27/11/2016

Viva a folk, abaixo os djembés!

CULTURA
QUINTA-FEIRA, 28 JUN 2001

Viva a folk, abaixo os djembés!


FESTIVAL RITMOS ARRANCA HOJE NO PORTO

World music invade Portugal, de norte a sul. Músicas do mundo e Intercéltico de Sendim propõem programas diversificados

Em primeiro lugar, um pedido encarecido aos jovens “freaks” dos festivais de world music: Não levem os djembés! Levem gaitas-de-foles, saltérios, bombardas, sitars, cimbalons... Têm a vantagem de ser instrumentos exóticos e, sobretudo, de não azucrinarem os ouvidos com o inferno dos batuques.
            Agora a programação. Este ano, o panorama dos festivais de djemb... perdão, de world music, é vasto, bem guarnecido e diversificado geograficamente. Depois das Noites Celtas do Porto terem aberto a temporada, em Abril, e quando ainda se limpa o lixo deixado no local pelas multidões que lotaram o Cais do Gás, em Lisboa, durante o Multimúsicas, é a vez do Porto ser de novo anfitrião, hoje mesmo, na abertura do Ritmos, Festas do Mundo, oitava edição. Seguem-se as “Músicas do Mundo”, no final do próximo mês, em Sines. Agosto aquece em Trás-os-Montes, com o Intercéltico de Sendim. Entretanto, o Sete Sóis Sete Luas espalha concertos por todo o país até o Verão acabar, enquanto a Fábrica da Pólvora, em Barcarena, explode aos fins-de-semana, ao longo de Julho e Agosto.
            Este ano, o Ritmos Festas do Mundo, que decorre nos Jardins do Palácio de Cristal com a chancela da Culturporto e Porto 2001, ostenta o genérico “Planeta Latino”. O “mundo latino é um bairro global”, diz a organização. Ou seja, não há celtas para ninguém.
            Chico César, o brasileiro com cabeça de cebola (enquanto não mudar de penteado, temos que chamar a atenção) e os Vocal Sampling, de Cuba, abrem as hostilidades. Chico agita no “mixer” a pop, rock, reggae, samba, forró, candomblé e afro-beat. Os Vocal Sampling criam um cocktail das Caraíbas. Mas a bebedeira tropical que provocam tanto faz ouvir Bobby McFerrin multiplicado por seis como a abertura do “Assim Falava Zaratustra”, de Wagner...
            Amanhã, os Ritmos recebem o angolano Waldemar Bastos com o convidado Kepa Junkera, e os Dusminguet, da Catalunha. Waldemar vem aureolado em “Pretaluz” com a produção de Arto Lindsay, para a Luaka Bop, de David Byrne. Os Dusminguet são para desbundar. Ritmos ciganos, fanfarra, escaldões reggae e o mais que puder acontecer. Grande farra em perspetiva.
            Cyrius, espanhol de ascendência argelina, com residência em França e o coração em Cuba, e os Los de Abajo, do México, encerram as festas da latinidade. Cyrius veste-se segundo o figurino de Havana e Santiago de Cuba, com charme francês. Noite de bailarico. Aliás, o Ritmos deste ano é sempre a abrir. A fechar, lá estarão os Los de Abajo, para deitar abaixo as últimas resistências à dança, imparáveis na salsa, merengue, mambo, cumbia e tudo o que contribui para fazer um bom anúncio da Baccardi.
            Vão fazendo exercício e — lembramos mais uma vez — deixem os djembés em casa. A opção certa para os Ritmos, Festas do Mundo deste ano são umas maracas.

WORLD DE TRÁS-OS-MONTES AO ALGARVE

SINES

Em Sines, em pleno castelo, erguido no séc. XIV, vai decorrer a 26, 27 e 28 de Julho o festival “Músicas do Mundo”, organizado pela Câmara Municipal. A abrir, depois de uma viagem pelo Portugal, rural mas não muito, da Brigada Victor Jara, o castelo medieval albergará o Bal Tribal, formidável formação da Bretanha com os irmãos Jacky e Patrick Molard, e Jacques Pellen, figuras de vulto do movimento de renovação da folk bretã protagonizada pelos Gwerz, e a cantora búlgara Kalinka Vulcheva — solista das “Le Mystère des Voix Bulgares” —, cujo desempenho no álbum “Deliou”, de Patrick Molard, é algo do outro mundo. Imperdível. Na sexta, 27, Carmen Linares vem de Espanha mostrar por que o seu nome permanece há décadas nas bocas dos amantes do “cante rondo”. Segue-se a banda cigana Taraf de Haidouks, da Roménia. Quem já os viu e ouviu não esquece. Trazem demónios na bagagem e um novo álbum, “Band of Gypsies”.
            O dia de encerramento acolhe três nomes. Andrea Marquee, paulista, 26 anos, autora do aclamado “Zumbi”, leva a Sines a MPB colorida de eletrónica, acid-jazz, samba e tropicalismo. “Escrevo MPB para o povo dançar”, diz. O povo faz-lhe a vontade. David Murray e o seu grupo M’Bizo, com os The World Saxophone Quartet, dispensa apresentações. Saxofonista de renome, faz a ligação do jazz às suas origens africanas. “M’Bizo” é um projeto de homenagem ao baixista sul-africano Johnny Dyani, já falecido. Em Sines, estarão presentes 13 elementos, numa fusão de saxofones jazzy, um coro zulu e mais cinco músicos sul-africanos. E que dizer dos Black Uhuru que, ainda por cima, trazem com eles duas das maiores estrelas da música jamaicana, Sly & Robbie? Reggae ao mais alto nível. Reggae global.

SENDIM

Tudo parece fazer sentido no Intercéltico de Sendim, em plena Terra de Miranda, Trás-os-Montes, este ano a festejar o seu segundo aniversário. A paisagem, a população, a gastronomia e a música conjugam-se numa vivência única que transcende a experiência de um vulgar festival deste tipo. Da conjugação da editora e produtora Sons da Terra com a Câmara Municipal de Miranda do Douro nasceu esta iniciativa que, a 3, 4 e 5 de Agosto, apresenta como figuras de cartaz os Felpeyu, das Astúrias, Bùrach, da Escócia, Na Lua, da Galiza, e Realejo, de Portugal. Os Xarelos, Lelia Douro, Tradere, Las Fraitas e a Banda de Gaitas de Verin encarregam-se da animação de rua. Entre as atividades profanas, para desfrutar a partir da meia-noite numa Taberna dos Celtas, e a celebração do Sagrado, numa Missa Intercéltica, ao som da gaita-de-foles de Abílio Topa e o canto de Cláudia Nelson, o festival prova-se como uma poção dos druidas.

BARCARENA e SETE SÓIS SETE LUAS

Todas as sextas e sábados, até ao último dia de Agosto, a Fábrica da Pólvora apresenta espetáculos de folk, alguns dos quais com o patrocínio do Festival Sete Sóis Sete Luas, como é o caso dos Simby, da Guiné-Bissau (20/7), Sally Nyolo, dos Camarões (21/7), e Bana, de Cabo Verde (27/7). A Câmara de Oeiras assegura, entre outros, a vinda dos Badenya – Les Frères Coulibaly, do Burkina Faso (usam djembés, cuidado!, a 13/7), Rodopis, da Bulgária (13/7), Väsen, da Suécia (discípulos dos Hedningarna, a não perder, 14/7) e Triskell, da Bretanha (4/8). O Sete Sóis leva ao Algarve os Ximbomba Atomica, das Baleares (Faro, 13/7), Hevia (Faro, 17/7), Khaled, da Argélia (Portimão, 27/7), Xosé Manuel Budiño (Portimão, 14/7), Mercedes Péon, Galiza (Montegordo, 22/8) e Acetre, Espanha (Montegordo, 15/8).

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