Pop
A DISCOTECA
HISTÓRIA POUCO NATURAL
Com efeito, a
psicologia não era propriamente o veículo ideal para Mark se alcandorar ao
estatuto de “imortal”. Na música também não é fácil, mas sempre se vai ganhando
qualquer coisita no entretanto. A primeira etapa chama-se “The Reaction” e
coincide com a euforia destrutiva dos rapazes de alfinete no lábio, da geração
“No Future”, isto é, no ano de 1977. O rapaz, Hollis, navegava nitidamente
contra a corrente. A Beggars Banquet, confusa, pega em “Talk Talk” (a canção) e
inclui-a na coletânea “punk”, “Streets”. Para já estava encontrada a nova
designação para futuros investimentos e cometimentos. O principal era então
conquistar o mundo.
Foi através de Ed Hollis, empresário
e irmão de Mark, que este conheceu e convidou o baterista Lee Harris e o
baixista Paul Webb para integrarem o seu novo projeto. O convite foi aceite.
Nasciam os Talk Talk, sempre com esta formação, já lá vão dez anos. Neste
período de tempo gravaram apenas quatro álbuns. Para tristeza de muita gente e
alívio de outra tanta. Para criar uma obra-de-arte é preciso tempo. Os Talk
Talk deviam ter esperado ainda mais, antes de entrarem em estúdio, mas enfim,
lá gravaram o álbum-estreia em 82. Chama-se “The Party’s Over” e é uma mistura
estranha e desconfortável de título e maneirismos vocais, inspirados em Bryan
Ferry, e atraentes melodias não muito distantes dos parentes próximos, Duran
Duran, com os quais, aliás partilharam uma “tournée” na qualidade de banda de
suporte. O drama dos Talk Talk é que, por mais que se esforcem, não conseguem
produzir uma linha melódica com o “charme”, a fluidez e a facilidade das que os
Duran Duran são capazes, como se isso não lhes custasse mais que meia hora de
intervalo entre um “clip” nas Bahamas e outro na Martinica. O que separa as
duas bandas é a “star quality” e carisma dos meninos bonitos Duran e a total
ausência de imagem dos feiosos Talk. Uns têm, outros... não. Já para não falar
da diferença abissal entre a voz “catchy” de Simon Le Bom e o falsete
esganiçado de Mark Hollis, que, por sinal, até nem é mau compositor. A
Psicologia explica como um complexo de superioridade quase sempre encobre um
sentimento de inferioridade.
“It’s My Life” (84) é a segunda
tentativa em álbum, após um atraente “single”, “My Foolish Friend”, apelando
para o reconhecimento do génio de Hollis. Poucos são sensíveis ao apelo. Dois
anos mais tarde, “The Colour of Spring” assinala a primeira alteração
estratégica. Já que o êxito e a fama lhes é, sistematicamente, negado por via
da canção pop (só a Europa parece dar por eles, proporcionando-lhes um disco de
ouro pelas vendas de “The Party’s Over”), porque não investir no campo mais
sério do “conceptual”? Dito e feito. Pegue-se em Steve Winwood, Robbie McIntosh
e Danny Thompson, em coros e secções de cordas, e está encontrado o conveniente
tom “blasé”, permitindo afirmações do tipo “a nossa música não é comercial.
Apenas nos interessa a qualidade. As massas não entendem”. Com “The Spirit of
Eden” acertam finalmente no alvo. A crítica dispensa-lhes rasgados elogios. O
disco, embora “não comercial”, vende e todos ficam contentes. São seis longos
temas de sumptuoso recorte instrumental, em que Hollis descobre finalmente um
registo vocal mais grave, sereno e, sobretudo, menos irritante, adaptando-se
convenientemente ao tom “soft” e orquestral de todo o disco. É o triunfo e a
glória, tenazmente perseguidos ao longo de anos de penoso caminhar. Mark Hollis
não conseguiu, por enquanto, mudar o mundo. Mudou ele. Quando não os podes
vencer...
Talk Contra Duran
Finalmente o Paraíso
VIDEODISCOS QUARTA-FEIRA,
6 JUNHO 1990
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