09/11/2008

Romanças - Azuldesejo

POP ROCK

25 de Maio de 1994
WORLD

Romanças
Azuldesejo
Luminária, distri. Strauss

Sintra impõe-se cada vez mais como factor determinante no imaginário e nos métodos de produção dos Romanças. Depois de “Monte da Lua” (uma das designações da mítica cadeia montanhosa), o novo trabalho do grupo foi gravado em plena encosta da serra, na pousada da juventude que fica situada alguns metros abaixo da Igreja de Santa Eufémia. E se a localização do local de gravação desempenhou um papel activo em termos técnicos (captação do som ao vivo em salas de habitação com tempos de reverberação variados, por exemplo), o mesmo não se pode dizer em relação à inspiração. Descontando a presença de elementos aleatórios, como o som real de chuva que acompanha o tema “Candeia” ou a alusão directa ao dia-a-dia vivido na pousada e nas idílicas paisagens circundantes pelos membros do grupo em “Fim do dia”, uma das várias composições originais de Pedro D’Orey, “Azuldesejo” (síntese de azul e desejo), num azulejo contendo 12 símbolos desenhados por João Ramos, correspondentes a cada uma das faixas), poderia ter sido gravada noutro sítio qualquer. O problema principal que se coloca em relação a “Azuldesejo” é que não existe um fio condutor, uma ideia determinante, mas tão-só múltiplas e contraditórias direcções, que acabam por quebrar um pouco a unidade de um trabalho congeminado com minúcia. Há nele pistas suficientes para permitirem aos Romanças serem uma banda diferente consoante a faixa. O tema inicial “as vozes do mundo” é, juntamente com “Janeiradas” (“must” de há longa data nas noites da Taverna dos Trovadores…), um dos que menos quebra os elos com o anterior “Monte da Lua”. No primeiro caso, uma subtil deslocação de um dos eixos criativos de José Afonso; no segundo, a organização de uma desbunda popular onde a todos é dada oportunidade para brincar. “Mineta” é uma das melhores faixas do álbum, com a harpa céltica de Pedro D’Orey a ornamentar uma das peças mais bonitas do nosso cancioneiro. No instrumental “Galicia”, as gaitas-de-foles de Paulo Marinho e Rui Vaz bem poderiam ter pedido à irritantes e inúteis vozes de coro para se calarem – o mesmo defeito que descaracteriza outros temas. Fausto e a morna cabo-verdiana navegam em “Oceanos”, enquanto os jogos fonéticos em japonês de “Soredemo” (ai os tais coros…) partem com Júlio Pereira e vão dar à complexidade de arranjos dos Gentle Giant. “Carolina”, a peça que integra uma compilação internacional de “world music”, tem o bom sabor dos temas tradicionais e um desempenho vocal de Pedro D’Orey algo periclitante. “Auto da criação” é quase um “haiku”, instante de revelação na voz de Filomena Pereira sobre “percussões industriais”, estilo serração, semelhante à que os Malicorne utilizaram em “L’Extraordinaire Tour de France d’Adélard Rousseau”. Tema que, juntamente com “Candeia”, cultiva parentescos próximos com a Banda do Casaco. “Vindima”, outro tradicional, dá finalmente lugar ao adeus na guitarra acústica, num original de José Afonso, “Mulher da Erva”. Compete agora aos Romanças escolher entre continuarem na busca de novos caminhos ou, pelo contrário, seguirem por uma única senda até ao fim. Quem sabe, até ao alto da serra. (7)

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