30/08/2009

"Feeling" para a festa [David Byrne]

Sons

13 de Fevereiro 1998

David Byrne actua amanhã no Porto e no Domingo em Lisboa

“Feeling” para a festa

David Byrne regressa este fim-de-semana às salas nacionais, a meio da sua digressão “Feelings”. Com uma “big band” virtual a garantir tempo de festa. Entre um novo disco de remisturas com edição privada e um próximo dueto com Caetano Veloso, prepara-se para fazer sair na sua Luaka Bop um álbum do angolano Waldemar Bastos. Paulo Bragança é que terá que esperar. O antigo mentor dos Talking Heads não gostou do novo dos Radiohead. Sobre os Tortoise diz que fica “à espera que apareça o vocalista, só que não aparece vocalista nenhum...”.

Uma banda de cinco músicos de variadas proveniências e estilos e uma quantidade apreciável de “samplers” garantem a diversidade de uma festa antecipadamente prometida. Foi, entre outras coisas, o que explicou ao PÚBLICO David Byrne, apreciador do fado, da comida portuguesa, da música de Björk e de “conversar e beber à mesa com os amigos”.

PÚBLICO – O que está a fazer actualmente: cinema, fotografia, algum disco novo?
DAVID BYRNE – De momento, tudo o que existe de novo é um álbum de remisturas de canções minhas, por pessoas como DJ Food ou dois tipos de Washington D.C., dos Thievery Corporation, e que só se encontra à venda nos concertos. Também fiz um espectáculo de fotografia, na sequência da exposição que apresentei em Lisboa há dois anos. Agora essa exposição cresceu até se parecer mais com uma instalação, com som e luzes. Estou a negociar a sua apresentação em Trieste e em Munique. Depois de ter estado em Madrid, seguirá talvez para Sevilha. Em Lisboa só se houver alguém interessado...
P. – Por falar em discos, o que se passa com o álbum de Paulo Bragança, que até há bom pouco tempo era muito badalado, para a sua editora Luaka Bop?
R. – Em primeiro lugar, ele foi obrigado, por razões contratuais, a gravar um álbum para a sua antiga editora, com material tradicional. Neste momento, cabe-lhe a ele decidir sobre a direcção musical que pretende seguir no próximo álbum. Tanto quanto percebi, ainda não decidiu nada. Por outro lado tem sido difícil para nós fazer chegar a sua música às pessoas, não sei bem porquê. Gosto dos seus discos mas, para dizer a verdade, tem havido problemas. Para algumas pessoas e sua música não é suficientemente tradicional. Para outras, pelo contrário, é demasiado tradicional, não é pop..
P. – Quais são, então, as próximas edições da Luaka Bop?
R. – Waldemar Bastos, que também vive em Lisboa. A gravação já está completa. Também temos um disco de um grupo da Venezuela, Los Amicos Invisibles, com música de dança, “funk” e “disco” misturados com “salsa”.
P. – Depois de ter participado em “Red, Hot & Rio” irá colaborar no próximo “Red, Hot & Lisbon”...
R. – Já tinha uma canção para esse disco em que utilizava um “sample” de Caetano Veloso que não havia meio de chegar a uma forma definitiva. Foi então que alguém sugeriu que trabalhássemos os dois juntos e já começámos a trabalhar nesse sentido. Já gravei algumas partes em Nova Iorque e hoje mesmo recebi um “e-mail” dele a dizer-me que vai entrar em estúdio.
P. – Também está prevista a sua colaboração na Expo-98 que abrirá em breve em Lisboa. Pode adiantar-nos pormenores sobre o que tenciona fazer?
R. – Prefiro não falar nisso por enquanto. Ainda não existe nada de concreto sobre essa matéria.
P. – Escreveu o prólogo para uma biografia sua da autoria do português José Manuel Simões, a lançar em breve, onde se refere à melancolia, à comida e aos sentimentos dos portugueses. Por outro lado é conhecida a sua admiração pela cultura brasileira. Afinal o que o atrai mais na língua portuguesa e nos portugueses?
R. – Em primeiro lugar, a música, o som da própria língua quando é cantada, e um tipo especial de melodias. Foi por aí que fiquei apanhado. Mas há outras coisas que me atraem em Portugal, como a comida. Durante muito tempo era impossível comer comida portuguesa em Nova Iorque, pelo menos, de boa qualidade. Hoje já não é assim.
P. – A sua música é, em geral, bastante rítmica. No entanto gosta de fado, não é verdade?
R. – A minha música não tem necessariamente de soar como a música de que gosto. Mas é possível que o fado exerça alguma influência sobre determinadas melodias que componho...
P. – Que tipo de concerto apresentará nos próximos espectáculos de Lisboa e do Porto?
R. – Vai ser tempo de festa! Com uma banda pequena, mas montes de “samplers”, por isso soará como uma “big band”, com músicos virtuais! Músicos reais, serão apenas cinco. É uma mistura estranha de músicos de discoteca e de clubes (atenção, é preciso esclarecer que a cena dos clubes em Nova Iorque não se esgota na música de dança, há muita gente a fazer coisas experimentais com electrónica ou a tentar criar determinados ambientes...), com um músico de “country” que toca “pedal steel” e um baixista da Jamaica.
P. – Nunca mais voltou a tocar com nenhum dos seus antigos companheiros dos Talking Heads?
R. – Não, já não os vejo há cerca de dois, três anos...
P. – Que tipo de música anda a ouvir neste momento? Que discos? Alguma banda nova o entusiasma particularmente?
R. – Estou sempre a ouvir coisas novas, às vezes música da minha própria editora. Gosto do disco de Finley Quaye, um cantor inglês de “reggae”. Dos Radiohead não gostei nada, comprei o álbum, ouvi-o duas vezes, mas não me diz nada. Pelo contrário, gosto imenso do novo da Björk.
P. – A cena pós-rock de Chicago diz-lhe alguma coisa?
R. – Refere-se aos Tortoise? Têm coisas engraçadas. Estamos sempre à espera de quando vai aparecer o vocalista só que nunca chega a aparecer vocalista nenhum! Soa como uma canção sem melodia. A edição japonesa com remisturas de temas deles pareceu-me interessante.
P. – No mundo de hoje, onde tudo é permitido, onde todas as pessoas fazem todo o género de coisas, ainda é possível ser-se original, fazer-se coisas novas?
R. – Penso que as pessoas estão sempre a interrogar-se sobre essa questão. No meu caso, arranjo sempre maneira de encontrar e de fazer coisas que me entusiasmam. Pode não ser novo para as outras pessoas, mas é-o, de certeza, para mim. Às vezes, consegue-se fazer algo que soa como novidade para toda a gente...
P. – E que é que o entusiasma, não só na música como na vida em geral?
R. – Coisas simples. Como sentar-me a conversar e a beber uns copos com os amigos.

David Byrne com Jim White na 1ª parte
Porto, Coliseu, amanhã, 20h30
Lisboa, Coliseu dos Recreios, domingo, 20h30

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