05/11/2008

Sinosite [Mike Oldfield]

Pop Rock

22 de Setembro de 1993

SINOSITE

Mike Oldfield: um homem, uma guitarra de som inconfundível, uma personalidade instável e um disco onde coube tudo: “Tubular Bells”. Em dois volumes, separados por duas décadas, a marcarem a distância entre o génio e a banalidade.

O autor de um dos discos mais vendidos a música Rock, “Tubular Bells”, o primeiro, pois claro, vai tocar numa praça de touros. Uma actuação em registo orquestral a exigir enorme concentração. Com a guitarra, vários tipos de guitarra, no comando das operações. Menos a portuguesa, de que Mike Oldfield, estranhamente, nunca ouviu falar.
PÚBLICO – Que motivos o levaram a gravar “Tubular Bells II”?
Mike Oldfield – Pensei que fosse uma boa ideia e agradou-me imenso fazê-lo. Tinha essa intenção já há cerca de cinco anos, mas queria fazê-lo com uma nova editora. Já não me sentia feliz na Virgin e tive de romper o contrato.
P. – Por que razão se aborreceu com a editora?
R. – As pessoas originais foram-se embora e as que vieram não eram grandes apreciadoras de música instrumental. Pensavam que era um formato difícil de promover. Depois, Richard Branson estava mais preocupado com a sua companhia de aviação, enquanto no passado se preocupava mais com a música. Foram 17 anos na mesma editora e achei que era tempo de mudar.
P. – Poderia ter feito “Tubular Bells II” com música original, mas em vez disso preferiu apenas alterar os arranjos. Porquê essa opção?
R. – As sequências não são as mesmas… mas porque é que me está sempre a perguntar “porquê”?
P. – Porque o público português quer ficar a saber…
R. – Oh! (suspiro). Não há uma razão para tudo o que faço, portanto não faz sentido perguntar-me “porquê”. Não tenho explicação para as coisas. Não sei por que razão há seres humanos sobre o planeta, não sei explicar os enigmas do universo. As coisas simplesmente existem. Eu faço coisas não por este ou aquele motivo. Faço-as e pronto.
P. – A sua obra tem-se caracterizado por dois campos musicais separados: longas peças instrumentais e, por outro lado, pequenas canções curtas…
R. – Resolvi deixar essas canções de lado por uns tempos. Comecei a sentir aborrecimento a escrever canções, que me estava a repetir. Há muitas pessoas no mundo a escrever canções mas muito poucas a compor peças instrumentais. Uso um pouco as vozes, é claro, mas não no formato tradicional de canções.
P. – Mas, sobretudo nos últimos anos, foram essas canções que lhe deram mais dinheiro…
R. – Nunca fiz nada por dinheiro. À parte quando era muito novo e trabalhava porque necessitava dele. Passei a ter sempre dinheiro desde “Tubular Bells”. A maioria das pessoas pensa que se age sempre a pensar em dinheiro, mas eu faço as coisas por outras razões, pelo prazer que sinto, por exemplo. Quando deixar de sentir esse prazer, paro, e vou fazer outra coisa.
P. – Passados todos estes anos, continua a sentir prazer em tocar ao vivo?
R. – Sim, especialmente nesta digressão, em que os processos utilizados são diferentes. Não vai ser como em digressões anteriores, em que fazia versões rock dos álbuns. Tinha já tudo escrito, como se fosse uma peça orquestral, os músicos vão cingir-se às respectivas partituras. Os actuais concertos soam bastante aos álbuns, embora num contexto “ao vivo”, com várias partes separadas que se complementam e que exigem uma grande concentração, de modo a conseguir-se a ordem correcta. Têm a duração de uma hora e meia, o que, nos dias que correm, pode parecer um pouco curto. Não se trata de preguiça, mas sim da tal concentração.
P. – Vão ser tocados temas novos ou só os arranjos é que variam?
R. – Novos arranjos. Vou tocar um pouco de “Tubular Bells II”, um pouco de flamenco, que adoro…
P. – Sempre mostrou interesse pela música tradicional, nomeadamente de inspiração celta… Tocou recentemente num clube de música tradicional na Galiza…
R. – É verdade. A minha namorada é galega e fomos visitar os pais dela. Conheci o grupo Luar na Lubre e tocámos juntos nesse clube. Adoro música celta.
P. – Continua a viver no campo?
R. – Sim, em Inglaterra, algumas vezes.
P. – Tem medo da cidade?
R. – Tenho uma casa em Los Angeles que é uma das maiores cidades dos Estados Unidos, só que fica um pouco à margem, no alto de um monte. Gosto de me sentir próximo da cidade, mas não no meio dela.
P. – Descontando “Tubular Bells II”, pensa regressar ao estilo e à complexidade de um álbum como “Amarok”, por sinal excelente?
R. – Complexo, sim, mas feito de forma muito espontânea. Costumava levantar-me de manhã e pensar em algo, uma técnica de composição que resultou bem. Há nesse disco secções maravilhosas, mas, na generalidade, é um disco em que existe raiva, um disco negativo. Não estou a dizer que seja mau…
P. – Sabe-se que costuma ser sensível a estes aspectos negativos, mas o curioso é que se desprende da sua música uma sensação de harmonia. Usa a música como terapia?
R. – Sim, é uma espécie de terapia. Nos primeiros tempos, a música era algo que me fazia sentir feliz e seguro, mas se se reparasse bem, não era uma máusica feliz, embora possa dizer que era uma música positiva.
P. – Define-se primeiro que tudo como um guitarrista?
R. – Absolutamente. Quando vir o concerto reparará que me concentro muito na guitarra. Vou tocar vários tipos de guitarra: espanhola, clássica, eléctrica…
P. – E guitarra portuguesa?
R. – O quê? Nunca vi uma guitarra portuguesa, o que é isso?
P. – Não sabe o que é?
R. – Não, mas vou tentar investigar, manter os ouvidos abertos para ela.


DIA 22, DRAMÁTICO DE CASCAIS, 21H30

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