26 de Julho 1998
Brigada
Victor Jara em Pontedera no Festival Sete Sóis Sete Luas
Palminhas
acabou e ninguém se enganou
Consumada a apresentação dos Gaiteiros de Lisboa e da Brigada Victor
Jara em Itália, integrada no Festival Sete Sóis Sete Luas, resta saber até que
ponto terão sido deixadas sementes desta passagem. Para lá dos momentos de
maior ou menor inspiração de cada grupo, ambos deixaram cartel. Os italianos
gostaram.
A
Brigada ri-se, propõe a dança, usa acordeão e não se
envergonha de
tocar um vira, umas “saías” ou um baile
mandado
Ao contrário do concerto dos
Gaiteiros de Lisboa em Roma, para uma plateia enfarpelada, a actuação da
Brigada Victor Jara, em Pontedera - pequena cidade da Toscânia onde fica a sede
do Festival Sete Sóis Sete Luas - caracterizou-se pela ausência total de
sofisticação: música simples e directa que teve como principal preocupação
transmitir uma imagem clara da música tradicional portuguesa.
Os Gaiteiros ostentam a pose dos
estetas para quem o folclore é um tecido elástico destinado à confecção de uma
música que exige a participação do intelecto. A Brigada ri-se, propõe a dança,
usa acordeão e não se envergonha de tocar um vira, umas "saias" ou um
baile mandado. Logo de início ficou claro que os sete músicos do grupo tinham
vindo para se divertir. Em plena via Roma, onde o palco estava instalado, no
meio de esplanadas e de uma "movida" incessante, tendo como pano de
fundo o letreiro da Banca Toscana, Manuel Rocha - que apresentou cada uma das
canções num italiano mais do que aceitável - e os seus pares começaram por pôr
a criançada aos pulos. Bom sinal. De que não era necessário ligar o interruptor
do cérebro para captar as ondas enviadas. Foi um concerto normal, elaborado
para agradar a toda a gente, com uma estrutura que alternou a maior extroversão
das danças com baladas como "Bento airoso" e "Marião".
"Carvalhesa",
"Aboio", "Murinheira", "Cana Verde", "Chula
de paus", "S. João", "Campanitas de Toledo" e uma
"Mazurka" bem folk-rock se não puseram propriamente em delírio uma
plateia pouco familiarizada com a tradição portuguesa (ainda que alguém se
tenha lembrado de associar alguns dos ritmos à tarantela), foram, apesar de
tudo, suficientes para fazer bater palmas de compasso, arrancar alguns bravos e
trazer, ao fim de meia hora de concerto, os músicos de novo para cima do
estrado para dois "encores", "Mi morena" e, a terminar, um baile
mandado segundo as regras, com as "mãozinhas a abanar" e
"palminhas acabou e ninguém se enganou", seguidas à risca pelo
público de Pontedera.
Manuel Rocha, em grande forma no
violino e evidenciando uma saudável boa-disposição, despediu-se com uma
justificação: "garanto-vos que sei falar muito bem português, o italiano é
que foi miserável". Mentira. Rocha revelou-se um óptimo
"entertainer", pontuando cada momento da actuação da Brigada com
pequenas explicações despreconceituosas que tiveram o mérito de contextualizar
e aproximar a música do grupo de uma assistência que acabou por se render,
obrigando mesmo a faina incansável de adolescentes, que até altas horas da
noite percorre de ponta a ponta a via Roma, a parar e a prestar atenção.
Consumada a apresentação dos
Gaiteiros e da Brigada em Itália, resta saber até que ponto terão sido deixadas
sementes desta passagem. Independentemente dos momentos de maior ou menor
inspiração de cada grupo, ambos deixaram cartel. Os italianos gostaram. Fez,
por isso, alguma pena ver imensa gente a perguntar onde poderia encontrar os
discos. É que a memória é curta e não ficaria mal às editoras esforçarem-se um
pouco mais no apoio a este tipo de iniciativas, disponibilizando uma
percentagem de discos para venda no local.
O Sete Sóis Sete Luas prossegue em
Portugal, integrado na programação do Dia de Itália que irá ter lugar na Expo
já no próximo dia 29. Absolutamente a não perder será a actuação de Ricardo
Tesi e da sua Banda Italiana no Convento de Cristo, em Tomar, no último dia
deste mês.
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