SEXTA-FEIRA, 28 MAIO 1999 cultura
X Cantigas
do Maio começam hoje no Seixal
O festival da revolução
Com os prodígios dos violinos dos
JPP e da "trikitixa" de Kepa Junkera, o festival Cantigas do Maio
arranca hoje na Fábrica Mundet, no Seixal. No ano da celebração em conjunto do
seu 10º aniversário e do 25º da revolução de Abril. Um programa de luxo onde
vão estar presentes alguns dos revolucionários da "world music" atual.
Depois do
concerto inaugural, ontem no Fórum Cultural, com as polifonias vocais dos
Camponeses de Pias e dos Tavagna, da Córsega, o Festival Cantigas do Maio
prossegue esta noite, às 22h, nas antigas instalações da Fábrica Mundet, no
Seixal, com os JPP da Finlândia, e os portugueses Brigada Victor Jara. Comandados
por Arto Järvelä, guru da nova folk finlandesa, e Timo Alakotila, também
pianista de jazz e conceituado compositor e arranjador, os JPP (Järvelän Pikku
Pelimannit, os "Pequenos músicos folk de Järvelä") constituem um dos
melhores exemplos da música que, nos últimos anos, tem sido produzida sob a
égide da Academia Sibelius, em Helsínquia, famosa pela sua escola violinística.
Os JPP representam o apogeu desta
arte que recria de forma admirável as polskas tradicionais com um rigor e
virtuosismo instrumental próprios da formação clássica dos seus elementos,
juntamente com uma indisfarçável tendência para liberdades formais que devem
tanto ao jazz como ao rock. Os JPP contam nas suas fileiras com quatro violinistas
(além de Järvelä, o seu sobrinho Mauno Järvelä, Matti Mäkela e Tommi Pyykönen),
Timo Alakotila, no órgão de pedais, e Timo Myllykangas, no contrabaixo. Entre
outras obras de audição obrigatória deste grupo que lidera o movimento de
renovação da folk finlandesa apontem-se "Pirun Polska",
"Kaustinen Rhapsody" e o novo "String Tease", com a
colaboração dos suecos Väsen, presentes na edição do ano passado do Cantigas do
Maio, o mesmo acontecendo com Arto Järvelä e Timo Alakotila que atuaram como
acompanhantes da sua compatriota e virtuosa do acordeão, Maria Kalaniemi.
Mergulhando fundo as raízes na
ruralidade e nas recolhas de Giacometti, a Brigada Victor Jara apresentará a
sua particular fusão de sonoridades tradicionais de várias regiões de Portugal,
num concerto que deverá ter por base o seu último álbum, "Danças e
Folias" (já com quatro anitos em cima...) com a dinâmica adicional que
decerto lhe imprimirá a voz de Minela, que tem acompanhado o grupo nas suas
últimas atuações.
O que é a “txalaparta”?
No sábado, a tenda montada nas
antigas instalações da Fábrica Mundet receberá o grupo do acordeonista basco
Kepa Junkera e o combo dos ciganos romenos Fanfare Ciocarlia.
Junkera é um prodigioso executante
da trikitixa (acordeão diatónico, em basco). Como Valentin Clastrier (e dois
dos seus discípulos mais iluminados, Nigel Eaton e Gilles Chabenat), na
sanfona, ou Carlos Nuñez e Xosé Manuel Budiño, na gaita-de-foles, Junkera
inclui-se na classe dos revolucionários, dos eternamente insatisfeitos para
quem os respetivos instrumentos não têm limites. Rodeado de estrelas da cena
folk internacional, como acontece no seu álbum mais recente, "Bilbao
00:00h", ou ao vivo, como na espantosa amostra apresentada há um par de
meses no auditório da FNAC em Lisboa, Kepa é um espetáculo que vale tanto pelo
virtuosismo como pela ousadia dos seus arranjos para o reportório tradicional
basco. Muita atenção aos dois – como manda a praxe – executantes da txalaparta.
Quem não sabe do que se trata ficará de boca aberta quando a madeira se fizer
ouvir...
Também como manda a praxe nisto dos
festivais de música folk, a noite terminará em festa. Com a fanfarra e a
alegria contagiante de um grupo de ciganos provenientes da Roménia, os Fanfare
Ciocarlia, a despertar-nos da agonia dos Balcãs, numa roda de tubas, trompas,
clarinetes e bombos.
Além dos concertos, o festival
propõe uma série de atividades paralelas que vão do teatro de rua a exposições
de pintura e artesanato. Como é que se consegue reunir um cartaz com a
qualidade destas Cantigas do Maio (lembremos que no próximo fim-de-semana
haverá concertos dos La Bottine Souriante, Milladoiro, Yungchen Lhamo e Susana
Baca)? Com a capacidade organizativa da Associação José Afonso e um orçamento
de 29.500 contos repartido pela Câmara Municipal do Seixal (10 mil de subsídio
direto mais 12.500 em pagamento de faturas), a Região de Turismo da Costa Azul
(4000 contos) e o Ministério da Cultura (2500 contos). Orçamento que, segundo a
organização, tem crescido todos os anos "um bocadinho". Cerca de 10
por cento, correspondente a um aumento da mesma ordem dos 'cachets' dos
artistas: "Estamos sempre a ampliar a iniciativa."
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