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MARÇO 2003
JAZZ
DISCOS
Coltrane de luxo
JOHN COLTRANE
A Love Supreme
10 | 10
Coltrane
7 | 10
Ballads
8 | 10
Impulse, distri.
Universal
Apesar
do atraso, não é possível deixar passar em claro a reedição, ou as “De Luxe
editions”, de três álbuns importantes na discografia de John Coltrane, a
começar pela obra-prima “A Love Supreme”, agora apresentada num formato
inovador que, além dos quatro movimentos que integram a “suite” original, gravada
em 1964 e editada pela primeira vez no ano seguinte, inclui um segundo CD com a
única gravação ao vivo (no festival de Antibes, concerto do qual existe a
circular uma outra edição, semi-pirata...) registada em disco deste tema, bem
como quatro “takes” alternativos, dois das quais, de “Ackowledgment”, com as participações
de Archie Shepp, no sax tenor, e Art Davis, no contrabaixo. Extra que, no caso
de Shepp, pouco acrescenta, antes dilui a carga emocional do que é, antes de
mais, uma oração a solo. Monólogo transformado em diálogo, feito de
entendimento, mas também alguma condescendência.
“A Love Supreme” é, como se sabe, o
disco de “redenção” de Coltrane, a sublimação de um percurso torturado que
mergulhou no inferno das drogas, dedicatória ao sagrado, requisição à
transcendência. Sobre motivos melódicos simples (o de “Aknowledgment” não
poderia ser mais parco no número de notas) Coltrane, McCoy Tyner, Jimmy Garrison
e Elvin Jones erguem um vasto e complexo edifício rítmico e harmónico. Coltrane
forçara as portas da perceção e em “A Love Supreme” volta a usar a violência e
a loucura perfeccionista que o animavam para através da música esgotar as
preces, os gritos de revolta, de louvor e de perdão. Acompanhá-lo, nota a nota,
nesta viagem, constitui uma experiência arrasadora.
“Coltrane”, de 1962, foi a primeira gravação
de estúdio do mítico quarteto. De novo a um primeiro CD que reproduz a gravação
original foi acrescentado um segundo, contendo material inédito das mesmas
sessões, entre os quais alguns inéditos. À semelhança de “A Love Supreme”, a
nova remasterização é da responsabilidade de Rudy van Gelder, a partir de fitas
de qualidade superior às utilizadas nas anteriores reedições da Impulse. No
meio de material abrangente e algo desequilibrado, o tema de banda sonora, “The
inch worm”, brincadeira sem consequências de maior, empalidece ao lado da
balada “Soul eyes” e do típico balanço tyneriano de “Out of this world”, sobre
o qual o saxofonista (que neste disco juntou o soprano ao tenor) dá um dos seus
recitais de “hard bop”.
“Ballads”, gravado poucos meses mais
tarde, obedece, na presente reedição, aos mesmos procedimentos. Versão oficial num
CD, versões e “takes” no outro, incluindo cinco do tradicional “Greensleeves” e
sete de “It’s easy to remember”, ilustra o lado, menos citado, de Coltrane enquanto
intérprete, não menos inspirado, de baladas. Isto e o facto de uma insistente
dor de dentes que então o afligia ter impedido um outro “ataque”, mais duro, da
palheta, pelo que um reportório de baladas se revelou mais apropriado...
Oportunidade para escutar o Coltrane mais “smooth” e dançante, a dar outra
descontração aos seus companheiros. Jimmy Garrison, então, parece flutuar.
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