11/09/2014

Brava dança dos heróis [Heróis do Mar]



Y 9|FEVEREIRO|2001
música|compilação

Os Heróis do Mar deram um novo rosto à música portuguesa e tornaram-se um mito.

brava dança dos heróis

“Paixão – O Melhor dos Heróis do Mar” traz de novo à baila o nome de uma das melhores e mais importantes bandas de sempre da pop nacional. Com as lacunas inerentes ao facto da coletânea apenas contemplar o material gravado pelo grupo entre 1981 e 1985 para a Polygram, deixando de fora um álbum como “Macau”, mas devolvendo intactas as características que ainda hoje são sinónimo de desafio e originalidade.
            Na época em que o grupo de Pedro Ayres de Magalhães, Rui Pregal da Cunha, Paulo Pedro Gonçalves, António José de Almeida e Carlos Maria Trindade surgiu, escassos oito anos decorridos sobre a revolução de Abril, houve quem lhes chamasse “fascistas” por agitarem bandeiras com a Cruz de Cristo e cantarem canções como “Brava dança dos heróis”. Então. Como hoje, era difícil ser-se português para além das conveniências “progressistas” e propagar uma noção mais profunda da história de Portugal, com base nos mitos e numa tradição de séculos. Mas os Heróis do Mar, mais do que ideólogos, foram um dos primeiros grupos a trazer para a música portuguesa um conceito estético que passava pelo espetáculo, a moda, a poesia e uma música que, passados 20 anos, continua a soar moderna.
            Pedro Ayres de Magalhães, letrista, mentor e baixista da formação original, recordou para o PÚBLICO algumas das peripécias e conceitos inerentes a essa aventura.
            On The Road “Levávamos uma vida de rockers, de aventureiros. Nunca tive férias nos últimos 18 anos. Ser rocker é escrever canções, viajar com elas. Escrever na estrada, colher impressões dos lugares e das pessoas, abrir-se às circunstâncias. Era o ‘on the road’ Kerouakiano…”

            Ideia da década “Embora tivéssemos sido considerados uma das dez melhores bandas da Europa, pela “The Face” e pela “Rock & Folk”, e a “Actuel” nos tivesse considerado uma das cem melhores ideias da década, por cá nunca tivemos dinheiro ou apoio, nem para a casa, nem para o carro, nem para nada…”

            O que é que se podia fazer? “Os Heróis do Mar, além da música, construíram uma imagem. Mas as massas não perceberam o seu significado. Nos anos 80 não existia uma cultura do vídeo, do filme rock, as pessoas iam aos nossos concertos e não sabiam o que haviam de fazer. Havia apenas uma minoria que dançava”.

            Celebração “Sentíamos a necessidade de dotar o país de um reportório. De o conhecer, de falar dele, de ter uma opinião sobre o que era melhor para Portugal. Encontrámos uma forma original de celebrar a Nação”.

            Amor sem retribuição “É preciso não esquecer que, além do “Amor”, um êxito na rádio sem precedentes na música portuguesa de então, e vendeu cerca de 50 mil exemplares, os nossos discos acabavam por soar um bocado complexos. Não estou a falar em vanguardismos, mas de serem demasiado densos – informação a mais para aquilo que era frequente aceitar-se num disco de música popular em Portugal. Éramos um grupo elitista. Não nos podíamos comparar às vendas do Rui Veloso ou dos Trovante.”

            Aprender com a faena “Toda a gente que faz música em Portugal teria muito a inspirar-se no que a gente faz, tínhamos muitas soluções a nível das influências musicais, da construção, das orquestrações, até das próprias soluções técnicas de gravação. Também da estruturação do discurso cantado e das palavras que foram escolhidas para a grande faena dos Heróis do Mar. Foi a nossa liberdade que permitiu a grupos como os Delfins, Polo Norte ou Santos e Pecadores, conseguiram imaginar-se como tal, como autores de música em Portugal.”

            Estação de serviço “Havia ministérios dentro do grupo. O Rui Cunha era o cérebro da imagem. Ele e o Paulo eram os cérebros da roupa e da animação ‘anglo-americana’. O Tó Zé, com a experiência que trazia dos Tantra, era um génio da organização de concertos num país onde não havia produção de concertos. O Carlos Maria era um génio da música, como ainda hoje é. Eu tinha a determinação, uma permanente disponibilidade, estava lá quando não estava mais ninguém. Eu talvez fosse apenas a personificação de um serviço aquela organização”.

            O crepúsculo dos ícones “Houve gente nalguns meios de comunicação apostada em confundir. Um movimento determinado a transformar os Heróis do Mar num ícone de um regresso da Direita, a associar-nos aos paraquedistas de Tancos, aos comandos do Jaime Neves e trinta por uma linha. Depois vim a saber onde é que isso foi combinado, com votos a favor e contra. Durante pelo menos dois anos não conseguimos ir tocar a Sul de Setúbal, no Alentejo, porque éramos ‘fascistas’. Chamaram-nos fascistas, a putos sem proteção nenhuma que apenas queriam reclamar uma herança histórica, numa altura em que nem na palavra ‘pátria’ se podia falar. Lançavam-nos: ‘Querem é a herança do Salazar!’, quando o que pretendíamos era a criação de um showbiz civilizado. Fazíamos tudo como uma companhia de ciganos independente.”

O CONCEITO “SE OS HERÓIS DO MAR
SÃO HOJE UM GRUPO ‘HISTÓRICO’, É SOBRETUDO PELA DIVULGAÇÃO DO SEU NOME
AS METÁFORAS QUE FORAM CORPORIZADAS POR NÓS
AINDA NÃO SÃO CONHECIDAS.”

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