23/12/2016

Canções para os amigos [Suzanne Vega]

QUINTA-FEIRA, 17 JUNHO 1999 cultura

Concerto ameno no CCB

Canções para os amigos de Suzanne Vega

MAL SUBIU para o palco, com uma guitarra acústica e um sorriso tímido no rosto, Suzanne Vega foi recebida pelo público de Lisboa como uma filha mimada. Ao fim de poucos segundos – na primeira das suas duas apresentações em Portugal, a segunda aconteceu ontem, no Cinema do Terço, no Porto – a cantora nova-iorquina tinha toda a gente na mão. O seu sorriso de quem está em paz consigo mesmo, a sua simplicidade e o seu sentido de humor, amplamente exercitado nos apartes e nas histórias que foi contando, são desarmantes. Este foi, de resto, o aspeto mais interessante do concerto, o modo como a cantora estabelece comunicação com o público, através de um tom coloquial que emprega em simultâneo o didatismo, a improvisação e a desmistificação.
            Suzanne recordou episódios da sua vida passada, as suas viagens (as raparigas más, embora não seja bem o seu caso, ao contrário das boas, que vão para o céu, vão a todo o lado e não para o inferno...), pediu desculpa pelo longo afastamento dos palcos portugueses (já cá tinha estado há cerca de nove anos) e explicou por que razão o assunto de uma das suas canções não é, definitivamente, o pénis. Satisfeita com a resposta do público, convidou-o a seguir viagem com ela até aos próximos espetáculos. Houve quem gritasse logo que sim. Suzanne sentiu-se em casa, apaparicada, e relaxou. Acendeu a luz para as canções brilharem e elas mostraram a vida que as anima. A magia da sua presença fez o resto.
            Suzanne expôs-se, no modo como se apresentou no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém (CCB), armada apenas com uma guitarra acústica e as acentuações, no baixo elétrico, de Michael Visceglia. Arriscou a ganhou. Servida por um som que permitiu acompanhar em detalhe a letra de cada canção, a “cantora que tombou do céu”, como já lhe chamaram, passeou o seu “charme” por canções como “Marlene on the wall”, a abrir o concerto, “Small blue thing”, “World before Columbus”, “Rock in the pocket (song of David)”, “In Liverpool”, “Rosemary” e “Blood sings”, fechando com dois dos temas mais conhecidos, “Luka” e “Tom’s diner”, este último “a capella” e com o público a acompanhá-la com estalos dos dedos e a entoar com muito cuidado o refrão “hm hm hm hm hmhmhm”.
            Voltou para os encores, com mais uma série de exercícios de intimismo, entra as quais “The queen and the soldier”, uma canção que, ela própria não sabe bem porquê, agrada a toda a gente. Recompensada, afirmou que, por vontade dela, ficaria toda a noite a cantar canções de enfiada, se não tivesse ainda que apanhar o avião para o Porto. Canções que não perderam pitada da sua força no formato reduzido com que foram apresentadas, dando razão à sua autora quando, na entrevista ao PÚBLICO, declarava ser em primeiro lugar uma compositora e só depois uma cantora. Mais do que um concerto, a atuação de Suzanne Vega foi o reencontro de velhos amigos que, ao fim de uma longa e dolorosa separação, puseram a conversa em dia.

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