11/11/2016

Wim Mertens: missão ou missal?

CULTURA
SEXTA-FEIRA, 11 MAI 2001

Wim Mertens: missão ou missal?

Compositor flamengo regressa para dois concertos no nosso país

Wim Mertens gosta de Portugal. Consta que Portugal também gosta dele. O compositor
flamengo que nos anos 80, juntamente com Michael Nyman, trouxe para a Europa os ideais e os ciclos tonais da escola minimalista norte-americana (Young, Reich, Glass, Riley), atua esta noite no Porto — e amanhã na Covilhã — para apresentar o seu novo álbum, “Der Heisse Brei”, cujo título, contrariamente às aparências, não faz publicidade a uma marca de cerveja.
            Esta é apenas mais uma visita ao nosso país — de novo apenas ele, um piano de cauda, e uma voz “sui generis” — no cumprimento de um ritual de concertos ao vivo em Portugal que teve início há mais de uma década, quando o nome do projeto que o tornou famoso no seio do minimalismo chique, os Soft Verdict, ressoava ainda com força nos ouvidos dos melómanos portugueses. Dessa primeira passagem por Portugal retivemos na memória uma afirmação sua, proferida com plena convicção, em que garantia ter sido, ele Mertens, investido por Deus numa missão na Terra. Na altura não o contrariámos. Era preciso esperar pelas provas discográficas, que confirmassem ou não a natureza divina da obra. Até hoje, a dúvida permanece.
            Com os Soft Verdict, com ou sem a intervenção de Deus, a verdade é que o minimalismo ganhou um novo rosto. Sorridente em “For Amusement Only”, manobra de diversão que arrancava música aos circuitos eletrónicos de uma máquina de “flippers”. Romântico, em “Struggle for Pleasure”, na banda sonora para “The Belly of na Architect”, de Peter Greenaway, ou no “tour de force” “Maximizing the Audience”. Tenso e elétrico, em “Vergessen”.
            Mas os Soft Verdict, onde pontificavam alguns ilustres instrumentistas da nova música holandesa, acabaram, e Mertens prosseguiu a solo a missão de que se dizia investido. Em missais de liturgias cada vez mais desmesuradas e de extrema complexidade, expostas em tetralogias sem fim, entre a música de câmara e um esoterismo impenetrável, como “Alle Dinghe” e “Gave Van Nietz”.
            Peças para guitarra, outras para voz e incursões pela “new age” foram igualmente abordadas por este compositor prolífico que gosta de invocar Bach, canta como um fantoche, mas consegue, a espaços, fazer com que a música toque de facto no céu.

WIM MERTENS
Porto, Coliseu. Hoje, às 22h00
Bilhetes a 3500$00 e 4500$00
Covilhã, Teatro Cine, amanhã, às 22h00

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