Pop Rock
2 de Janeiro 1991
1990 foi sobretudo o ano de
todos os encontros, cabendo ao Oriente a parte de leão, desde a enésima versão
das vozes búlgaras às divagações elétricas centradas na Ásia. Em Portugal, o
acontecimento do ano, nesta área musical, passou despercebido: numa perspetiva
descentralizadora, realizaram-se no passado Verão, em Oeiras, Famalicão e
Évora, os primeiros Encontros Musicais da Tradição Europeia, organizados por
uma cooperativa nortenha. Foi possível escutar ao vivo a magia musical de
regiões culturalmente tão ricas como a Escócia, a Cantábria, o Piemonte e a
Occitânia, trazidas respetivamente por Andrew Cronshaw, Manuel Luna, La Ciapa
Rusa e Perlinpinpin Folc. Também no capítulo das edições discográficas,
nomeadamente de música celta, os adeptos não se puderam queixar, graças a
alguns importadores nacionais que tornaram disponíveis, entre nós, catálogos
tão importantes como os da “Topic”, da “Iona” ou da “Green Linnet”.
MARTA SEBESTYEN &
MUZSIKÁS
Blues for
Transylvania
Hannibal, distri. Nébula
Foi na Transilvânia que Drácula e Ceausescu, pela imaginação
ou pela revolta verdadeira da população, se viram arrancados dos tronos do
poder. Terra da violentos confrontos, telúricos e políticos, cantada pela voz
forte e doce de Marta Sebestyen. Como em “The Prisoner’s Song” e “Muzsikas”, de
novo se conta a história e o dorido queixume da alma romena, aqui expressos com
tanta intensidade, como se do lamento de um “blues” se tratasse. No seio das
“Muzsikas”, a tradição é assumida como ato. No ano passado, a banda tocava em
homenagem às vítimas de Timisoara, conciliando o inconciliável – tradição e
revolução.
MARI BOINE PERSEN
Gula Gula
Real World, distri. Edisom
Mari nasceu em Gamehisnjárga, promontório algures a norte da
Escandinávia, atravessado pelo rio Anarjohka e habitado pela etnia Sámi. Os
mapas não registam tal local. Nunca é tarde para se aprender geografia. Mari
optou pela “civilização”, passando a sentir na carne o confronto entre
diferentes culturas. Na escola ensinavam em norueguês. Resolveu mudar o estado
das coisas, recuperando a língua e o espírito antigos. “Gula Gula” significa
“Escuta a voz dos antepassados” – assombrações e melodias estranhas, auroras
boreais que esculpem, lentamente, novas maneiras de sentir.
Banda Sonora do Filme
“The Mahabharata”
Real World, distri. Edisom
O princípio do mundo, segundo a lenda hindu, recriado pela
inspiração coletiva de um grupo de intérpretes de várias nacionalidades,
baseada nos sons tradicionais, nomeadamente do Tibete e da Índia. Música de
“fusão”, bem entendido, que combina diferentes sensibilidades e discursos
musicais, unificados por uma comum aspiração à beleza absoluta. “Música do
mundo” em todo o seu esplendor a que os poemas de Rabindranath Tagore e a voz
de Sarmila Roy acrescentam a dimensão do sublime.
MOUTH MUSIC
Mouth Music
Triple Earth, import. Contraverso
Discos de música celta, saídos este ano, ainda cá não
chegaram. Este “Mouth Music” (ou “Puirt a Beul”, em gaélico, designado um
estilo vocal destinado à dança) acaba por ser um bom substituto, talvez não
muito do agrado dos puristas, mas, de qualquer modo, uma entre outras
interpretações possíveis da música tradicional escocesa. Os instrumentos de
Martin Swan e a voz cristalina de Talitha MacKenzie fazem-nos acreditar que o
mundo é uma história de encantar.
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