Pop
Osso Exótico
LP, Multinational
Este disco foi “recorded in a testing room of the Geotechnical Department
by the occasion of the advanced study institute on rockfill structures
organized by NATO and sponsored by Laboratório de Engenharia Civil with the
participation of scientists of nineteen countries”, Segundo vem escrito na capa.
O texto em questão, “in english” porque há
hipóteses do osso ser distribuído no estrangeiro pela Recommended Records,
suscita de imediato várias considerações. Dá-se a ênfase ao aspeto científico,
rodeando o objeto de uma aura vagamente ameaçadora. Completa-se o efeito com a
série de fotografias impressas na parte de dentro: interiores de laboratórios
desertos, maquinismos suspeitos, embalagens contendo sabe-se lá que infernais
venenos. No lado de fora são só pedras. Toda a apresentação remete para a estética
habitual dos Zoviet France, grupo com o qual os Osso Exótico partilham
determinados pressupostos: a tentativa de criação de sonoridades rituais,
construídas a partir de uma aproximação à “música industrial”, de acordo com os
métodos e propósitos enunciados há mais de dez anos pelos Throbbing Gristle; a
experimentação com determinadas frequências sonoras, indutoras de estados
físicos e psíquicos particulares, um pouco à maneira dos Hafler Trio. Os dois
conceitos são complementares.
Constituem o grupo
António Forte, David e André Maranha e Bernardo Devlin, em atividades
subversivas, divididas entre a manipulação de sintetizadores e “samplers”, a
tortura de guitarras, os batuques metálicos e as contorções das vozes, estas
denotando ou um grande sofrimento ou vociferando ameaças veladas, sem que se
consiga perceber os termos exatos das mesmas, como é de bom tom neste tipo de
música. Vítor Rua, dos Telectu, dá uma ajuda nos sistemas de produção
eletrónica. A intenção geral é meter medo, de forma ambígua, apelando para
imagens desfocadas e sonoridades de pesadelo. O primeiro lado preenche-se com
um único tema: “Osso exótico”, sombrio, pesado, esmagando sem remédio quem
pudesse aspirar a um resquício de melodia. Do outro lado, mais três temas, onde
para além das monstruosidades sonoras, prevalecem as citadas vozes, ora
invectivando a raça humana em geral ora entoando cânticos litúrgicos em louvor
ao demónio.
O problema maior que
aqui se levanta, para além das considerações morais que tal discurso musical
não pode deixar de acarretar, diz respeito à sua originalidade, posta
exclusivamente em termos artísticos. No caso dos Osso Exótico, fica a dúvida se
pretendem avançar num caminho até aqui ignorado pelos novos músicos
portugueses, mas já inflacionado nas cenas alternativas europeia e americana,
ou se se aproveitam desse facto, limitando-se a copiar modelos alheios (neste
caso demasiado óbvios), procurando deste modo passar por inovadores. Para um
ouvinte desconhecedor, este disco funcionará decerto, utilizando uma imagem
cara ao grupo, como uma autêntica “pedrada”. Para aqueles já viciados na
prática masoquista da audição destes “exercícios em negro”, é uma pera doce.
QUARTA-FEIRA,
19 SETEMBRO 1990
VIDEODISCOS
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