BLITZ
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VALORES SELADOS
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A LESTE TUDO DE NOVO
Não há dúvida que novos ventos sopram do Leste. De feição, no caso da música. Novos sons vão invadindo o Ocidente, susceptíveis de injectar sangue novo no panorama das músicas alternativas independentes europeias. Os apaixonados pelos sons originais das «Outras esferas» já não tinham mãos e ouvidos a medir, perdidos no meio das dezenas e dezenas de bons discos produzidos um pouco por todo o lado à margem das estratégias comerciais. Se o ritmo já era difícil de acompanhar, agora é preciso contar também com a brigada (ex)vermellha.
No princípio eram os novos totalitaristas como os Laibach ou os Last Few Days, operários, radicais, provocadores, subversivos e estimulantemente violentos. Os primeiros, depois de alguns desvios que deram mau resultado, regressaram às trombetas e fanfarras militaristas iniciais, agora rotulados com o selo de qualidade de «Novos clássicos». Em todo o caso, o mais recente «MacBeth» não envergonha os seus autores quando comparado com o ponto máximo que foi o estreante «Nova Akropola».
Quanto aos Last Few Days substituíram as sirenes, megafones e «slogans» anarquistas pelos ritmos, pelo menos mais rentáveis, da dança. Mudam-se os tempos, mudam-se as subversões…
Dos Holy Toy, polacos mas liderados por um norueguês (Lars Pedersen), nada mais se soube, após uma série de bons álbuns e a obra-prima «diferente de tudo» assinada por Lars, «Death in the Blue Lake». E já que falamos de obras-primas convirá não esquecer essa outra que é «Insect Culture» dos soviéticos Popular Mechanics, de Sergei Kuriokhin.
Saliência ainda, na área do jazz, para a obra dos Ganelin Trio e para os projectos, conotados com a música concreta e electroacústica, do grupo de percussão húngaro Amadinda, do checoslovaco Jaroslav Krcek («Raab») e deste músico juntamente com Georg Katzer (Alemanha Democrática) e Zygmunt Krause (Polónia) num mesmo álbum gravado para a Recommended («Aide Mémoire/Folk Music/Sonaty Slavickove»).
Recommended Records que se mantém, como habitualmente, atenta a todos os novos sons do Mundo e, neste caso particular, aos do leste europeu. Paralelamente á distribuição de uma revista de divulgação e apoio aos novos projectos e ideias oriundos daquelas regiões, associou-se à editora Points East, distribuindo para o Ocidente todos os seus discos. Os mais recentes valem todos a pena e estarão brevemente disponíveis na discoteca Contraverso que, por sinal, acabou de receber nova remessa de maravilhas com a chancela de qualidade «Recommended». Aqui vão entretanto algumas indicações sobre novos discos dos nossos amigos do Leste:
BORIS KOVAK: Ritual Nova 2
Segunda parte do dito ritual. Música tradicional jugoslava, electrónica, sopros, sons ambientais, cântico gregoriano e sérvio, leituras do Corão (em fita ou sampladas). Ritual dividido em duas partes: «Dream of the Origine» e «Origine of the Dream», com várias secções de títulos místicos como «All under the Celestial Cap», «Sacred Millstone» ou «Mandala». Crescendos rítmicos e corais desembocando em episódios mais contemplativos, próximos dos de John Surman ou Stephen Micus. Delicioso.
Instrumentação: Sampler, Sax soprano, clarinete baixo, taragato (instr. Trad.), cítara (não confundir com a sitar indiana), percussão, violoncelo, fitas, vozes.
Referências: ECM (Micus, Surman), música étnica, Musci/Venosta, música religiosa medieval, Terry Riley, Laraaji.
DER EXPANDER DES FORTSCHRITTS (Alemanha Democrática): Álbum estreia com o mesmo nome
Oriundos de Berlim e destinados a espantar muita gente. Músicos fabulosos combinam todos os seus talentos na construção de labirintos sonoros com múltiplas entradas/saídas. Síntese de esquisitas manipulações electrónicas com a decadência do cabaré berlinense, o free-jazz, vozes parasitárias e canções à beira da demência. A heterogeneidade completamente assumida e assimilada resultando numa música excitante e verdadeiramente original. A letra de um dos temas é retirada de um texto do filósofo Friedrich Nietzsche.
Instrumentação: Vozes, fitas, percussão, piano, saxofones, flauta, teclas/electrónica, baixo e guitarra.
Referências: Cassiber, Goebbels & Harth, Fred Frith, Cabaré, Dada.
ISTVAN MARTHA (Hungria): Támad Aszél
Obra de grande fôlego denominada «Diário de som electrónico» pelo próprio compositor. Longa suite subdividida em várias partes, contando com a participação de Marta Sebestyén e dos «Amadinda», entre dezenas de outros músicos importantes da cena underground magiar. À semelhança de Boris Kovak, o ponto de partida é a música tradicional (neste caso a húngara), reinterpretada e inserida num contexto actual. Polifonias vocais complexas e grandiosas e um aproveitamento de todos os sons planetários disponíveis, contribuem para a construção de um monumental edifício sonoro onde, mais uma vez, imperam as sínteses de estilos e épocas diversificados.
Instrumentação: Saxofones, flauta, trompa, shawn (instr. medieval de sopro), vocoder, bateria, guitarra, sintetizadores, trombone, órgão, violoncelo, sanfona, gaita-de-foles e harpa, mais o quarteto de cordas «Mandel» e o grupo de percussão «Amadinda».
Referências: Toda a música, desde a Idade Média até à Idade Digital.
PLASTIC PEOPLE (Checoslováquia): Midnight Mouse
Também conhecidos pelo nome completo Plastic People of the Universe. Já existem e gravam discos há uns bons aninhos. Politicamente empenhados e praticantes de um «jazz» híbrido construído à base dos sopros e de um velhinho sintetizador analógico «Korg». Superam todas as limitações técnicas com a originalidade dos arranjos, algures entre Carla Bley e os Henry Cow.
Instrumentação: bateria, trombone, baixo, vozes, sintetizador «Korg», violino e viola-de-arco electrificados, guitarra, clarinete, clarinete baixo, flauta.
Referências: Fanfarras, música de feira, Carla Bley, Henry Cow.
KGA (URSS): ZGA
O vocábulo «ZGA» só existe na língua russa na forma negativa. Num sentido mais lato pode significar «ver». Os ZGA são niilistas até dizer chega, impenetráveis e incómodos. O álbum foi gravado ao vivo num apartamento na cidade de Riga e consta basicamente de ruído mais ou menos controlado com incursões na música dita industrial. Improvisações corrosivas e tortuosas levam a experimentação electroacústica aos limites do intolerável.
Instrumentação: Clarinete, Ring Modulator, teclas, objectos de metal, percussão, baixo, bateria, vozes.
Influências assumidas: Biota/Mnemonists, Cassiber, John Zorn, Nurse With Wound, Henry Kaiser, John Cage, Ned Rothenberg, Luciano Berio.
Glasnost, Perestroika, Gorbachev, Vodka, até para a semana com os Kraftwerk.
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