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29|JUNHO|2001
escolhas|ao
vivo
João & Joe
Maria
João encontra-se com Joe Zawinful e o seu grupo no ciclo “Grandes Concertos de
Jazz”, no Porto. Grande encontro em perspetiva. Mais ou menos próximo do jazz.
O encontro entre uma das maiores
improvisadoras vocais contemporâneas e um dos maiores arquitetos sonoros da
chamada música de fusão ensaiou os primeiros passos numa jam session realizada
há algum tempo em Colónia, na Alemanha. Terão combinado bem, daí o aprofundamento
desta relação que acolhe ainda, como parceiros, os restantes músicos que
integram a atual formação de Zawinful pós-Weather Report, os Syndicate: Amit
Chatterjee, na guitarra, Etienne M’Bappe, no baixo, Nathaniel Townsley, na
bateria, e Manolo Baderna, nas percussões e voz.
Maria João sabe voar e garimpar.
Pelas grutas do interior da terra, sobre as nuvens, na neblina. Como em
Zawinful, a fusão atravessa a sua música. O seu canto é canto de fusão entre
linguagens várias que vão da música tradicional, brasileira ou indiana, mas
também a portuguesa, cujo fascínio cada vez mais se faz sentir, ao jazz,
passando pela música contemporânea, a canção popular ou, pura e simplesmente, o
“scat”, na sua vertente mais interiorizada e pessoal.
Se Billie Holiday, Elis Regina, Ella
Fitzgerald e Betty Carter foram as suas primeiras mestres, aquelas que a
ensinaram a fazer passar a alma e as suas emoções através da respiração, terá
sido Bobby McFerrin quem lhe mostrou ser possível ser-se na voz mais do que uma
voz. Como o autor de “The Voice”, Maria João teve a coragem de estender a sua
voz para fora do limite da canção, sem receio de se expor em toda a sua
fragilidade mas também ostentando todo o seu poder. O percurso desta cantora
que gravou pela primeira vez com Jorge Palma e é hoje uma das intérpretes mais
conceituadas do novo jazz europeu, tem sido desde sempre a aprendizagem da
liberdade, mas também do diálogo. Com outros músicos e com outras músicas.
Com o seu próprio quinteto, em
“Quinteto de Maria João”, “Cem Caminhos” e “Conversa”, com a pianista japonesa
Aki Takase e o contrabaixista Niels-Henning Orsted Pedersen, em “Alice - Live
at the Jazz Ost-West”, com os Cal Viva, de José Peixoto, em “Sol”, com Ralph
Towner, Ricardo Rocha, Dino Saluzzi, Mário Laginha, Kai Eckardt de Camargo e
Manu Katché, em “Fábula” e – no lar onde ganhou a tranquilidade e a
cumplicidade para poder brincar – com Mário Laginha, em “Danças”, “Cor”,
“Lobos, Raposas e Coiotes” e “Chorinho Feliz” e “Mumadji” (mais Toninho
Ferragutti e Helge Norbaken), Maria João conquistou as “nuances” de ser, mais
do que ter, uma voz. E de falar, cantar com outros mundos. Joe Zawinful tem
novos territórios para lhe mostrar.
Joe (Josef) Zawinful foi nos anos
60, juntamente com Miles Davis, John McLaughlin e Chick Corea, um dos pioneiros
do jazzrock, após mestrado com Maynard Ferguson, Slide Hampton, Dinah
Washington, Cannonball Adderley e… o próprio Miles Davis, com quem gravou os
clássicos “Bitches Brew” e “In a Silent Way”, cabendo-lhe neste último a composição
do título-tema.
Mas para este teclista austríaco a
passagem pelo hard-bop, o souljazz e os blues representaria apenas a base sobre
a qual construiria o monumental templo de jazz-rock que se chamou Weather
Report. Foi no início dos anos 70 que o escândalo rebentou, quando Joe Zawinful
agarrou nos sintetizadores A.R.P. e nos pianos elétricos Wurlitzer e Fender
Rhodes para, ao lado de outro grande solista, o saxofonista Wayne Shorter,
encetar em 1971 a aventura elétrica Weather Report que duraria até 1986.
Os Weather Report traçariam o
caminho que centenas de outras bandas percorreram posteriormente até tornarem o
selo “jazzrock” em pouco mais do que um “cliché” citado pelos especialistas de
jazz com desdém. E se os próprios Weather Report não demoraram muito até se
deixarem enredar nos estereótipos do género que ajudaram a criar, a verdade é
que um álbum como “I Sing the Body Electric” (1972) ainda hoje serve de farol a
quem queira aventurar-se no jazzrock sem naufragar nos rochedos do lugar-comum.
MARIA JOÃO & JOE
ZAWINFUL
Porto |
Coliseu
Tel. 223394940. Hoje, às 21h30. Bilhetes a
4000$00 e 5000$00
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