CULTURA
QUINTA-FEIRA, 13 DEZEMBRO 2001
Música
improvisada no Teatro S. Luiz
“FONOTECA FILES 2001” ARRANCA HOJE
AMM, Zeena Parkins e Ikue Mori trazem às “Fonoteca Files 2” a liberdade
de criação e as surpresas da “composição contemporânea”
Improvisar pode ser sinónimo de
desenrascanço. Ou de desbunda. Mas nem sempre. Mas não necessariamente. Pode
ser uma arte. Uma via de autodescoberta. Uma porta aberta para o desconhecido.
As “Fonoteca Files”, ciclo de música improvisava cuja segunda edição se inicia
hoje, com um concerto de Nuno Rebelo, Kato Hideki e Marco Franco, no Teatro S.
Luiz, em Lisboa, às 22h, têm sobre a música improvisada uma opinião mais
sofisticada. Assim, segunda a organização, a “nova” improvisação (sim, há
maneiras antigas e modernas de encarar e de domar o silêncio e o ruído que
estão na origem de toda a música…) é “uma vivência dialética da
pós-modernidade, musicologia espontânea duma estirpe minoritária de pensadores,
solistas, compositores e orquestradores, rito vanguardista no sentido em que a
sua praxis é um prodígio individual e/ou coletivo da técnica virtuosística e de
manipulação de alguma cibertecnologia”
Improvisar
será tudo isto. Ou, sintetizando: a capacidade apurada, por vezes
transcendente, do músico se ouvir a si próprio, ouvir os outros e agir em
conformidade. O grande improvisador deixa-se tocar pela música, reinventa-se a
cada instante no contacto com a “sua” música e com a música dos que improvisam
a seu lado. Alguns, os maiores, ardem e esgotam-se nesse contacto. Falamos de
liberdade e devoção. Da liberdade da devoção, mas também do pânico, doo sublime
e da loucura, de um Michel Portal, por exemplo, que soube romper os véus. Mas
também de um Derek Bailey ou de um Evan Parker, outros dois grandes
improvisadores que estiveram presentes no “Ciclo de Nova Música Improvisada”
que antecedeu e preparou as atuais “Fonoteca Files”.
Improvisações livres
As “Fonoteca Files 2” têm como
nomes mais fortes do seu programa os AMM (John Tilbury, piano, Keith Rowe,
guitarra, Eddie Prévost, percussão), formação mítica da música improvisada
desde os anos 60; e Zeena Parkins, harpista, que chega aureolada com a recente
participação no último álbum de Björk. Joëlle Léandre (contrabaixo), Carlos
Zíngaro (violino), Paul Lovens (percussão), Ikue Mori (eletrónica), Fred Van
Hove (piano), Gerry Hemingway (percussão), Phil Minton (voz), Nuno Rebelo
(guitarra, eletrónica) e Telectu são outros dos participantes, todos eles
praticantes fervorosos no meio da improvisação.
Se
Zeena Parkins e Ikue Mori ultrapassaram a barreira exclusiva da improvisação,
através do convívio regular com o rock e a pop – antes da participação no disco
de Björk, Zeena notabilizara-se no universo híbrido da chamada escola
Recommended, ao integrar grupos como News From Babel, Carbon (de Elliott Sharp)
e Skeleton Crew; Ikue Mori fez parte do grupo de “no wave” DNA, sendo
“descoberta” por John Zorn no célebre clube nova-iorquino, CBGB –, já os AMM
conservaram intacta uma aura de esoterismo que os levou a nunca ceder aos imperativos
de uma indústria ávida de catalogações, contra as quais as “Fonoteca Files”
também se insurgem.
Surgidos
na década de 60 na sequência e como reação ao free jazz, os AMM integraram na
sua primeira formação um músico e teórico que viria a tornar-se referência das
vanguardas até aos dias de hoje: Cornelius Cardew, falecido em 1981 e objeto de
estudo de uma biografia assinada por John Tilbury. Investidos da missão de
fazer alargar os parâmetros, quer da composição “instantânea”, quer dos modos
auditivos e percetivos do público, os AMM permaneceram firmes num dos lados da
barricada, mas sem descurar uma sistemática abertura de espírito que os levou,
nos anos do Psicadelismo, a tocar na primeira parte de concertos dos Pink Floyd
ou dos Cream, ou a experimentarem a eternidade do minimalista La Monte Young.
Como
as “X-Files”, as “Fonoteca Files” oferecem mais do que um mistério para
desvendar.
CARTAZ
CONCERTOS
Hoje, 13
Nuno
Rebelo + Kato Hideki + Marco Franco
Axon
+ Fred Van Hove
Sexta, 14
Zeena
Parkins + Ikue Mori
Telectu
+ Gerry Hemingway + Tom Chant
Sábado, 15
Joëlle
Léandre + Carlos Zíngaro + Paul Lovens
AMM
LISBOA
Teatro Municipal S. Luiz. Tel.: 213430805. Sempre às 22h. Bilhetes a
1500$00/dia
CONFERÊNCIAS
E “WORKSHOP”
Hoje, 13
“The
avant garde and improvisation on a minefield of misconceptions”
Conferência
por John Tilbury
Sexta, 14
“Improvisação
livre. A experiência britânica de uma mistura profana de coragem cultural e
conveniência económica”
Conferência
por Eddie Prévost
Sábado, 15
“Guitarra
experimental”
Workshop
por Keith Rowe
LISBOA
Fonoteca Municipal. Tel.: 213541201. Conferências às 18h30; “workshop” às 15h.
Entrada livre.
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