26
de Maio 2000
Impressiona pela técnica instrumental irrepreensível e pela cabeleira
que já foi vermelha e agora é verde-alface. Para Cristina Pato, a “Tolemia”
(“loucura”) é palavra de ordem e a gaita-de-foles um brinquedo tão colorido
como os seus cabelos. Esteve recentemente em Portugal para promover o seu
segundo álbum, com edição prevista para o final do mês.
Cristina
Pato lança segundo álbum
Uma
gaiteira colorida
“Tolemia”
não é um grande álbum – falha na produção e na escolha do reportório – mas
revela uma notável gaiteira, Cristina Pato, galega, 19 anos, e os últimos 16
passados a estudar e a tocar o instrumento que é o emblema da sua região natal.
Com a saída iminente de um novo álbum, intitulado “Xilento”, Cristina Pato
garante ao PÚBLICO que emendou a mão. Para já, prestígio é coisa que não lhe
falta. Na Galiza todos a conhecem, não só pela cor dos cabelos, como pelo seu
inquestionável talento. Os Chieftains (na digressão que fizeram por Espanha,
este ano), Carlos Nuñez e a sua compatriota Susana Seivane já a convidaram para
tocar com eles.
Cristina
Pato é a mais nova de quatro irmãs, filha de um acordeonista e de uma
pandeireteira. “Na minha casa não havia a tradição de tocar gaita-de-foles”,
conta. Foi a irmã mais velha, Raquel, que lhe pôs nas mãos, pela primeira vez,
uma gaita. Cristina tinha então três anos, quando soprou pela primeira vez na
ponteira. Mais tarde entrou para a escola de gaitas de Ourense (que passou de
150 gaiteiros, quando da sua formação, para os 20 mil actuais!), onde aprendeu
com Xosé Luís Foxo, tendo tocado na banda de gaitas da cidade durante dez anos.
Entre os quatro e os 15 anos, Cristina Pato dividiu os estudos da gaita com os
do piano. Antes de gravar “Tolemia” – “gravado em cinco dias, antes do Natal de
1998, com os meus amigos e com meios limitados” –, o seu primeiro trabalho a
solo, fez parte dos Mutenrohi, com quem gravou dois álbuns. “Xilento”, o novo
álbum, conta com as participações de Uxia Peixoto e do português Rui Júnior e
é, segundo a sua autora, “um disco muito variado e mais próximo de Portugal”. O
rótulo “céltico” e o fenómeno da “irlandização”, que ainda há não poucos anos
apoquentava os nossos irmãos galegos, não a preocupam. “Antes as pessoas
conotavam a gaita-de-foles sobretudo com a Irlanda ou com a Escócia, mas
finalmente perceberam que cada país tem a sua gaita específica, nacional. A
gaita galega é o instrumento principal da música da Galiza.”
Hoje,
Cristina Pato divide as atenções, no capítulo das mulheres tocadoras de gaita,
com Susana Seivane, um pouco mais velha do que ela. Conheceram-se, há alguns
anos, em Tenerife, “trocaram de gaitas” e a rivalidade, se existe, “é apenas
criada pela imprensa”. E se Susana arrancou em força logo com um fantástico
álbum de estreia, Cristina Pato prepara-se, também ela, para dar a sua
contribuição para a revolução nas técnicas de execução da gaita galega que nos
últimos anos se tem vindo a processar, através de gaiteiros como Carlos Nuñez,
Anxo Pinto ou Xosé Manuel Budiño.
Apesar
do respeito que tem pela música tradicional, a gaiteira admite que a sua música
e os seus espectáculos têm mais a ver com o rock, destinados a ser apreciados
pelas “grandes massas”: “Gosto que o público baile, se sinta bem, e de me
divertir. Gosto de ouvir guitarras eléctricas e bateria, de rock ‘n’ roll.” A
sua banda usa bateria e sintetizadores. Porque, “para um estrangeiro, a
gaita-de-foles tem um som muito duro e são necessários outros instrumentos para
tornar a audição mais fácil”.
Em
conformidade, a preocupação em mostrar uma imagem exterior espalhafatosa não é
descurada. Actualmente de um verde electrizante, os cabelos de Cristina já
foram vermelhos e mesmo cor de laranja, a primeira cor com que os pintou, então
com apenas 11 anos (“a minha mãe esteve um mês sem me falar…”). Os mais velhos
erguem o sobrolho mas acabaram por se conformar. “Não faço do meu aspecto, ou
da minha indumentária, uma filosofia de vida.”
Além
da Galiza, Cristina Pato nutre uma paixão especial pela musica do Brasil: “Da
minha colecção de CD, uma grande parte é preenchida por discos de música
brasileira: Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Chico Buarque…” Tem uma
explicação: “O meu professor de piano é brasileiro!” Faz sentido, olhando para
a imagem colorida de Cristina Pato e ouvindo a forma extrovertida como toca, é
difícil não pensar no Carnaval. “Não tento tocar como os velhos mestres,
estamos no séc. XX, a minha geração ouve Carlos Nuñez mas já não ouve Ricardo
Portela. Aos nove anos ninguém vai dizer: ‘Mamã, quero ir estudar com o Ricardo
Portela’ [risos]. Eu defino-me como uma gaiteira fresca e divertida. Toco gaita
porque é um instrumento divertido. E porque é tocado com o coração!”
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