Pop Rock
27 de Julho 1991
TRABALHO DE PROFISSIONAL
“Gostava de abrir
novos caminhos e deixar alguma marca na música, que todos identifiquemos como
nossa – é isso que eu estou a tentar fazer”
Foi o que disse um dia Tom Petty, levantando a ponta do véu sobre as suas
intenções relativamente às suas ambições musicais. Disse “tentar fazer” e disse
muito bem. O problema está menos nas intenções, cem por cento louváveis, e mais
nos resultados. É que, até agora, por mais tentativas que faça, e já leva 20
anos de música no ativo, Tom Petty não consegue abrir caminho nenhum. Quanto à
“música que todos identifiquemos como nossa” não se percebe muito bem o que
quer dizer. Devia estar bêbedo.
“Into the Great Wide Open” é rock and roll suave, fluente, com a cadência
fácil e sem atritos de um automóvel rolando em quinta velocidade numa
auto-estrada americana. Mas nem sempre o que parece girar sobre esferas é o
mais interessante e, muito menos, o mais original. Como Tom Petty, há dezenas
de outros músicos que “gostavam de abrir novos caminhos” (na maior parte das
vezes em vez de abrir, fecham-os), a borbulhar na sopa requentada dos tops
norte-americanos. Bruce Springsteen deu mote dos “contadores de histórias”
solitários, eternamente “on the road”, à procura da América mítica e de si
próprios. Mas nem todos podem ser como Tom Waits ou Stan Ridgway, das poucas
exceções à regar geral, pautada pela mediocridade.
Há neste disco uma complacência irritante que deixa adivinhar o vício
mais grave da preguiça. Sente-se que aquilo que Petty faz, fá-lo com uma perna
às costas, com a destreza e a competência de um profissional. Seria
desculpável, segundo a máxima de “quem faz o que pode e sabe a mais não é
obrigado”, se Tom Petty não desse mostras de poder fazer muito mais. Se não faz
é porque não quer, até porque, assim como assim, os discos vendem que se
fartam.
Nota-se que o guitarrista poderia ter ido bem mais longe na exploração do
filão melódico patente em faixas como “Into the great wide open”, “All or
nothin’” ou “Too good to be true”, em que as imagens de uma América à beira da
desolação (“morning on the outskirts of town/sitting in the traffic alone, you
don’t know what it means to be free”) formam um filme negro coerente, servido
pelo argumento plausível da “rock’n’roll way of life”. Talvez o defeito esteja
na produção, demasiado adocidada, de Jeff Lynne, o homem da Electric Light
Orchestra. Seja como for, a música não está de modo nenhum ao nível das
palavras e dos ambientes que se procuram evocar.
Ao contrário do que Tom Petty afirma, as canções não estão “em qualquer
lado para onde se olha”. Se assim fosse, só os cegos não fariam música. E o
pior cego é aquele que não quer ver. **
TOM PETTY AND THE HEARTBREAKERS
Into The Great Wide Open
LP/MC/CD,
MCA, distri. BMG
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