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11|MAIO|2001
escolhas|ao
vivo
Sexo:
opção máquina
Sexo
surrealista? O manual foi apresentado pelos Von Magnet em 1998, num álbum
intitulado precisamente “El Sexo Sur-Realista”, considerado hoje um clássico do
eletro-flamenco. Não se vislumbram mais praticantes deste género que combina a
sensualidade das danças do Sul da Andaluzia com a eletricidade das máquinas. Os
Von Magnet estão, neste aspeto, sós. Isolados na visão de um mundo
concetualizado pelo cérebro e animado por pulsões sexuais tão incrustadas na
carne como deslocadas do seu sentido primordial.
Embora sejam associados aos
“industriais” Young Gods, Test Dept, Cassandra Complex, In the Nursery ou
Psychic TV, a forma como a sua música funde os elementos étnicos e rituais com
a eletrónica de pendor hipnótico estará mais próxima de uns Controlled Bleeding
e, sobretudo, dos Delerium, extensão eletro-tribal minimalista da “electronic
body music” dos Front Line Assembly.
A música dos Von Magnet traduz os
paradoxos, as inquietações e as fobias do homem moderno. A carne e o espírito,
as tradições étnicas e a sociedade da comunicação eletrónica, transe e
informação, suor e magnetismo, magia sexualis e matemática aplicada, rituais
arcaicos e programações digitais dilaceram-se num novo tribalismo para o novo
milénio neste coletivo formado em 1985 pelo catalão Phil Von, que já atuou em
Portugal, num castelo de Montemor-o-Velho, durante o festival Citemor 92. Nove
anos volvidos, regressam a Portugal, por iniciativa da Alcateia Plásmica, para
um espetáculo multimédia com projeção de vídeos e a presença em palco de Phil
Von (dança, voz), Flore Magnet (voz, cenografia), Mimetic (percussão,
eletrónica), Sigmoon (instrumentos étnicos) e Nikho (misturas).
Indissociável da sua música, a
performance que rodeia cada espetáculo dos Von Magnet permite traçar um
paralelo com os La Fura Dels Baus. Como as “ratazanas dos esgotos” da
Catalunha, os Von Magnet aliam à música, predominantemente eletrónica, a dança,
o teatro, o circo, a tecnologia e um elemento de pânico que torna cada
espetáculo numa experiência inolvidável. Não são a mesma coisa, os discos e as
apresentações ao vivo. “Cuidado: não estão somente a escutá-los!”, explicam no
booklet de “El Sexo Sur-Realista”. Fica o aviso… A arte total – e cruel – que
emanava deste álbum que materializava a simbiose do humano com a máquina
estabeleceu para o grupo um estatuto de culto e uma aura de esoterismo.
Um ano depois, e após colaborações
com os Greater Than One e Neil Starr (dos Test Dept), renovam a sua formação
que passa a contar com 14 elementos, destacando-se Jerome Soudan (Mimetic) nas
percussões e eletrónica. Um novo álbum, “Computador”, aprofunda a temática
favorita: a ligação da Natureza com a tecnologia, dirigida para a criação de um
novo ser humano, mutante cibernético, o “corpo elétrico” que Ray Bradbury
profetizou, detentor de uma alma gentil, e os Human League esticaram em betão
até às alturas nietzscheianas do seu “empire state human”.
“Flamenco Mutants”, de 1992, reforça
a vertente telúrica e xamânica da música e “La Centrale Magnetique” recupera ao
vivo alguns dos cenários apocalípticos dos discos anteriores. “El Grito” (1993)
e “Cosmogonia” (1995) são explorações divergentes do organismo Von Magnet. O
primeiro é um reflexo das apropriações étnicas, e não só (“estejam à vontade
para nos samplar, nós já vos samplámos a vocês!” é uma das máximas do grupo…),
a que desde sempre os Von Magnet recorreram; o segundo faz circular com
redobrada intensidade a corrente elétrica e a mensagem das máquinas, através de
versões de bandas como os Lassigue Bendthaus (Atom Heart, numa das suas
manifestações prévias) e Bourbonese Qualk. Seguem-se, em 1996, as edições de
“Mezclador” e da coletânea “Nuevas Cruzes”.
Finalmente, no ano passado, surge
“El Planeta”, álbum sobre a esquizofrenia planetária e a necessidade de novas
vias de comunicação para o seu humano, com base no instinto. O som de um
violino, réstia de humanismo a pairar sobre as ruínas, sobrevoa paisagens de um
mundo auto-regulado em circuito fechado pelas ondas do córtex. Música
eletrónica sombria, plasma de sonhos, erotismo de carne vazia. O sexo
surrealista dos Von Magnet é, afinal, o do corpo com os órgãos fora do lugar
(como os da capa do CD) e um programa de ilusão. Posto a correr eternamente em
“repeat”.
VON MAGNET (1ª PARTE:
ZZZZZZZZZZZZZZZZZP!)
LISBOA| Caixa
Económica Operária, R. da Voz do Operário, à Graça.
Sexta, 11. Às 21h30.
Tel. 218862836. Bilhetes a 2000$00
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