Y
08|DEZEMBRO|2000
discos|escolhas
PLURAMON
Bit Sand Riders
Mille Plateaux, distri. Ananana
8|10
THE TIED + TICKLED TRIO
EA1 EA2 Rmx
Morr Music, distri. Ananana
8|10
O
gabinete do Dr. Frankenstein
Bem
vindos ao salão de espelhos das remisturas. Depois do produtor e do dj, é a vez
do remisturador se assumir como o novo demiurgo, qual dr. Frankenstein capaz de
insuflar vida a monstros, com a diferença de que, neste caso, não se trata de
corpos mortos mas de criaturas bem vivas (excetuando Jim O’Rourke que em “Rien”
ressuscitou o cadáver dos Faust…). Há quem se oponha, como J. Swinscoe, dos
Cinematic Orchestra, e quem ferre com brasão próprio a carne alheia, como
Autechre, Atom Heart, Photek ou Kruder & Dorfmeister. Mas quando ao
laboratório do remisturador chegam entidades complexas como os Pluramon, a
tarefa do mago revela-se tanto mais estimulante quanto complicada.
O objeto em questão chama-se “Bit
Sand Riders” e reúne remisturas de temas dos álbuns “Render Bandits” e “Pickup
Canyon” da banda de Marcus Schmickler, com a lista de remisturadores a
apresentar os Sensorama, Mogwai, Florian Hecker, Atom Heart, The High Llamas,
Lee Ranaldo, Matmos, SND, FX Randomiz, Merzbow, e os próprios Pluramon. Entre
os reatores fractais dos Sensorama e as guitarras ambientais pós-rock dos
Mogwai, o paisagismo digital de Hecker e as pulsações surpreendentemente rock
de Atom Heart, a recusa do easy-listening dos High Llamas e o tom Faustiano com
dub de cristal de Lee Ranaldo, o drum ‘n’ bass da central elétrica dos Matmos e
o swing torococoiano dos SND, a eletrónica residual de FX Randomiz e o noise
industrial dos Merzbow, “Bit Sand Riders” prolonga a sensibilidade pós-rock dos
Pluramon através dos meandros de um experimentalismo marcado por uma abordagem
orgânica plenamente interiorizada da parte de todos os intervenientes.
O caso dos Tied + Tickled Trio é
diferente. Não se trata aqui de remisturas mas de versões de temas do álbum do
ano passado desta banda alemã, “EA1 EA2”, cujo jazz eletrónico se estende até
às margens mais insuspeitas. Se as paráfrases dos Opiate se mostram
inofensivas, já o desempenho de Christof Kurzmann – com uma recuperação do
“sinfonismo” saxofonístico dos Urban Sax transposto para o jazz galáctico dos
Orchester 33 1/3 – se revela absolutamento estimulante. Max Ernest (leia-se
Thomas Brinkmann…), o único com participação dupla no disco, opta num dos temas
pelo “dub” e no outro por uma tecno a duas velocidades, em ambos os casos, como
sempre, atirando-nos de encontrão para a pista de dança. Pós-house
introvertida, com vibrafones a ecoar secretamente é a proposta dos Console, o
groove eletrónico em contraste com o jazz livre de Weschel Garland (o homem por
detrás dos Wunder) onde as vozes, o saxofone e de novo o vibrafone discorrem
suspensos no espaço. Kandis (de Jens Messel, dos Fumble) remete sem surpresas
para a eletrónica lúdica que atualmente prolifera na Alemanha para finalmente
Gustavo Lamas, da escola eletrónica argentina (consultar a coletânea “Elektronische
Musik aus Buenos Aires”) fazer as vezes de Thomas Brinkmann, embora sem o golpe
de asa do mestre.
Dois álbuns com matéria fértil para
reflexão que acima de tudo constituem uma imensa fonte de prazer.
Sem comentários:
Enviar um comentário