CULTURA
TERÇA-FEIRA,
18 NOV 2003
Bom
Chick, bom genre
Participante em duas das
gravações míticas do jazzrock, ao lado de Miles Davis, Chick Corea definiu o
seu próprio género de fusão. O seu jazz tem a dimensão dos clássicos
Chick Corea é um dos mais importantes
pianistas da história do jazz. Capaz do melhor e do pior. O melhor é música de
piano ao mais alto nível, a par de inovações estilísticas que marcaram,
sobretudo a partir da sua colaboração com Miles Davis, em "Bitches
Brew" e "In a Silent Way", a evolução deste instrumento no
âmbito do jazz de fusão. O pior assoma quando a sua veia latina o empurra para
exercícios de "música para elevador" exótica com vocação de guia
turístico.
Os
concertos marcados para hoje, no Porto, a fechar o festival de jazz desta
cidade, e amanhã, em Lisboa, deverão apresentar o melhor Chick Corea, até
porque o seu mais recente registo discográfico, "Rendez vous in New
York", em que revisita várias fases da sua carreira, é digo dos maiores
elogios.
De
seu verdadeiro nome Armando Anthony Corea, com origens familiares na Sicília e
Cantábria, Chick Corea inicia a sua carreira de pianista (os seus talentos como
instrumentista estendem-se à bateria e ao vibrafone) em Boston, na orquestra de
Phil Barboza. No mesmo ano, 1966, em que substitui Gary Burton no quarteto de
Stan Getz, grava o seu primeiro álbum a solo, "Tones for Joan's
Bones". Dois anos mais tarde é a vez de "Now he Sings, now he
Sobs", considerado uma da suas obras clássicas e recentemente reeditado,
em versão remasterizada, pela EMI/Blue Note.
A
adoção do piano eléctrico coincide com o convite para tocar com Miles Davis.
Participa nos dois álbuns deste trompetista que permanecem até hoje como
paradigmas do jazzrock e do jazz de fusão, "In a Silent Way" e
"Bitches Brew" (mas também em "Live-Evil" e "Black
Beauty"), ambos de 1969.
Depois
de abandonar Miles junta-se a outro dos mestres de fusão, Wayne Shorter, com
quem grava "Super Nova", e dá o salto para uma música mais árdua,
formando os Circle, em trio com Dave Holland e Barry Altschull, aumentado para
quarteto com a participação de Anthony Braxton, no álbum
"Paris-Concert". A solo, a sua melhor música improvisada deste
período pode ser escutada em "The Complete 'Is' Sessions", igualmente
objeto de reedição de luxo pela EMI/Blue Note.
De
volta ao mundo da fusão, Chick Corea forma os Return to Forever, inicialmente
na contracorrente das concepções mais funk dos Weather Report e Herbie Hancock,
outros expoentes de um género então em franca expansão. "Return to Forever"
(1972) e "Light as a Feather" são álbuns de música etérea,
subtilmente aflorados pela bossa-nova e pela presença dos músicos brasileiros
Airto Moreira e Flora Purim. Rapidamente, porém, esta faceta é substituída por
um jazzrcock mais tipificado, funky e eléctrico, nos álbuns subsequentes,
"Hymn of the Seventh Galaxy", "Where have I Known you
before" e "Return to the Seventh Galaxy". Como contrapeso a este
excesso de gravidade, lança-se para as nuvens em dueto com Gary Burton, em
"Crystal Silence" (1972).
Segue-se
a fase da eletrónica e o namoro com a música progressiva, em dois álbuns
complexos e coloridos, "The Leprechaun" (1975) e "Romantic
Warrior" (1976). Convém, no entanto, ignorar, também dessa altura,
"My Spanish Heart", "No Mystery", "Musicmagic" e
"The Mad Hatter", este último a enformar dos mesmos males – o dispêndio
de meios, o virtuosismo balofo – que contribuíram para denegrir o rock
progressivo. Obviamente, a indústria recompensa-o com um Grammy.
A
confusão e a hesitação instalam-se nos anos 80. Corea forma uma Elektric Band e
uma Akoustic Band, grava o "Concerto para Duas Mãos e Orquestra" de
Mozart, regressa ao piano acústico e toca com Herbie Hancock, Gary Burton,
Keith Jarrett, Friedrich Gulda, Gary Peacock, Michael Brecker, Lee Konitz, Paco
de Lúcia e a cantora de "soul" e cabaré, Chaka Khan...
Acalma,
por fim e, em 1992, forma a sua própria editora, a Stretch Records, para a qual
porém só consegue gravar após a cessação do contrato que o ligava à GRP. O
primeiro álbum é uma homenagem a Bud Powell. Em paralelo, grava mais música de
Mozart, com a St. Paul Chamber Orchestra, dirigida por Bobby McFerrin.
Mas
a tradição pulsa-lhe nas veias e a entrega a cem por cento ao piano acústico
força-o a regressar ao jazz sem enfeites. Forma os Origin e fecha-se no Blue
Note Club de Nova Iorque para gravar uma série de sessões ao vivo, cuja
totalidade se encontra reunida na caixa de 6 CD, "A Week at the Blue
Note". Em 1999 chega a altura de gravar o seu "Corea Concerto",
com a London Symphony Orchestra, ao qual se segue um "Piano
Concerto", inspirado na temática da liberdade religiosa.
Acompanham
Chick Corea nestes dois espetáculos em Portugal, Avishai Cohen (baixo), Jeff
Ballard (bateria) e Steve Wilson (saxofone).
CHICK
COREA QUARTET
PORTO Teatro Rivoli.
Hoje, às 22h. Tel. 223392220. Bilhetes: 20
e 25 euros.
LISBOA Grande Auditório do Centro Cultural
de Belém.
Amanhã, às 21h. Tel. 213612444. Bilhetes
entre 15 e 40 euros.
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