11/11/2016

Amélia Muge ao vivo e a monte

CULTURA
QUARTA-FEIRA, 4 ABR 2001

Amélia Muge ao vivo e a monte


Três noites de concerto em Almada para apresentar novo reportório, de canções e versos cúmplices

Amélia Muge, a foragida? A forasteira? A criminosa? A inadaptada? A incompreensível? Não é ela, são as vozes. Amélia Muge não está louca. São as vozes que andam a monte. Como a dela. Ou “As vozes a monte”, genérico do seu novo espetáculo a apresentar hoje, quinta e sexta no Fórum Romeu Correia, em Almada. Ela pergunta: “Que vozes são essas que nos seduzem, nos assustam e conseguem fazer-nos sentir que, quanto mais nos aproximamos delas, mais elas nos escapam?” “Chamar essas vozes que andam a monte” será o objetivo destas três noites em que, “foragidas”, “forasteiras”, “criminosas”, “inadaptadas” ou “incompreensíveis”, ganharão vida na voz de Amélia Muge, também ela a monte. Não Marisa Monte, mas Amélia Monte. “Cruzar, à minha maneira, o que vivo, sinto, vejo e ouço delas”, diz a compositora e cantora de “Taco-a-Taco” que recentemente produziu “Esta Voz que me Atravessa”, um álbum de fados na voz de Mafalda Arnauth…
            De quem são, de onde vêm, o que querem estas vozes? Pertencem a gente morta e a gente viva. Mas mesmo as dos mortos permanecem vivas nas palavras. Ou nos sons. “Trazidas no alforge da página do livro, no cantil do disco ou no farnel das imagens...”.
            Carlos Drummond de Andrade, Cramol, Fausto, Fernando Lopes Graça, Fernando Pessoa, Gaiteiros de Lisboa, Grabato Dias, Hélia Correia, José Afonso, José Eduardo Agualusa, José Mário Branco, José Saramago, Laurie Anderson, Mário Cesariny, Mário Viegas, Mia Couto, Natália Correia, Rui Júnior e O Ó Que Som Tem, Sérgio Godinho e Sophia de Mello Breyner são as vozes a monte que Amélia Muge saberá fazer falar à sua maneira. “Sem preocupações de perceber onde acaba o artístico e começa o tecnológico, sem preocupações de sinalizar heranças culturais ou de carimbar o que é popular ou não”.
            Ao lado de Amélia Muge estarão José Martins, seu companheiro de longa data, em instrumentos de corda e percussões, José Manuel David, dos Gaiteiros de Lisboa, em instrumentos de sopro variados e gaita-de-foles, e Catarina Anacleto, no violoncelo. Serão feitas projeções em ecrãs “não convencionais” e escutados “registos sonoros variados” pré-gravados.
            No dicionário pessoal de Amélia Muge lê-se que andar a monte pressupõe a contradição que é a designação de um lugar impreciso, um lugar de andares”. O lugar: Almada. Alma da voz. A de Amélia Muge anda para cima e tem muitos andares. Um arranha-céus. Mais alto ainda, no alto de um monte.

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