17/02/2011

Maria João e Mário Laginha - Lobos, Raposas E Coiotes

Sons

8 de Outubro 1999

Maria João e Mário Laginha
Lobos, Raposas e Coiotes (8)
Ed. e distri. Universal

Voz única da música feita em Portugal, Maria João ensaiou ao longo da sua carreira experiências várias que incluíram os diálogos frutuosos com a pianista japonesa Aki Takase e a participação, em duo, trio ou quarteto, com alguns dos nomes mais prestigiados do jazz contemporâneo. Mas foi com o pianista Mário Laginha que a sua voz e a sua expressividade de intérprete de excepção encontraram terreno sólido para se desenvolver com outra regularidade. Ao lado de Mário Laginha, Maria João redescobriu-se numa intimidade que tem sabido renovar a cada novo lance. Se em “Cor”, álbum cronologicamente anterior a este mas posterior no tempo da sua realização, os dois músicos cultivaram a balada de tonalidades étnicas, neste novo trabalho a inclusão de uma orquestra concedeu-lhes uma maior amplitude e espaço de manobra. “Lobos, Raposas e Coiotes” vive da dinâmica entre as grandes massas sonoras orquestrais e os discursos solistas da voz e do piano, num todo cujo parentesco estético com a obra mais concertista de Egberto Gismonti é, por vezes, evidente. E se Maria João não descura a assinatura de registos que se tornaram imagem de marca do seu estilo – referências à Índia, a África e ao Brasil, os trejeitos infantis em contraste com os graves guturais “masculinizados” – todas essas vozes parecem ter encontrado um equilíbrio novo e uma razão de ser, quando, noutras ocasiões, rondaram perigosamente o lugar-comum. As extraordinárias interpretações de “Beatriz”, de Edu Lobo e Chico Buarque, e do clássico “Asa branca”, de Luís Gonzaga, ou os tempos contemplativos de “Chão”, fazem esquecer a técnica para revelarem emoção pura. Os lados gismontiano e “meredith monkiano” sobressaem em “Uma casa com gente” enquanto “Várias danças” é motivo de múltiplas cadências, do som e da alma. Mário Laginha, por seu lado, brinca com prazer com os naipes orquestrais, extraindo-lhes uma ludicidade que distingue “Lobos, Raposas e Coiotes” do academismo que afecta tantos trabalhos deste tipo ao mesmo tempo que o seu “soloing” continua a revelar nuances inesperadas, como a melancolia, muito satieana, de “Chão”. Uma campanha bem orquestrada.

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