09/12/2014

Chico Fininho, uh-uh! [Rui Veloso]



TERÇA-FEIRA, 31 OUTUBRO 2000

“Ar de Rock” com novos artistas

Chico Fininho, uh-uh!

20 ANOS depois, é duvidoso que Chico Fininho continue a passear-se pela Cantareira “com a merda na algibeira”, como dizia a canção. Não porque os hábitos de consumo de droga tenham mudado assim tanto nas últimas décadas, mas porque foi graças a esta canção, e ao álbum de onde for retirada, “Ar de Rock”, que mudaram em Portugal os hábitos de consumo da música popular feita por portugueses. O disco, editado em Julho de 1980, faz agora 20 anos. Motivo para festejos.
            Uma festa de aniversário não é festa, não é nada, sem um concerto de confraternização. E assim, Rui Veloso, ou alguém por ele, convidou para tocar ao vivo a seu lado os Xutos e Pontapés, Clã, Lúcia Moniz e Sara Tavares, no Pavilhão Atlântico, em Lisboa, com a Ala dos Namorados em substituição dos Clã, no Coliseu do Porto. Engraçada e alusiva será a abertura de ambos os espetáculos na qual Rui Veloso irá estar acompanhado pela Banda Sonora, com a formação original de “Ar de Rock”, composta por Zé Nabo, no baixo e Ramon Galarza, na bateria.
            A efeméride é ainda assinalada com a edição de um “Ar de Rock - 20 Anos Depois” que recupera o alinhamento original, constituído por clássicos como “A rapariguinha do shopping”, “Sei de uma camponesa” e, claro, “Chico fininho”. Interpretado pela Ala dos Namorados, Clã, Jorge Palma & Flak, Xutos e Pontapés, Da Weasel, Sara Tavares, Mão Morta, Danças Ocultas e Belle Chase Hotel, mais os brasileiros Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho, o novo CD inclui ainda três inéditos, por Lúcia Moniz, Nuno Bettencourt e Santos & Pecadores. Cantados em inglês, o que trai um pouco o espírito da edição original que se pretende comemorar…
            Todos afirmam a sua gratidão ao “pai do rock português” e são unânimes em afirmar que “Ar de Rock” é o exemplar original, aquele que abriu as portas à utilização da língua portuguesa neste tipo de música.
            Se é indiscutível que os seus autores, a dupla Rui Veloso-Carlos Tê, foram pioneiros na forma como fizeram a sobreposição de uma língua – o português – com uma música – o rock – que em Portugal não tinha tradições, para além das clonagens mais ou menos ié-iés dos modelos vindos de fora com o rótulo “Beatles” ou “Rolling Stones”, não é menos verdade que a matriz de “Ar de Rock” são os blues e que o próprio título do álbum faz um trocadilho com o termo inglês “hard rock”.
            Mas, por sorte ou por engenho, “Ar de Rock” impôs-se na rádio e nas tabelas de vendas (foi o primeiro disco de ouro conquistado por um músico rock nacional) e “Chico Fininho” passou a andar nas bocas do mundo que passou a cantarolar com ligeireza sobre a graça que tem a vida de um “junkie” na cidade do Porto.
            Os textos criados por Tê para “Ar de Rock” eram diretos, cantáveis e, por vezes, crus. As melodias, as vocalizações e a guitarra de Veloso, como a heroína, agarravam-se aos ouvidos, e por lá ficavam, com a vantagem de não provocarem ressaca depois.
            Seja como for os efeitos deste disco na música portuguesa foram visíveis e as marcas ficaram. Era o chamado “boom” do rock português, com a explosão de novas bandas a inundarem o mercado, muitas delas, por qualquer razão inexplicável, nomeadas por meio de siglas (UHF, GNR, NZZN, CTT…) e com a maior parte a investir precisamente no lado errado da via aberta por “Ar de Rock”. Num ápice tudo passou a poder ser cantado em português. Em tempo de revolução arte e rock até podiam ser os “pintelhos” cantados pelo Grupo de Baile em “Patchouly”, mesmo se cortados a meio do disco por um piiii radiofónico que não poderia ser mais pio…
            Fica a dúvida se sem “Ar de Rock” teriam existido uns Heróis do Mar, um Farinha ou uns Mler Ife Dada, o veio mais eletrónico e menos rock onde verdadeiramente corria a seiva do novo.
            Duas décadas não foram suficientes, enfim, para, a propósito de “Ar de Rock”, se poder dizer que foi um ar que lhe deu…

RUI VELOSO E CONVIDADOS
LISBOA Pavilhão Atlântico, hoje, às 22h
Bilhetes entre 3500$00 e 6000$00
PORTO Coliseu, 8 e 9 de Novembro, às 22h
Bilhetes entre 2750$00 e 4200$00

Sem comentários: