CULTURA
QUINTA-FEIRA,
20 NOV 2003
A
equação de Anthony Braxton
Anthony Braxton, o
matemático, Randy Weston, o africano, e Bobby Hutcherson, o vibrafonista
swingante, marcam a agenda de jazz deste fim-de-semana, em Guimarães e Lisboa
Mais jazz. Grande jazz. Grandes músicos de
jazz. No Guimarães Jazz e em Lisboa, em co-produção da Culturgest com este
festival. Anthony Braxton, Randy Weston, Bobby Hutcherson. O primeiro e o
último dão concertos a dobrar e Weston tem concerto único em Guimarães.
Anthony
Braxton, que ontem atuou na Culturgest e hoje abre a segunda parte do programa
do Guimarães Jazz, é um matemático. Entre a teoria e a alucinação, a escrita
tão complexa como uma cidade e o grito mais instintivo, revela-se um
"continuum" que vai do macrocosmos orquestral ao microcosmos
solístico. Braxton toca saxofones, clarinete, flauta e piano, e fez história ao
lado de nomes ligados ao "free" e à música improvisada como Leroy
Jenkins, Gunter Hampel, Jeanne Lee, Willem Breuker, Alan Silva, Derek Bailey,
Dave Holland e Sam Rivers, entre outros. Fez parte do Circle de Chick Corea,
dos Company, da Creative Music Orchestra e da Globe Unity Orchestra.
Equidistante
do jazz e da música contemporânea, entre Ornette Coleman e Schönberg, Eric
Dolphy e Xenakis, Braxton integra na sua música a intuição e a numerologia
(como Xenakis, aliás, outro visionário pitagórico da ordem cósmica, cifrada em
equações do espírito). Uma música apontada tanto ao corpo como à inteligência,
a exigir do ouvinte participação e disponibilidade totais. Ou mais ainda: um
dos seus projetos passa pela composição de uma peça para ser executada numa
estação espacial em órbita.
Há
quem se refira a um revisionismo da tradição em que o jazz é destruído e
remontado e a improvisação uma outra ordem, manifestação parcial de uma arquitetura
mais vasta, a propósito deste músico de Chicago que diz ter sido influenciado
pelo "cool" de Paul Desmond e Warne Marsh, mas em cujas obras se
cruzam batimentos rituais (às vezes curiosamente idênticos a construções da
escola RIO – Rock in Opposition) e concepções puramente geométricas que
procuram redefinir o jazz como uma música englobante e totalitária.
Descubram-se estas diferentes galáxias em álbuns como "Silence/Time
Zones", um tratado de electrónica logística, com Leroy Jenkins, Leo Smith
e Richard Teitelbaum, as séries de quartetos e duetos que se estendem pelas
décadas de 80 e 90 e uma infinidade de composições numeradas, em contextos que
vão do solo absoluto ao grande "ensemble". Braxton atua em Portugal
em quarteto com Kevin O'Neill (guitarra), Kevin Norton (bateria) e Andy Eulau
(contrabaixo).
Os
números de Randy Weston são outros. Dançam com a agilidade de uma gazela. Jazz,
como o de Abdullah Ibrahim, com raízes fundas em África. Weston é o pianista
que transporta a lanterna urbana de Monk e os ensinamentos de Ellington (de
ambos traçou retratos em piano solo, nos álbuns "Portraits of Duke
Ellington" e "Portraits of Thelonious Monk"), para os mistérios
da savana. Imbuído da energia do rhythm 'n' blues e da música africana, autor
do "standard" "Hi-fly", Weston recomenda-se em álbuns como
"Tanjah", The Spirits of our Ancestors", "Volcano
Blues" (com Melba Moore), "Perspective" (com Vishnu Wood) e o
mais recente "Ancient Future". O pianista atua em trio, com Alex
Blake (contrabaixo) e Neil Clarke (percussão).
A
fechar o ciclo, Guimarães e Lisboa recebem outro nome incontornável do jazz
moderno, o vibrafonista Bobby Hutcherson, em quarteto com Renee Rosnes (piano),
Ray Drummond (contrabaixo) e Billy Drummond (bateria). Mergulhando a inspiração
no swing do génio dos Modern Jazz Quartet, Milt Jackson, Hutcherson acrescenta
à limpidez melódica do "cool" as subtilezas rítmicas do
"bop". De entre a sua discografia destaca-se uma das obras-primas do
jazz, "Dialogue" (1965), potenciada por um assombroso desempenho do
saxofonista Sam Rivers. Igualmente importante é a sua participação no clássico
"Out to Lunch", de Eric Dolphy.
ANTHONY
BRAXTON QUARTET
Guimarães, Auditório da Universidade do
Minho.
Hoje, às 22h. Tel. 253408061. Bilhetes a
10 euros.
RANDY
WESTON TRIO
Guimarães, Auditório da Universidade do
Minho.
Amanhã, às 22h. Bilhetes a 10 euros.
BOBBY
HUTCHERSON QUARTET
Lisboa, Grande Auditório da Culturgest.
Amanhã, às 21h30. Tel. 217905155. Bilhetes
a 18 euros.
Guimarães, Auditório da Universidade do
Minho.
Sábado, dia 22, às 22h. Bilhetes a 10
euros.
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