12/05/2009

Lida Husik - Fly Stereophonic

Sons

10 de Outubro 1997
DISCOS – POP ROCK

Lida Husik
Fly Stereophonic (8)
Alias, distri. MVM

A música pop, por mais ínvios que sejam os seus caminhos, possui os seus arquétipos. Nos anos 60 os Beatles e os Kinks, em Inglaterra, e os Beach Boys e os Zombies (toda a gente deveria ser obrigada a fazer um doutoramento em torno dessa verdadeira enciclopédia da arte pop que é o álbum “Odessey & Oracle”), nos Estados Unidos, estabeleceram as regras pelas quais uma canção pop digna desse nome se deve reger. Claro que as regras foram feitas para serem quebradas e, neste campo, não têm faltado exemplos, ao longo das últimas três décadas de produção pop, de David Bowie a Robert Wyatt, de Brian Eno (dos primeiros álbuns) aos Residents. Em Inglaterra existiu sempre algo mais, a tal “englishness”, uma combinação, com percentagens incertas, de excentricidade, maneirismo e uma atracção fatal pela melodia perfeita, carregaram este espírito da afectação “mod” até à “Brit pop” dos nossos dias. Nos anos 80, um grupo, sintetizou em si tudo o que a pop inglesa tem de melhor: os Monochrome Set. E falamos deles porque os Lida Husik, ou Lida Husik, a vocalista do grupo, são os Monochrome Set dos anos 90. “Fly Stereophonic”, da estética da capa ao “design” sonoro de todas as faixas, recupera as linhas de sinuosa e decadente elegância do grupo de Bid e Lester Square, ao qual se devem, pelo menos, três obras capitais, “Strange Boutique”, “Love Zombies” e “Eligible Bachelors”. Lida Husik não esconde a devoção pelos Monochrome Set, incluindo no alinhamento de “Fly Stereophonic” uma versão surreal de “Ein symphonie des grauens”. Na ficha de agradecimentos também não se esqueceu de mencionar Bid, o único, o incomparável vocalista de ascendência indiana dos Monochrome Set. A fórmula usada em “Fly Stereophonic!”, que faz dele um brinquedo verdadeiramente atraente, passa pela ênfase posta na melodia, mas seguindo uma das tais regras de ouro da clássica pop irreverente, a imprevisibilidade aliada à doçura, a perturbação e a escuridão disfarçadas sob um vestuário colorido. Em suma: a diletância do “dandy” que vive o maior dos desastres com a fleuma de um alheamento sobrehumano. Os temas de “Fly Stereophonic” remetem para a mitologia e iconografia da adolescência, mas numa perspectiva que junta o terror cósmico com a ingestão de um copo de café com leite e a morte com os prazeres de uma cidade de chocolate. Mas a verdade dos factos diz-nos ainda outra coisa, é que Lida Husik e o seu grupo são americanos, o que acrescenta uma dimensão ainda mais oblíqua à sua música, surgindo então a segunda fonte de inspiração de “Fly Stereophonic”, os B-52’s. Ouça-se, a este propósito, uma faixa como “Soundman”, onde as linhas de guitarra e uma rítmica tipicamente Monochrome Set andam a par de uma vocalização com óbvias conotações com aquele grupo americano. “Fly Stereophonic” é uma experiência de ambientes da “twilight zone”, uma montanha-russa de alumínio polido e sintetizadores de baunilha, onde saltitam canções de algodão-doce envenenado, pintado de roxo e lilás, como “Cape fear”, “Café com leche”, “The slide”, “Dead poets”, “Dancing pants” (com uma inclusão de uma gaita-de-foles ébria) e o verdadeiro manjar para gulosos que é “Chocolate city”, pequenos clássicos a escorrer de um fim de Verão atribulado, apresentados com um excesso de requinte pela voz pristina de Lida Husik.

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