CULTURA
SÁBADO,
4 MAI 2002
Roger Waters em concerto duplo no Pavilhão Atlântico
HOJE
E AMANHÃ EM LISBOA
O
ex-baixista e vocalista dos Pink Floyd. Roger Waters estreia-se, ao vivo em
Portugal.
Depois dos Supertramp, Roger Waters. Eis o Parque Jurássico
da pop de regresso e a funcionar em pleno. Mas há uma diferença entre os
dinossáurios fossilizados, como os Supertramp, e um dinossáurio vivo, como
Roger Waters, 59 anos, natural de Cambridgeshire, Inglaterra. Os dinossáurios
vivos impressionam pela dimensão e pelo peso. Por isso exigem grandes espaços
de modo a poderem mover à vontade as suas caudas e pescoços enormes. Salas como
o Pavilhão Atlântico, que hoje e amanhã recebe a banda de Waters, em concerto
integrado na digressão "In the Flesh", título de uma canção do álbum
"The Wall".
Roger
Waters é um dinossáurio excelentíssimo, como diria José Cardoso Pires. Bastaria
o facto de ter feito parte dos Pink Floyd, para o tratarmos por senhor. Mas Roger
Waters não se limitou a "fazer parte". Ele foi, depois da saída pela
porta da loucura, de Syd Barrett, o cérebro e a voz dos Pink Floyd, ao longo de
toda a década de 70, em álbuns como "Ummagumma", “Atom Heart
Mother", "Meddle", "Dark Side of the Moon" e
"Wish you were Here". Mais, a Roger Waters se deve, quer se queira
quer não, o derradeiro testemunho (e testamento...) dessa década que fez do
excesso o seu modo de vida: o duplo álbum "The Wall", momento alto
(quanto a nós, o último...) na carreira dos Floyd e prova real de que, depois
do psicadelismo barrettiano e da consequente fase "space rock", a
canção pop teve no grupo um digno representante.
Todos cantavam em 1979 "Another brick in the
wall". Mas a pop de "The Wall" não se esgotava nesse hino
contra o autoritarismo. O muro é mais alto e mais resistente. "The
Wall" é a banda-sonora da solidão e da alienação, à qual, anos depois,
Alan Parker acrescentaria as cores berrantes no filme "Pink Floyd – The Wall",
cuja nova versão, em DVD, está já disponível. Waters deu tudo de si nesse
disco: o medo e as recordações sofridas da infância, sobretudo a morte
prematura do pai, falecido em combate na 2ª Guerra Mundial, que nunca conseguiu
resolver. Em carne viva. "In the flesh".
"The
Wall" é ainda o autismo enquanto última fuga. Todos temos um muro à nossa
volta. Mais ou menos alto, mais ou menos forte, construído com as nossas
próprias mãos e as nossas próprias paranoias. "The Wall" manteve-se
dois anos nos tops. "The Final Cut", espécie de epílogo de "The
Wall", foi o derradeiro exorcismo. Waters abandonaria em seguida os Pink
Floyd.
"The
Wall" seria ainda uma coincidência histórica. A 21 de Julho de 1990, em
plena Potzdamer Platz, diante do muro de Berlim recém derrubado, Waters e a sua
banda montaram uma ópera-rock que ficou na história. Canção a canção, tijolo a
tijolo, o muro foi reconstruído e de novo deitado abaixo, à medida que o
concerto ia decorrendo – ascensão e queda, uma nova época que nascia sem que
soubéssemos ainda que outro muro, ainda mais alto e resistente, se erguia já do
outro lado a tapar o horizonte.
Depois
dessa data, Roger Waters, o introvertido por excelência, voltou apenas
esporadicamente aos palcos. Um concerto em Los Angeles, em formato intimista.
Outro, de beneficência, em 1993, ao lado de Don Henley, John Fogerty e Neil
Young. Foi preciso esperar até 1999 para reatar o convívio com o público,
através da extensão americana da digressão "In the Flesh".
Roger
Waters gravou a solo os álbuns "The Pros and Cons of Hitchiking"
(1984), "Radio K.A.O.S." (1987) e "Amused to Death" (1992),
excertos dos quais podem ser escutados no primeiro volume da coletânea,
recém-lançada pela EMI-VC, "Flickering Flame". Prepara atualmente
"Ça Ira", uma ópera baseada na Revolução Francesa, para três vozes
solistas – soprano, tenor e barítono – com "libreto", em francês, de
Etienne Roda-Gil, e ilustrações assinadas pela sua mulher, Nadine, entretanto
falecida, vítima de leucemia.
Acompanham
Roger Waters os músicos Andy Fairweather-Low (guitarra, baixo e voz), Snowie
White (guitarras), Graham Broad (bateria), Andy Wallace (piano), Harry Waters
(piano), Chester Kamen (guitarra e voz), Norbert Stachel (saxofone), Katie
Kissoon, Linda Lewis e P. P. Arnold (voz e coros).
ROGER
WATERS
LISBOA Pavilhão Atlântico, hoje e amanhã.
Às 21h30. Tel. 218918409.
Bilhetes entre 25 e 33 euros
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