CULTURA
TERÇA-FEIRA, 28 OUT 2003
O som grave da locomotiva de Carlos
Barretto
Carlos Barretto, um dos mais
destacados instrumentistas e compositores do jazz feito atualmente em Portugal,
apresenta esta noite ao vivo o seu novo álbum, “Lokomotiv”, em quarteto com
Mário Delgado (guitarra), José Salgueiro (bateria e percussões) e Sérgio
Carolino (tuba), este último a substituir o francês François Corneloup,
presente no disco como executante de saxofone barítono.
Descontando
as necessárias adaptações ditadas pela troca de instrumentos, mantém-se, porém,
um som que sabe tirar o máximo partido possível da conjugação das sonoridades
graves, nomeadamente nos diálogos entre as notas mais baixas dos sopros e o
contrabaixo tocado com arco. “Uma coisa deliberada”, diz o autor de “Solo
Pictórico”, álbum de contrabaixo solo editado no intervalo entre “Radio Song” e
“Lokomotiv”: “São instrumentos graves, o clarinete baixo [por Louis Sclavis,
outro expoente do novo jazz francês, no anterior “Radio Song”], o saxofone
barítono e o contrabaixo. Dá para invertermos os papéis, ao nível do
acompanhamento e dos solos.”
“Lokomotiv”
pode ser considerado como a continuação de uma estética iniciada com o aclamado
“Radio Song”, eleito pelo PÚBLICO melhor disco português de jazz do ano
passado. Jazz feito em Portugal e não jazz português, porque a música do
contrabaixista recusa-se a aderir a padrões determinados por quaisquer
regionalizações, inserindo-se, ao invés, numa corrente universalista, embora de
acordo com os parâmetros de um som marcadamente europeu.
Em
vez do “hermetismo” de ligações demasiado acorrentadas ao folclore de uma
determinada região, neste caso o português, o contrabaixista é adepto de um
“universalismo” que lhe permite integrar na sua música elementos como “o rock,
a música contemporânea, o cinema americano ou coisas orientais…”.
“Lokomotiv”,
como “Radio Song”, refuta qualquer tentativa de análise paternalista para se
assumir como grande jazz em qualquer parte do mundo. Desprende-se desta música
uma energia e uma frescura contagiantes, a par de um sentido apurado do
equilíbrio certo entre composição e improvisação, embora Barretto não esconda o
prazer que esta última lhe proporciona. “O que eu gosto mais é de improvisar,
incluindo nas partes escritas. Às vezes construo uma pequena melodia, mas
inserida num contexto suficientemente aberto para acontecerem outras coisas,
sempre variáveis. Este disco tem mais improvisação que o anterior.”
Um
trabalho de equipa, “como o Futebol Clube do Porto”, em que “todos dão ideias”,
que é, desde já, sério candidato a, uma vez mais, levar para casa o título de
melhor do ano.
Carlos Barretto
“Lokomotiv”
LISBOA Teatro S. Luiz.
Tel. 213257650. Às 21h.
Bilhetes entre 5 e 15 euros.
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