15 JANEIRO 1992
VERNIZ CELTA
LOREENA MCKENNITT
The Visit
LP/CD, WEA, distri. Warner Music
“Sempre considerei o impulso criativo como uma visita”. É Loreena quem o diz, explicando deste modo o enigma do título. Loreena Isabel Irene (assim mesmo, em português) McKennitt nasceu no Canadá e desde muito nova, quando tocava num clube “folk” em Winnipeg, começou a interessar-se pela música céltica. Loreena tem o cabelo louro e longo aos caracóis, toca harpa e teclados e canta, na sua bela voz de soprano. Jura que se apaixonou pela harpa quando ouviu pela primeira vez o álbum “Renaissance de l’Harpe Celtique”, de Alan Stivell. Não descansou enquanto não adquiriu uma, que por acaso encontrou, a um preço em conta, na montra de uma loja perto do hospital de onde acabara de ter alta.
“The Visit” é o quarto álbum da senhora, primeiro distribuído por uma multinacional, depois de “Elemental”, “To Drive the Cold Winter away”, (uma colectânea de temas de Natal gravados num mosteiro irlandês) e “Parallel Dreams”, todos editados na sua própria editora Quinlan Road Productions.
Neste novo disco, Isabel Irene procurou ir ao fundo, que é como quem diz, às raízes da questão celta, e descobriu, encantada, a pólvora no lugar certo – a oriente. Por pouco não ia mesmo ao fundo. A solução musical que encontrou para o problema da distância geográfica não podia ser mais simples: juntar o som de umas “sitars” sampladas ou de uma “tamboura” indianas à harpa e à gaita-de-foles e esperar que a voz fizesse o resto. Bem pode Isabel gritar aos sete ventos que até visitou a exposição sobre os celtas em Veneza. “The Visit” pouco difere das xaropadas do sétimo céu de Enya, incorrendo nos mesmos tiques e na mesma visão “Walt Disney” da música tradicional.
Alguma crítica estrangeira embandeirou em arco, o que não espanta, atendendo à memória curta de que costuma dar mostras e que a faz tomar por “novo” ou por “original” aquilo que, neste caso, não passa de polimento de uma ideia antiga. Se fosse Mike Oldfield a fazer o mesmo que Loreena (e já fez parecido), eram capazes até de lhes chamar nomes. Nada melhor do que escutar o clássico de John Renbourn (com Jacqui McShee e um percussionista indiano, entre outros músicos) “A Maid in Bedlam” (1977) para refrescar a memória e ajudar a distinguir entre “mistura” e “síntese”.
Irene dá tudo por tudo – não faz mais do que o seu papel – para dar ares de princesa de Avalon, mesmo se na interpretação de “Greensleeves” se diz inspirada por Tom Waits – dotada pela natureza com um visual adequado (com o senão do queixo, demasiado proeminente), apenas teve de se preocupar em encaixar nas canções textos de Tennyson (“The lady of Shalott”) e Shakespeare (“Cymbeline”), deixar-se fotografar com a harpa entre as pedras de uma quinta portuguesa em Azeitão (onde, numa laranjeira, viu materializada a árvore representada na mítica tapeçaria “The Lady and the Unicorn”) e falar a torto e a direito do rei Artur e dos cavaleiros da Távola Redonda, sem esquecer a mensagem ecológica, veiculada num dos temas, contra a destruição das florestas de carvalhos na Irlanda.Tudo isto é belo, tudo isto é (mais ou menos) celta, tudo isto é positivo e defensável e onírico, etc., mas infelizmente a música não está à altura dos adereços. Fica a promessa do tema de abertura, “All Souls Night”, a fazer lembrar glórias passadas dos Pentangle e de Jacqui McShee, um ou outro apontamento do violinista Hugh Marsh e a voz de ouro de McKennitt a prometer “visitas” de outra envergadura. O resto é luz reflectida. Muito brilho para pouca substância. (6)
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