08/10/2021

Enovisões [Brian Eno]

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O que faz falta…
 
ENOVISÕES
 
O panorama editorial das vídeo-cassetes musicais é, entre nós, confrangedor. O amante da imagem gravada e da boa música, cujos gostos vão além dos Queen, Pink Floyd, Supertramp ou Phil Collins, pouco ou nada encontrará no mercado que satisfaça as suas apetências estéticas.
Para além de registos de concertos com grupos de “top” ou de coletâneas de “clips” com objetivos exclusivamente promocionais, é a desolação. Da multiplicidade de novas e sofisticadas propostas audiovisuais que vão surgindo por essa Europa fora, nada nos chega e quase ninguém se interessa. Faz imensa falta, por exemplo, conhecer e ter acesso ao trabalho em vídeo de um senhor chamado Brian Eno e muito concretamente às cassetes da sua autoria, “Thursday Afternoon” e “Mistaken Memories”.
As imagens filmadas pelo mestre da “discreet music” chocam com os hábitos e preconceitos das atuais estratégias editoriais. Em vez de montagens ultrafrenéticas, Eno devolve-nos o silêncio e ensina-nos a saber de novo olhar. Nas suas obras, os sons e as imagens fluem com a lentidão da eternidade. À segmentação do tempo, contrapõe a sua distensão até aos limites da quase imobilidade.
A objetiva eleva-se acima dos arranha-céus de Nova Iorque, filmando a passagem das nuvens e da luz que assombram o caos dos níveis inferiores. As imagens e os sons deslizam lentamente. Não contam nenhuma história senão a do nosso filme fantasmático. “Thursday Afternoon” e “Mistaken Memories” provam, de forma radical, que a vídeo-arte permanece aberta a novos códigos.
Registe-se ainda que ambas as cassetes apresentam o formato vertical. A imagem aparece deitada no ecrã, sendo necessário deitar de lado a televisão ou então inclinar lateralmente a cabeça, num ângulo de noventa graus. Tal como Brian Eno, também neste caso a ginástica faz bastante falta.
 
QUARTA-FEIRA, 7 MARÇO 1990 VIDEODISCOS

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