CULTURA
SÁBADO, 30 JUN 2001
Crítica
Música
Pokémon
iluminado
Vocal
Sampling + Chico César
Porto, Jardins do Palácio de Cristal
28 de Junho, 22h30
Cerca de duas mil pessoas
Dois bons concertos
abriram a oitava edição do Ritmos, Festas do Mundo, este ano subordinado ao tema
“Planeta Latino”: os Vocal Sampling, de Cuba, e Chico César, do Brasil.
Os
Vocal Sampling foram sinónimo de virtuosismo, ecletismo e boa disposição. Seis
cantores pouco ortodoxos e sem preconceitos que, no Porto, entre outras indumentárias,
se vestiram de operários da construção civil e imitaram com a voz, na perfeição,
trompetes, trombones, guitarras elétricas, contrabaixo e percussão, num falso karaoke
que pôs as cerca de duas mil pessoas presentes nos jardins do Palácio de
Cristal em euforia.
Passando
em revista o novo álbum, “Cambio di Tiempo”, foram a todas, dos Beatles ao scat
jazzístico, terminando num impressionante cânon a seis vozes de “Assim Falava Zaratustra”,
de Richard Strauss (e não Wagner, como escrevemos no texto de apresentação). Premiados
com um encore interminável, conseguiram a proeza de pôr o público a cantar em contraponto.
E a preceito, coisa nunca vista!
Também
não deu para acreditar no desempenho do “percussionista”, que sem outros
recursos além dos pulmões, das cordas vocais e de estalos com as mãos, rubricou
um solo completo de bateria, incluindo breaks, sons de címbalos, prato de
choque, bombo, tarola… Um verdadeiro sampler humano.
Chico
César, que atuou a seguir, segurou sem dificuldades uma assistência familiarizada
com a sua obra. Não demorou até o recinto se transformar em bailarico improvisado.
Chico, o homem-cebola, “showman” inspirado que num ápice salta da batida-chalaça
para solos de guitarra psicadélica, do rock para o reggae, do afro-beat para o
forró, apresentou uma mescla de temas conhecidos, com ênfase no álbum “Mama Mundi”,
e originais.
Entre
baladas intimistas, como “Onde estará o meu amor” e “À primeira vista” (popularizado
por Daniela Mercury), e longas sessões de transe com raiz em África, o
brasileiro jogou com o humor, a familiaridade e a experimentação. Cantou vários
temas com um balão, atirado pela assistência, enrolado à volta da cabeça, como
um turbante, qual Sun Ra de uma hamburgueria McDonald. Colocou-se diante de um
canhão de luz, o rosto a piscar em luz violeta, como um Pokémon saído da quinta
dimensão. Aplicou sovas à guitarra, mas também a acariciou, hipnotizou com um tambor,
estendeu-se em jam sessions onde brilharam os sopros de Simone Julian, os
samples disparados pelo percussionista Guilherme Kastrup e os teclados de Marcelo
Geneci da Silva.
Brasil
de mil cambiantes. O baile não dava mostras de parar. Havia gente de cabeça
saudavelmente perdida, enredada em danças particulares, cantou-se em coro,
pediu-se mais. Chico César, visivelmente bem disposto, regressou humilde: “Querem
mais uma? Querem uma cantada ou instrumental?” Saiu rave. Tecno tropical. Para entrar
pela noite dentro se esta não fosse já adiantada e o “staff” da câmara não ansiasse
por dar por terminada a função…
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