dias.
"A Voz do Silêncio" está
dividida em três segmentos: "A voz do silêncio", "Os dois
caminhos" e "As sete portas". Formam um caminho para o
despertar. Claro que, como bem notava Pessoa, tudo pode ser um caminho para o
despertar, inclusive algo que afirme exactamente o contrário das prescrições de
Madame Blavatsky. Mas essa é precisamente a matéria de que é feito o Real:
Simples possibilidade, constantemente disponível para a aquisição de qualquer
forma que lhe queiram conceder o amor, a vontade e a razão.
Isso e outra coisa terão assustado
Fernando Pessoa. É que em "A Voz do Silêncio" a escrita, expressão do
Verbo, está construída em espiral. Um caminho de energia com etapas onde a
intuição necessariamente se detém para encontrar repetições nos lugares
exactos, directivas para a mente se orientar no labirinto das imagens. Segue-se
atrás, cavalga-se o texto, voa-se com ele como uma ave cheia de receio e de
lume que ama a Luz. É essa a Voz do Silêncio que brota do escuro. O Fogo que se
segura na ponta dos dedos e brilha no fundo do olhar. A voz que permite
distrinçar o verdadeiro sentido da vida. John Cleese sabe-o melhor do que ninguém.
Quem se dá conta do jogo?
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