PÚBLICO SEGUNDA-FEIRA, 18 FEVEREIRO 1991 >> Cultura
Cooperativa
cultural lança novos discos de música portuguesa
A
união faz a força
Hoje, às 18h30,
na sala ogival do castelo de S. Jorge, em Lisboa, a UPAV apresenta sete discos
editados no selo do mesmo nome e autoproduzidos pelos próprios artistas e
sócios da cooperativa.
Provenientes de áreas tão
diferentes como a “canção de autor”, o fado, a música ligeira, o jazz, a poesia
ou a música tradicional, os discos, agora editados, representam o culminar de
um esforço e de uma aposta da UPAV (União Portuguesa de Artistas de Variedades,
fundada em 1983 por um grupo de dez artistas portugueses), no sentido de furar
os esquemas habituais de produção e distribuição (a cargo da Mundo da Canção)
do mercado discográfico nacional e evitar, a todo o custo, aquilo que
consideram como a “morte próxima da música portuguesa”. Para isso, recorrem a
meios e estratégias editoriais à margem do sistema, desde os aspetos ligados à
produção até à própria gestão das carreiras artísticas, sem descurar a parte
técnica ou o lançamento e divulgação de novos valores.
Do núcleo fundador da UPAV
permaneceram até hoje José Mário Branco, Rodrigo, Carlos do Carmo, Dina e
Alexandra. Fazem ainda parte da cooperativa os artistas Maria Guinot, Jorge
Lomba, a Brigada Victor Jara, Manuel Tentúgal (dos Vai de Roda), Luísa Basto,
Amélia Muge, José David (Almanaque), Vasco Martins, Manuela de Freitas e Mário
Viegas, um produtor (Orlando Laranjeiro) e dois técnicos (António Mileu e
Alfredo Almeida).
Em termos discográficos, o
resultado das múltiplas atividades do grupo poderá a partir de hoje ser
apreciado através da tal fornada de sete discos, a saber: “Correspondências” de
José Mário Branco, “Fado – Histórias, Baladas e Lendas” de Rodrigo, “Aqui e
Agora” de Dina, “Maria Guinot” de Maria Guinot, “Poemas de Bibe” de Mário
Viegas e Manuela de Freitas, “Jorge Lomba” do estreante do mesmo nome e
“Terreiro das Bruxas” dos Vai de Roda (entretanto editado e já criticado nas
páginas do PÚBLICO).
“Correspondências”, de José
Mário Branco (gravado há já ano e meio e recusado por todas as grandes editoras...),
assinala o regresso em disco do autor de “Margem de Certa Maneira” e “Ser
Solidário”, após um interregno de seis anos e da gravação, em 85, da obra-prima
“A Noite”. Canções, cartas e curtas, por oposição ao tom épico-dramático da
longa e magistral peça que dava nome ao álbum anterior.
Quanto ao disco de Rodrigo,
subintitulado “Histórias, Baladas e Lendas”, o seu autor procura juntar o fado
tradicional com histórias e tradições mais antigas. Para além dos inéditos
inclui ainda uma homenagem a João Villaret e simultaneamente à revista portuguesa.
“É também um disco que pretende de certo modo celebrar os vinte anos de
carreira do Rodrigo” – como José Mário Branco faz questão de frisar.
De Dina pouco se ouviu falar
desde o Festival da Canção de 82. O seu disco, ainda segundo José Mário Branco,
“é exemplar de uma música mais jovem e de uma rapariga que teve um início de
carreira quase retumbante e que está inexplicavelmente há oito anos sem gravar,
tendo embora contrato com uma editora”. Dina está de volta, “Aqui e Agora”.
Outro regresso é o de Maria
Guinot, depois de há quatro anos ter autoproduzido “Essa Palavra Mulher”.
“Silêncio e Tanta Gente” foi das melhores canções que alguma vez passaram por
um Festival da Canção.
Mário Viegas, depois (ou ao
lado) de Villaret, é o melhor declamador de sempre da poesia portuguesa. Para
ele, “Palavras ditas são palavras vivas”. Fabuloso ator e “entertainer”,
surrealista na maneira de representar a vida, veste atualmente a pele de Mário
“Gin Tónico” Henrique Leiria. Chame-se-lhe apenas Artista, com “A” grande.
Acompanha-o em “Poemas de Bibe”, (uma coletânea de cerca de 80 poemas, escritos
por poetas portugueses, escolhidos especialmente para crianças) a atriz Manuela
de Freitas, uma das principais impulsionadoras do teatro independente em
Portugal e que participou em filmes como “O Passado e o Presente” e
“Francisca”, de Manoel de Oliveira, ou os recentes “Recordações da Casa
Amarela”, de João César Monteiro, e “Ninguém Duas Vezes”, de Jorge Silva Melo.
Jorge Lomba estreia-se como cantor num disco homónimo de canções firmemente enraizadas na música popular portuguesa. Dos Vai de Roda já se disse da sua excelência. Resta esperar pela resposta do grande público ao desafio lançado pelos membros da UPAV.
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