CULTURA
SÁBADO,
5 ABR 2003
C r í t i c a M ú s i c a
Orquestra
Victor Jara
Brigada Victor
Jara + Shantalla
PORTO Coliseu dos Recreios
Quinta dia 3, às 21h30
Meia
sala
Não correu de feição a estreia no palco
principal do Coliseu dos Recreios da banda irlandesa Shantalla, a abrir a 13ª
edição do Festival Intercéltico do Porto, perante pouco público e com o azar e
o clima de crise a fazerem-se sentir. Helen Flaherty, a fotogénica cantora do
grupo, não esteve presente, devido à morte do pai, sendo substituída à última
hora por Niamh Parsons, que o Intercéltico já acolhera como cantora dos Arcady.
Niamh
não teve culpa. Voz e sensibilidade à altura, defendeu-se da notória falta de
ensaios, optando por vocalizações “a capella”, ou com o apoio cauteloso da guitarra
de Joe Hennon e as tímidas pontuações decorativas do violino de Kieran Fahy e o
acordeão de Gerry Murray. Foi, porém, no desempenho instrumental que os Shantalla
desiludiram, não fazendo jus às capacidades que dão a entender no belíssimo álbum
“Seven Evenings, Seven Mornings”.
Michael
Horgan, que no disco faz maravilhas, aparentou ser um executante vulgar nas “uillean
pipes”, embora tenha ficado a ideia de uma amplificação deficiente do
instrumento. O palco enorme do Coliseu confirmou, por outro lado, estar longe
de proporcionar a intimidade de um “pub”... Os músicos e as notas pareceram desligados,
faltou alegria, com o público a reagir automaticamente aos apelos à dança e aos
apartes que entraram na rotina, das referências ao álcool ao “peço desculpa mas
o meu português é muito fraco” da praxe. Difícil filtrar o ar da tristeza do
tempo...
Na
primeira parte a Brigada Victor Jara surpreendeu. Arrancada a um estado de
letargia que ameaçava conduzir a banda para o estatuto de “velha glória” resignada
a receber o “prémio de carreira”, a música readquiriu uma vitalidade e um
sentido de urgência que o recente álbum ao vivo não fazia prever. O palco
encheu-se de 19 músicos, incluindo uma secção de metais dirigidos pelo
trompetista Tomás Pimentel e quatro gaiteiros galegos dirigidos por Xosé Gil
Rodrigues. Muita gente numa ameaça de confusão que nunca aconteceu, graças à liderança
forte do violino, cada vez mais depurado e classizante, de Manuel Rocha, e dos
teclados de Ricardo Dias, a quem a Brigada Victor Jara deve muita da atual fase
de renovada pujança e criatividade.
Entre
um reportório constituído por cinco originais a incluir no próximo álbum –
“Dailadou”, “Caracol”, “Durme”, “Lenga lenga” e “Meninas vamos à murta” – e
temas antigos como “Menino Jesus”, “Mi morena” e “Bento airoso”, submetidos a
arranjos originais, destacaram-se uma épica “Cantiga bailada”, repetida no
“encore”, com a Brigada transformada em orquestra de folk progressivo, e o inesquecível
desempenho vocal de Catarina Moura, em “Durme”, tema da tradição sefardita a
exigir concentração, afinação e emotividade sem falhas, que teve na cantora uma
intérprete de exceção. A forma como resolveu a transição de tom no final de uma
das frases provocou arrepios.
O
Intercéltico termina hoje com atuações da cantora galega Mercedes Péon e da
superbanda irlandesa Altan.
EM RESUMO
No confronto Portugal-Irlanda, uma
renovada Brigada Victor Jara derrotou os Shantalla desfalcados da sua cantora
habitual
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