15/10/2008

R.E.M. - Out Of Time

Pop Rock

27 MARÇO 1991
LP’S

CANÇÕES PARA A ETERNIDADE

R.E.M.

Out of Time
LP / MC / CD, Warner Bros., distri. Warner port.

“Música que não inclua elementos de extrema felicidade, tristeza, beleza, raiva e violência, não vale a pena ser feita” – palavras de Michael Stipe, vocalista dos R.E.M., que definem na perfeição a atitude de uma banda que nem o sucesso comercial do anterior “Green” afastou de um percurso exemplar, agora culminado com esta obra-prima absoluta. Nada neste disco se parece com o passado. Os R.E.M., como o título de resto indica, ultrapassaram a prisão temporal e atingiram a eternidade.
Onde “Green” se revelava politicamente empenhado, “Out of Time” torna-se maior que o mundo e canta, por vezes de forma estranha, o amor. Em vez das declarações bombásticas – “Deixei de sentir necessidade”, diz Michael Stipe, “de fazer de cada frase que escrevo uma declaração.” – e do discurso politicamente empenhado, as palavras que nascem directamente do coração, que falam do amor, “de todas as espécies de amor imaginárias”.
Tempo foi o que não faltou para a feitura deste disco: “Não tínhamos pressa. Quisemos experimentar todas as possibilidades e ver de que modo elas se poderiam desenvolver.” Após a digressão mundial de 1989, que levou os R.E.M. aos quatro cantos do planeta, Michael Stipe, Bill Berry, Peter Buck e Mike Mills decidiram que era altura de mudar. O estúdio passou a ser o centro do universo e o trabalho de composição e produção o centro desse centro. Alterados os papéis e regras habituais (com os quatro músicos a trocarem de instrumentos) e com o espaço alargado concedido às cordas e aos metais, o leque instrumental tornou-se quase ilimitado – “Tínhamos sons de diferentes instrumentos na cabeça”, diz Stipe, “e quisemos passá-los para o disco.”
Para isso, recrutaram músicos como o saxofonista Kidd Jordan, a vocalista Kate Pierson, dos B-52’s, o tocador de filiscórnio da banda de Henry Mancini, o “rapper” dos Boogie Down Productions, KRS-1 e membros da orquestra sinfónica de Atalanta, entre outros. A explosão de génio e o estado de graça de todos os membros da banda fizeram o resto – um disco perfeito, capaz talvez de rivalizar com a luz de “Revolver”, “Exile on Main Street” ou “Highway 61 Revisited” – como sonhava secretamente Peter Buck.
Onze canções – outras tantas jóias que devolvem à música (rock ou não, pouco importa) popular americana a dignidade perdida. Música popular que os R.E.M. consideram morta e “assassinada pelos ‘media’”. Canções que “recordam às pessoas um tempo em que os músicos não receavam tentar fazer coisas diferentes”. Canções que Michael Stipe não se envergonha de chamar “pop”, por muito que às vezes possam soar estranhas.
“The world is collapsing/ around our ears/ I turned up the radio/ but I can’t hear it” – mensagem inicial difundida em “Radio Song”, “funky” apocalíptico, que cedo dá lugar a um carrocel de emoções em forma de canção, carimbadas com a marca de “clássicos”. “Losing my Religion” prova até que ponto Michael Stipe se pode considerar hoje, ao lado de Stan Ridgway e David Byrne, um dos grandes cantores do lado oculto da América. “Low”, magistral, só encontra paralelo na patética litania de Bryan Ferry com os Roxy Music em “In every Dream Home a Heartache” – lenta e angustiada progressão de órgão e do clarinete baixo de Jordan, resolvida na extasiada e solar libertação final. “Near Wild Heaven” compara-se, no requinte das harmonias vocais, aos melhores momentos dos Beach Boys, por entre os saltos de alegria das guitarras. Guitarra que, no semi-instrumental “Endgame”, se torna mais terna e luminosa, em acordes que trazem à lembrança o dedilhar de Steve Howe, dos Yes, em “Mood for a Day”.
Do outro lado, a alegria das vozes de Michael Stipe e Kate Pierson, jubilosas entre as piruetas da guitarra, em “Shiny Happy People”, outro dos melhores momentos do disco. “Texarkana” é uma “cowboy song” que junta a mitologia e sonoridade dos Byrds ao estilo narrativo de Stan Ridgway. “Country Feedback” e “Me in Honey” (este construído sobre cavalgadas guitarrísticas próximas dos Talking Heads da fase inicial) fecham com chave de ouro um disco sem pontos fracos. Com “Out of Time” os R.E.M. tocam o céu da perfeição. •••••

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