CULTURA
DOMINGO, 24 FEV
2002
Elliott Sharp com os dentes
cravados nos “blues” no CCB
Elliott Sharp é um monstro. A sua
música é monstruosa. Mas pode abanar-nos com outro tipo de energia. Por exemplo,
os blues. Mais concretamente, com o coletivo Terraplane, além de si, composto
por Sam Furnace (saxofones barítono e alto, discípulo de Julius Hemphill), David
Hofstra (baixo elétrico e tuba, tocou com Otis Rush, os Contortions, de James
White, e os Lounge Lizards), Sim Cain (ex-Rollins Band, bateria e percussão eletrónica)
e os cantores Eric Mingus (filho do mito, Charlie Mingus) e Dean Bowman, que
esta noite atua no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, para
apresentar “Blues for Next”.
Expliquemo-nos
melhor. Sharp (“aguçado”, nem de propósito, um apelido como este...) é um
monstro, não exatamente pelo seu aspeto de vampiro, não propriamente sagrado,
porque o seu nome não consta da bíblia do mainstream ou das listas de músicos
bem comportados, mas porque a sua música é um híbrido dantesco cujo efeito
físico e psicológico no ouvinte pode ser devastador.
Sharp
abriu as mandíbulas no seio, salvo seja, da cena downtown de Nova Iorque, fazendo
furor e alarido no albergue para todas as loucuras que é o clube Knitting Factory.
Toca guitarra (de dois braços) mas de maneira diferente da de qualquer outro
guitarrista, à exceção, talvez, de Hendrix, que conseguia ser ainda mais
lunático do que ele.
Mas
Elliott Sharp, além de executante sonoro do caos, é também um matemático. As suas
descargas diluvianas de energia são ordenadas segundo a teoria dos fractais e
de rigorosas estruturas harmónicas. Até certo ponto, entenda-se, aquele ponto
além do qual o cérebro deixa de ter as rédeas na mão (sim, o cérebro tem
mãos!...) e cede o poder aos instintos. Um álbum como “Virtual Stance” é um “wall
of sound” milimétrico de labaredas digitais e labaredas de guitarra
incandescente. Um elefante cibernético a fazer contas de cabeça no meio de um
incêndio.
“Larynx”,
com o projeto Carbon, outro álbum avassalador, rasteirava o rock e “In the Land
of the Yahoos” colou um rótulo novo na pop eletrónica, anunciando terríveis mutações.
Outra ideia posta em prática em forma de abalo — físco, emocional e musical —
chamava-se “Tectonics” — um terramoto de eletricidade e riffing esquizofrénico (o
esquizofrénico, recorde-se, pode usar uma lógica inquebrantável...).
Sharp
tocou com e tocou em JohnZornspeedmetal-BillLaswellshardcore-Zeena
Parkinsrock-JackdeJohnettepopfúria. Um magma em ebulição que o guitarrista (e saxofonista...)
remexe e ordena segundo as suas próprias contas e pulsões. Agora, com os
Terraplane, o que acontecerá aos blues?
Elliot Sharp’s Terraplane
LISBOA
Gande Auditório do Centro Cultural de Belém
Às
21h30. Tel. 213612560.
Bilhetes
entre 7,50 e 17,50 euros
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