7
de Julho 2000
O
ferrão da estrela
XTC
Wasp
Star (Apple Venus, Volume 2) (8/10)
Cooking
Vinyl, distri. Megamúsica
Quando
se fala em canções pop onde a sofisticação se casa com a tradição, a
modernidade com o experimentalismo e a excentricidade com a qualidade, o nome
dos XTC acorre imediatamente ao pensamento. Com inteira justiça. Desde que em
1978, em plena ressaca punk, lançou o clássico “White Music”, nunca mais a
banda hoje liderada pela dupla Andy Partridge e Colin Moulding, sempre que em
período de atividade, deixou de liderar o grupo restrito das bandas que
ultrapassaram três décadas de atividade. Herdeiros da veia melódica dos Beatles
(há mesmo em “Wasp Star” um tema, “Wounded horse”, em que John Lennon parece
ter ressuscitado…) e dos Kinks, passaram pelo psicadelismo, o funk branco (o
que levou a que fossem apelidados de Talking Heads britânicos) e a pop barroca
orquestrada segundo os cânones lavrados por Phil Spector, levada às últimas
consequências, o ano passado, no anterior e primeiro volume de “Apple Venus”.
Neste álbum, aclamado pela crítica como um dos melhores do ano, os XTC
refinaram tanto quanto era possível a produção e os arranjos, assinando um dos
álbuns clássicos da pop dos anos 90.
A
continuação musical deste planeta em forma de maçã, pelo contrário, está a ser
mal recebida pela mesma crítica, com os elogios a serem substituídos por um
sem-número de reservas, apontando-se como principal defeito a linearidade e
menor empenho posto nos arranjos. A escuta atenta de “Wasp Star”, “a
estrela-vespa”, confirma as suspeitas desde logo levantadas pela gravura da
capa – onde o tal planeta-maçã aparece mergulhado na obscuridade, apenas deixando
antever em volta uma auréola de luz, como num eclipse – de que o álbum é o
negativo do anterior; de que a luminosidade excessiva se apagou, para deixar
ver outra coisa que em “Apple Venus, Volume 1”, de tão ofuscada pela luz,
dificilmente podia ser apreciada em detalhe. Essa “outra coisa” é afinal o
essencial em toda a obra dos XTC e em particular neste novo álbum: a
arquitetura das canções, a composição da melodia e do ritmo nas suas
componentes mais diretas, ao invés do que acontecia em “Apple Venus, Volume 1”,
onde a sumptuosidade dos arranjos tudo ofuscava com a sua imponência.
“Wasp
Star” “reduz” o suporte instrumental ao clássico formato guitarra, baixo,
bateria e alguns teclados, estando nalguns casos mais próximo do rock que da
pop, se é que esta separação faz ainda algum sentido. Sendo uma continuação,
“Wasp Star” é acima de tudo como uma corpo ricamente vestido ao qual tivessem
sido retiradas todas as roupagens supérfluas, para deixar ver a beleza das
formas, despojadas de todo o artifício. Como Andy e Colin já tinham anunciado
por ocasião da edição do anterior volume, o novo álbum acolhe com redobrado
ânimo a energia das guitarras elétricas e o resultado é mais uma coleção de
grandes canções que picam como o ferrão de uma vespa: “Playground”, “Stupidly
happy” (alguma crítica pegou na deixa, usando o título para ironizar sobre o
grupo), “My brown guitar”, a fabulosa “Boarded up”, “We’re all light”,
“Standing in for Joe”, “You and the clouds will still be beautiful” (um
regresso à power pop dos primórdios), “The Wheel and the maypole” que, de uma
vez por todas, inscreve nas enciclopédias o termo “pop de câmara”.
Se
“Apple Venus, Volume 1” era o “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” dos XTC,
“Wasp Star é o seu álbum branco. E também neste caso o tempo fará justiça às
suas qualidades. Para ouvir até se gastar a rodela do CD. Ou até os XTC
regressarem com um novo golpe de rins e mais uma caixa de canções com o rótulo
“perfeição”.
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