Y 6|JUNHO|2003
roteiro|discos
@C
Hard Disk
8|10
PEDRO TUDELA
Là où je Dors
8|10
LONGINA
!Siam Acnun
7|10
VÍTOR JOAQUIM
La Strada is on Fire (and
we are all Naked)
8|10
Todos ed. Crónica, distri.
Matéria Prima
@c, pedro tudela, vítor joaquim e longina
crónicas da terra digital
“Crónica”
é nome de série de uma nova editora nacional de eletrónica. Com informação
áudio e vídeo e “links” diretos ao neurónio mais próximo. Primeira edição da
coleção, “Hard Disk”, dos @c (Miguel Carvalhais, Pedro Almeida e Pedro Moreira)
inclui seis disseminações sónicas e um vídeo da programadora gráfica e artista
digital Lia. Refrações industriais, vozes enforcadas numa linha de montagem de
clones psicóticos, ordenadores de batidas digital/tribais. Pan-Sonic, Cabaret
Voltaire de “Mix-up” e “Voice of America” em versão rolo compressor são
enxertados na memória. Forward. Valsas ao longe, frequências “limpas” e
“sujas”, sinais de rádio, dissecação do interior de um “chip” com vida. “Hard
Disk” é uma ampliação, um ato de voyeurismo que tira prazer do processamento
digital. Os sons nascem do vazio e a ele regressam. Mas analise-se a
radiografia sonora desta sequência de tempo e encontrar-se-á um universo em
metamorfose evolutiva. Crónica número um da terra digital: aprovada sem
reservas para usos indiscriminados.
Crónica número dois. Pedro Tudela
sai do coletivo @C para apresentar “Là où je Dors”. Onde o coletivo opta por
apenas numerar cada tema, Tudela intitula os seus com termos como “Forest”,
“Carrousel” (alô cluster), “man that can not touch woman”, “Mermaids”, “Bed of
Clouds” e “Delirium with dolls”. Sabe-se da importância da palavra poética
enquanto fator de indução de imagens. Desta conjugação Tudela faz surgir drones
das quais vão emergindo batidas de “ambient tecno”, cortadas por arranhões nos
locais mais extravagantes da rede sónica, efeitos de “delay” e “phase”, sobreposições,
ecos, súbitas eclosões de ruído seguidas de contrações e aspirações. “Là où je
Dors” pode ser um complemento dos @C em que o composto sonoro abre mais uma
janela, deixando antever uma fauna e uma flora não menos monstruosas onde cada
aberração é capaz de espantar por uma conceção do Belo que se infiltra como uma
doença. Aprovada para uso farmacológico ou para contemplação em estados de consciência
alterados.
Crónica número três. “!Siam Acnun”
(“Nunca Mais”, ao contrário) do galego Longina. Algumas fórmulas rítmicas
semelhantes às dos @C, mas recuperando o “groove” com patas de inseto de Victor
Nubla sob a designação Xjacks, o “swing” dinossáurico, terrivelmente aditivo,
dos Esplendor Geometrico ou o minimalismo dos Rechenzentrum. Baixo de jazz
moribundo, piano-anagramas, binários de tribos perdidas, cortam as batidas
daquela que, das quatro, será a crónica mais perto de se poder dançar mas
também a que mais se aproxima de alguns estereótipos do género. Aprovado para
sessões de terapia de hipnose de regressão.
Crónica número quatro. “La Strada is
on Fire (and we are all Naked)” de Vítor Joaquim. Com Martin Archer (saxofones
processados), Rodrigo Amado (saxofones), Victor Coimbra (baixo) e Mariana F
(voz). E pedaços de sons extraídos de emissões de TV, uma “velha estrela de
rock” e “um discurso de Bill Clinton (depois de um bombardeamento com danos
colaterais). Ainda a eletrónica como máquina de sonhos fabricados a partir de
recortes da realidade mesmo que a “realidade” não seja mais do que a
fenomenologia de um mundo “exterior” que nos é vedado. A estrada está a arder
mas não nos damos conta. E Vítor Joaquim filma o vazio do pós-incêndio. Os
saxofones conferem uma nota de psicadelismo-etno e “alien jazz” a uma música
que ocasionalmente evoca os SPK na sua vertente mais ritual. Aprovado como
banda-sonora de um “peep show” para o pós-Apocalipse.
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